Três coligações, com estes resultados em número de votos: 1. RN, Direita, com 10M; 2. NFP, Esquerda e extrema-esquerda, com 7M e 3. Ensemble, centro e centro-direita, com 6,5M. Mas graças ao sistema eleitoral francês de traduzir votos em mandatos saiu este resultado: 1. NFP com 176 lugares; 2. Ensemble com 150 e 3. RN com 143. Ou seja, o terceiro em votos passou para primeiro em mandatos, ainda que com menos 3M de votos do que o terceiro. Já falaremos sobre o assunto. Para já, uma nota apenas: com o sistema inglês, maioritário a uma volta, a coligação RN + Ciotti, com os resultados da primeira volta teria tido uma vitória ainda mais esmagadora do que o Partido Trabalhista inglês teve. Pelo sistema português teria tido uma boa maioria relativa. Ou seja: a vontade maioritária dos franceses foi traída pelo sistema eleitoral francês.
Mas vamos agora aos partidos e isto é o mais relevante. Aqui, a vitória do RN foi indiscutível. Na Assembleia Nacional, o RN será o primeiro partido com 126 deputados, o Renaissance o segundo com 98 deputados e o LFI o terceiro com apenas 71 deputados. Das anteriores legislativas para estas, em dois anos, o RN mais do que duplica os votos e sobe de 89 para 126 deputados. Foi isto que todos quiseram esconder.
Ou seja, a grande derrota do RN reduz-se a isto: Só perdeu para os outros dois apenas como coligação e mesmo aí apenas em número de mandatos, que não de votos. Mas, mais relevante: de eleição para eleição o RN vem aumentando o seu número de votos. Nesta eleição mais do que os duplicou. Mais importante do que esta duplicação, em dois anos, dos votos, é o facto de estes representarem hoje, segundo todos os estudos de opinião, uma base de apoio eminentemente transversal, seja do ponto de vista de estratos etário, socioeconómico ou geográfico. Ou seja, representam a França profunda. E, sendo assim, como qualquer sociólogo honesto reconhecerá, representam um movimento imparável que as manigâncias e maquinações do sistema apenas poderão e por pouco tempo, retardar.
Por fim: o objetivo estratégico para o RN era e será sempre, o de colocar Marine Le Pen no Eliseu em 2027 e não o de colocar Bardella em Matignon em 2024. Este pode esperar também por 27. Importante para o RN nestas legislativas era continuar a crescer. A coabitação seria um mal necessário. Mesmo com maioria absoluta, os obstáculos seriam quase intransponíveis (Macron, Conselho Constitucional, Conselho de Estado) e poderiam comprometer o objetivo principal. Saíram furadas as contas a Macron: em vez de queimar Bardella em fogo lento de forma a impedir a eleição de Marine em 2027, com estas eleições e o seu apoio à extrema-esquerda lançou a confusão e a desordem em França. A coligação de esquerda irá implodir, ou explodir. A LFI – ‘aux armes citoyens’ – vai tentar tomar conta da rua. O Ensemble, há anos estável, não vai sobreviver à perda de peso político de Macron, com um salve-se quem puder generalizado. Circo montado. Na primeira fila, sentados, Le Pen e Bardella irão capitalizando. Macron, que se julgava Júpiter no Olimpo, vai ser o Caronte do radical-centrismo europeu. Já estão, em fila indiana, a entrar na barca. Que a travessia do Hades lhes seja propícia. Para bem deles, e de todos nós.