A atividade hospitalar do SNS aumentou em 2023, mas de forma insuficiente para satisfazer a procura. Nos cuidados primários reduziu-se o número de consultas médicas. O alerta é do Conselho das Finanças Públicas e diz que no âmbito da Rede Nacional Cuidados Continuados Integrados, o maior número de utentes assistidos em 2023 não foi suficiente para responder ao aumento do número de utentes referenciados nesse ano. Quanto ao futuro aponta para “riscos e incertezas que condicionam o seu desempenho de curto e médio prazo, assim como a sua sustentabilidade futura”.
De acordo com a entidade liderada por Nazaré da Costa Cabral, “o nível de atividade do SNS foi insuficiente para fazer face às necessidades (crescentes) da população”. E lembra que, “no que diz respeito às necessidades de saúde não satisfeitas, Portugal, já no ano de 2019 (último ano com informação publicada pelo Eurostat), apresentara, de entre os países da União Europeia e Espaço Económico Europeu, o maior grau de ‘população com necessidades de cuidados de saúde que reportou necessidades de saúde não satisfeitas’”, referindo que a primeira causa de necessidades não satisfeitas eram então as listas de espera.
Do ponto de vista orçamental o défice do SNS reduziu-se em 2023, mas os pagamentos em atraso aumentaram.” Neste domínio, é urgente instituir a publicação regular das contas financeiras consolidadas do SNS, por forma a permitir uma avaliação transparente da sua posição financeira, da evolução dos seus passivos e não menos importante, do estado dos ativos e suas consequências sobre a provisão de bens e serviços públicos”.
Segundo o documento, em 2023, o número de utentes do SNS aumentou para 10,6 milhões inscritos, dos quais 1,7 milhões de utentes (16%) não tinham médico de família atribuído. Face a 2022 trata-se de mais 230 mil utentes nesta situação.
O volume total de consultas médicas realizadas nos cuidados primários diminuiu pelo segundo ano consecutivo, apesar do aumento do número de utentes do SNS. ”Esta redução ficou a dever-se ao menor volume de consultas não presenciais (-6,3%), ainda que se tenha registado um ligeiro aumento das consultas presenciais (+0,8%). Assim, o índice de utilização das consultas médicas apresentou valores inferiores a 2022, indicando uma redução da adequação do volume de consultas às necessidades dos utentes”, salienta
Já na atividade hospitalar, o maior número de consultas médicas hospitalares face a 2022 (em 3,9%) e de cirurgias (em 7,7%) não foi suficiente para evitar o aumento expressivo do número de utentes em lista de espera para a primeira consulta em 2023 (em 46% face ao ano anterior), bem como o número de utentes em “Lista de Inscritos para Cirurgia” (em 13%), enquanto os serviços de urgência e de internamento continuaram a registar diversos constrangimentos. “Nos episódios de urgência, o cumprimento dos tempos de triagem apenas aconteceu em 60% dos casos (61% em 2022). No internamento, observou-se uma taxa média de ocupação de 91%, superior à taxa de 86% registada em 2022 e a maior dos últimos 10 anos – salientando-se, no entanto, que esta taxa de ocupação engloba situações bastante discrepantes nas várias regiões do país”.
Em relação à Rede Nacional Cuidados Continuados Integrados, o documento revela que o maior número de utentes assistidos em 2023 não foi suficiente para responder ao aumento do número de utentes referenciados nesse ano. Apesar de terem sido assistidos mais 1585 utentes face ao ano anterior, o número de utentes em lista de espera no final de 2023 era superior ao registado no ano precedente, situando-se em 1804. “O aumento de 317 lugares na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados em 2023 resulta do aumento das respostas domiciliárias, uma vez que as respostas que visam a institucionalização dos utentes diminuíram neste ano, existindo menos 17 camas de internamento face a 2022”.
SNS com défice de 435 milhões
O SNS apresentou um défice de 435,1 milhões, em 2023, o que representou uma melhoria de 631,5 milhões face a 2022. “Esta evolução é explicada por um aumento da receita (+1 524 milhões face a 2022) superior ao aumento da despesa (+892 milhões). Nos últimos anos, a despesa do SNS tem sistematicamente superado as receitas, sendo o défice desde logo assumido aquando da proposta do orçamento, de onde resulta um nível de receitas inferior à despesa. No caso de 2023, o défice obtido ficou abaixo do inicialmente implícito no OE/2023 em 62,4 milhões.
A despesa do SNS ascendeu a 14 061 milhões, traduzindo-se num aumento de 6,8% face ao ano anterior (+ 892,3 milhões). Este aumento deve-se, essencialmente, ao crescimento da despesa corrente em 761,8 milhões face a 2022. Com efeito, a despesa corrente tem um peso predominante na despesa do SNS, representando 97,4% do total e concentrando-se, essencialmente, em três rubricas: despesas com pessoal, fornecimentos e serviços externos (FSE) e compras de inventários.
Em 2023, o SNS registou uma diminuição de 387 milhões na dívida a fornecedores externos, atingindo um valor de 1,2 mil milhões, a primeira redução após três anos de consecutivo aumento. “Este decréscimo refletiu-se tanto na redução da dívida vincenda quanto da dívida vencida das EPE e das ARS”.
No entanto, os pagamentos em atraso aumentaram para 141 milhões, um incremento de 122 milhões face a 2022. “Apesar de uma injeção de capital de 1,1 mil milhões em 2023, maioritariamente destinada à cobertura de prejuízos, a dívida estrutural do SNS não foi significativamente reduzida”. O prazo médio de pagamento diminuiu para 96 dias, mas apenas 26% das entidades do SNS conseguiram cumprir a obrigação legal de pagar até 60 dias.