À vitória esmagadora do Partido Trabalhista no Reino Unido, voltando a trazer o centro-esquerda ao governo britânico catorze anos depois, França acompanhou esses ventos de mudança com uma derrota copiosa da extrema-direita na segunda volta das suas eleições legislativas.
Tratando-se de um país decisivo no quadro europeu e na consolidação das instituições europeias, este escrutínio francês captou a atenção do mundo, deixando-o em suspenso face à possibilidade de os extremismos assumirem um protagonismo nunca visto, com perspetivas de participarem na governação de um dos motores a União Europeia. E podem retirar-se várias lições e alertas deste ato eleitoral, aos quais a Europa, em geral, não pode nem deve desviar a sua atenção.
Pelos dados disponíveis, podemos verificar que a maioria dos jovens entre os 18 e os 24 anos optou por votar na união das esquerdas em detrimento do populismo, configurando um interessante caminho de confiança para o futuro. Porém, a esmagadora maioria das classes sociais mais desfavorecidas decidiu votar na União Nacional e nos seus aliados de extrema-direita, assim como as categorias profissionais menos qualificadas, nomeadamente os operários.
Este preocupante cenário obriga a refletir profundamente sobre as políticas sociais e salariais no espaço comum europeu, onde a justiça social, a paridade e, sobretudo, a vertente suprema da igualdade terá de se assumir como prioritária.
Dos ideais da Revolução Francesa e do seu ciclo revolucionário entre 1789 e 1799, responsável pelo fim dos privilégios de alguns, emergiram as bases democráticas assentes nos conceitos da liberdade, igualdade e fraternidade. Passados 235 anos, a ausência de igualdade plena recebeu um aviso sério e necessita de ser prosseguida com total dedicação nos próximos tempos.
Por outro lado, foi quase caricato assistir aos discursos do maior derrotado, caindo no ridículo de atribuir as responsabilidades dos resultados a uma intensa campanha de desinformação. Tal argumento não deixa de ser irónico, no mínimo, por se tratar da ferramenta mais comum destes extremismos. Ao garantir que não vencesse, o povo francês acentuou o seu real sentido de fraternidade nos quadros interno e supranacional, defendendo e assegurando exemplarmente a prossecução da paz, do ambiente e do direito internacional humanitário.
Resta-nos, por fim, a liberdade. Expressa pela massiva vontade e participação populares, França voltou a mostrar ao mundo que o exercício do direito de voto continua a ser a melhor arma perante os perigos do totalitarismo e da intolerância. Quando o povo se apercebe dos riscos para a democracia, a abstenção diminui e a escolha pela liberdade prevalece.
Estas eleições francesas transcenderam-se porque não se limitaram ao seu espaço territorial. Trouxeram consigo uma vitória da humanidade, do Estado Social de Direito e o regresso à agenda dos três pilares da revolução francesa, ficando o desejo que voltem a influenciar e a inspirar o panorama mundial como sucedeu antes.