Passaram 100 dias da tomada de posse do Governo de Luís Montenegro. Com isto, podia começar pelo obvio. Podia lembrar o desbloquear da decisão da localização do novo aeroporto, da terceira travessia sobre o Tejo ou da ligação de alta velocidade entre as capitais ibéricas.
Podia falar do plano de emergência para a Saúde. Podia falar do plano de ação para as migrações. Podia falar do pacote de medidas para os jovens. Podia falar do plano de aceleração do PRR, que desbloqueou 3180 milhões de euros e que antecipou o novo desembolso de outros 2903 milhões.
Podia lembrar a importância e a justiça da celebração dos acordos como os professores, com as forças de segurança, com os guardas prisionais ou com os oficiais de justiça. Podia lembrar também a forma como tudo isto foi feito e como o primeiro-ministro e o governo reduziram a oposição ao papel de mero espetador – e, de forma particular, o Chega: lembremos, em singelo, o esclarecedor episódio do «nem mais um cêntimo».
Podia lembrar o aumento extraordinário de 50 euros do Complemento Solidário para Idosos para os pensionistas com rendimentos mais baixos. Ou a eliminação da ponderação dos rendimentos dos filhos para o seu cálculo. Ou os medicamentos gratuitos para os seus beneficiários.
Podia, ainda, lembrar o alargamento das creches gratuitas para o setor privado.
Podia lembrar a redução do IRS para a classe média e a redução das taxas em vigor em dois terços para os mais jovens. Podia lembrar o IRS Jovem até aos 35 anos, a isenção de IMT, de Imposto de Selo na compra da primeira casa ou a garantia pública na compra da primeira casa. Podia, também, lembrar o início do percurso de redução gradual do IRC até aos 15% ou a simplificação do regime de IVA de caixa.
Podia lembrar a agenda anticorrupção apresentada pela ministra da Justiça ou o novo Código de Conduta do governo. E podia lembrar o conjunto de medidas de transparência e de reforço dos meios de fiscalização do PRR.
Podia lembrar o plano de emergência para eliminar as listas de espera na Saúde e os incentivos para a retenção de médicos no SNS. Ou o plano apresentado pela ministra da Juventude para o reforço da oferta de camas no ensino superior. Podia lembrar a disponibilização dos cheques-psicólogo ou a atribuição de bolsas a trabalhadores-estudantes. Podia lembrar o fim do arrendamento coercivo, essa medida soviética que tanto alvoroço e, mais do que isso, dano causou. Podia lembrar o fim das restrições ao alojamento local.
Podia lembrar o sucesso das primeiras eleições com voto em mobilidade (e até o reconhecimento feito ao anterior MAI, numa clara demonstração de humildade e segurança).
Vou, no entanto, optar por lembrar algo diferente.
Em primeiro lugar, vou lembrar como, de repente, ficou para todos óbvio o que vale Luís Montenegro: um homem claramente preparado, sereno, mas atuante. Alguém que não veio para cumprir projetos de poder, mas sim um projeto político concreto (mesmo que com ele não se concorde). Um projeto político ambicioso e que transforme Portugal e, mais importante ainda, a vida dos portugueses. De resto, parece-me mesmo que só os mais distraídos ao seu percurso poderiam vaticinar algo diferente.
Em segundo lugar, vou lembrar que é hoje notória a vontade dos portugueses em manter a situação política estável. Com isto: ninguém perdoará o imediatismo da ainda perdida oposição.
Por fim, lembrar um outro conclusivo aspeto: se tudo o que acaba de ser arrolado foi conseguido em apenas 100 dias, deixemos espaço à imaginação e à confiança para aguardarmos pelo que virá nos próximos anos.