J.D. Vance. O sonho americano

Apesar de uma infância complicada, J.D. Vance conseguiu formar-se em Yale, trabalhar em Silicon Valley, ser senador pelo Estado de Ohio e, em novembro, pode chegar à vice-presidência dos EUA. Mesmo não sendo uma figura consensual, é a personificação do sonho americano.

J.D. Vance foi a escolha de Donald Trump para a vice-presidência na corrida à Casa Branca de 2024. Era um dos nomes mais fortes, por diversos fatores, e acabou por ser nomeado no primeiro dia da Convenção Nacional Republicana – apenas dois dias depois de Trump ter sido baleado de raspão na orelha.

É um jovem de apenas 39 anos, contrastando com a idade do candidato presidencial republicano, mas que conta com uma vasta bagagem de vivências, ainda que nem sempre boas.

Nascido James Donald Bowman no dia 2 de agosto de 1984, J.D. Vance personifica o sonho americano. Adotou o apelido materno Vance após o divórcio dos pais quando era ainda bastante novo, e é esta parte da família que o moldou e que fez com que se tornasse na pessoa que é hoje – para o bom e para o mau.

A história de Vance passa principalmente por duas pessoas: a mãe e a avó (a quem ele chamava de forma afetuosa “Mamaw”). A mãe, que foi enfermeira, viu a sua vida desmoronar-se como um castelo de cartas devido à toxicodependência e foi a responsável por vários episódios comoventes e carregados de tristeza na vida do jovem Vance. Após várias tentativas falhadas de tratamentos, a mãe de J.D .Vance está sóbria há cerca de 10 anos, como o próprio anunciou no Congresso republicano, e é, para Vance, «um orgulho».

Por outro lado, a avó foi o fiel da balança e decidiu levar a cabo a educação do jovem que já se revelava inteligente e perspicaz.

Como o próprio a definiu no último Congresso Nacional Republicano: «Era dura como um prego e era capaz de fazer corar um marinheiro». A plateia procedeu a brindar o recém escolhido para a candidatura à vice-presidência com um momento comovente, gritando «Mamaw» em uníssono.

Todos os episódios da sua infância e das suas origens estão descritos ao detalhe no seu livro de Hillbilly Elegy de 2016, bestseller por vários anos e que serve de inspiração para todos os jovens provenientes de uma América profunda. O sucesso da obra fez com que fosse adaptada ao cinema e está disponível na plataforma Netflix com o nome Lamento de uma América em ruínas.

O jovem de Appalachia acabaria por servir o país na Guerra do Iraque em 2005 e por se formar em direito na Universidade de Yale, numa das mais prestigiadas do país e onde conheceu a futura esposa, Usha Chilukuri, de origem indiana e com quem tem agora três filhos.

De Silicon Valley à política

Após concluir os estudos, J.D. Vance exerceu funções de advocacia durante apenas dois anos, decidindo depois entrar no setor financeiro pela mão de Peter Thiel, um multimilionário, ex-CEO da PayPal e um dos ideólogos da nova direita. Este último foi também o impulsionador da sua candidatura ao Senado.

Quando Donald Trump decidiu concorrer à presidência, J.D. Vance era um crítico acérrimo do agora ex-presidente e recandidato, mas, com o tempo, acabou por se converter ao catolicismo, garantindo que «com o tempo, convenci-me que o Catolicismo é verdadeiro», e sarou feridas com Trump que inclusive o apoiou na sua eleição como senador pelo Estado do Ohio em 2022. Este processo de conversão religiosa é descrito minuciosamente e de forma bastante articulada num artigo publicado na revista The Lamp em 2020 chamado How I joined the Resistance (Como me juntei à resistência).

J.D. Vance é visto como o sucessor de Trump na liderança do partido Republicano e é uma das faces mais importantes da nova linha política e filosófica do partido: o pós-liberalismo. Uma corrente ideológica que vem colocar um ponto final no “reaganismo” que dominou o partido republicano durante décadas e que quer substituir a ordem liberal reinante, onde as elites atuais e o establishment são substituídos por novas que melhor representem os interesses dos cidadãos comuns, como explicou Patrick Deenen na sua obra Regime Change.

J.D. Vance parece não ser apenas o par perfeito para Donald Trump em 2024, como também o seu possível, e até natural, sucessor.