As provas de aferição poderiam ser um bom aliado do ensino se depois de toda a preparação, ansiedade e aparato, os resultados fossem cuidadosamente interpretados, cruzados com o feedback das escolas, e consoante as falhas e fragilidades se trabalhasse em mudanças e melhorias ao nível do ensino, conteúdo programático e recursos.
Acontece que, não só o conteúdo do 1.º ciclo parece ser cada vez mais extenso, confuso e abstrato – segundo muitos professores pouco adequado a crianças daquelas idades – como as provas, ainda mais em formato digital, condicionam um ano letivo inteiro.
Quando olhamos para os resultados dos exames do 9.º ano e para os alunos que chegam à faculdade, percebemos que houve várias falhas básicas no seu percurso escolar. Com certeza que retirar uma fatia do 2.º ano para ensinar crianças de sete e oito anos – que ainda leem com dificuldade, que ainda estão a aprender a escrever corretamente e muitas já apresentam dificuldades ao nível do cálculo básico – a usar e escrever no computador não deveria ser uma prioridade.
As provas de aferição deveriam causar a menor perturbação possível ao percurso natural do ano letivo. Na maioria das escolas, logo no 1.º ano, os alunos começam a ter contacto com os computadores para estarem mais à vontade no ano seguinte; ao longo do 2.º ano têm semanalmente períodos dedicados ao uso do computador e à medida que a data se aproxima começam a intensificar o seu uso, a fazer provas e preparações excessivas. Se queremos avaliar como as crianças se encontram ao nível das aprendizagens, então nem sequer as devíamos preparar para as provas, porque logo aí estamos a distorcer os resultados.
Muitos professores perguntam-se se quem decide os conteúdos programáticos tem filhos, se já foi criança ou já visitou uma escola para conhecer a heterogeneidade de crianças que estão do outro lado dos números.
Outra questão é a ansiedade excessiva que estas provas acarretam numa idade tão precoce. Ainda que os professores tentem deixar as crianças à vontade, só de ouvirem as formalidades da prova, começam a ficar com urticária: ‘Não se esqueçam de trazer todo o material necessário, caso contrário não fazem a prova. Se chegarem atrasados não entram. Não se esqueçam do cartão de cidadão. Atenção aos tempos da prova. Poderão estar outros professores na sala de aula. Mas relaxem, tirando isso é um dia como qualquer outro sem motivo para preocupações ou stress’. Estas informações, aliadas ao que imaginam ser o bicho papão da prova, ainda mais em computador, se a internet vai funcionar ou não, se vão saber responder corretamente, são motivo para algumas insónias e ansiedades. Já para não falar naqueles alunos com diferentes especificidades para quem as provas não foram adequadas.
Não é uma tarefa fácil, mas mais do que sujeitar as crianças a estas provas (que parecem cair em saco roto), talvez fosse importante ouvir as escolas, visitá-las, conhecer as crianças e os professores, perceber o que dizem e como sentem estes primeiros quatro anos. Reunir em equipa multidisciplinar e perceber o que é preciso adaptar, qual a melhor estratégia de ensino, a melhor forma de ensinar e de aprender. E sobretudo investir e agir! Porque parece que numa altura de mudanças intensas na sociedade e nas crianças, na sua essência a escola continua a manter-se teimosamente inalterável.