PRRCascais: muita resiliência, pouca recuperação

Em Cascais, olhámos para o PRR com muita seriedade.

Estávamos em junho de 2021 quando Ursula von der Leyen visitou Portugal para validar o PRR. Tudo se encaminhava para que os 16,6 mil milhões da bazuca começassem a cair com estrondo na economia portuguesa.

Vivia-se um período economicamente grave e a recuperação do nosso país seria lenta.

O PRR foi visto como a última grande oportunidade para Portugal sair da cepa torta. Em Cascais, olhámos para ele com muita seriedade. Estávamos organizados, tínhamos demonstrado capacidade de gestão e definido uma estratégia para a coesão social que permitiu avançar nas áreas da Educação, Saúde, Ambiente e Cultura.

Faltava a Habitação. O que considero ser um dos direitos constitucionais e humanos mais mal tratados. Um problema não só das franjas socialmente mais deprimidas, mas também das famílias de classe média.

Olhemos para trás.

Sob a governação do Presidente Cavaco Silva, Portugal apresentou o último Plano de Habitação em 1993 – Plano Especial de Realojamento – que visava erradicar as barracas e realojar famílias que viviam em condições precárias.

Durante três décadas, as autarquias fizeram revisões de PDM, restringindo o licenciamento de construção privada. Em 8 anos de governo PS foram aprovados, em média, 2600 fogos/ano. Nos primeiros 9 anos da coligação CDS/PSD, a nível local, 1300. Durante os meus mandatos (2011-2023), aprovaram-se 380 fogos/ano.

Tudo isto levou a uma retração do próprio investimento privado. Com uma oferta pública de habitação nula, investimento privado baixo e o aumento da procura, deparámo-nos com a atual ‘crise da habitação’.

A resposta a este problema deve ser dada pelos poderes públicos. No entanto, as câmaras por si só não têm capacidade financeira para suportar esta situação.

Em Cascais, fizemos a nossa parte. Em abril de 2022 aprovámos a Estratégia Local de Habitação, no valor de 162M€, a qual fizemos chegar ao Governo.

O Acordo de Colaboração veio a ser assinado em novembro de 2022, na presença do Ministro das Infraestruturas e da Habitação e da Secretária de Estado da Habitação.

Em novembro de 2023, foi aprovada em Reunião de Câmara a atualização da estratégia no valor de 342M€. Destes, a CMC suportou com meios próprios 101M€, assumindo o IHRU que iria fazer um empréstimo bonificado para a autarquia, de 109M€, através do BEI. O PRR suportaria 132M€, cujos projetos tiveram de ser submetidos pela autarquia para análise e posterior aprovação.

Problema: o Governo anterior não teve consciência que o IRHU estava sem capacidade de resposta. Por esta altura, de todos os projetos submetidos, apenas foram aprovados cerca de 12M€.

O antigo PM vem ainda afirmar que eram precisas 26 mil casas para, ‘nos 50 anos do 25 de Abril, garantirmos a todos os portugueses o direito a uma habitação adequada’. Na verdade, eram necessárias mais do que o dobro. Logo, mais dinheiro.

Numa primeira fase, e de forma a substituir a ineficiência do IHRU, o novo Governo propõe às autarquias a assinatura de um termo de responsabilidade que, a concretizar-se, dará a Cascais a aprovação de 80 candidaturas (50M€). Mesmo reforçando o PRR em 400M€, o PM reconhece que não será suficiente – quando, à data, Cascais tem ainda 65 candidaturas por aprovar (92M€).

O IRHU ou o Governo nunca comunicaram que não tinham condições para cumprir aquilo que assinaram. E a CMC não ficou parada.

Considerando a escassez de terrenos, e tentando não evoluir com os perímetros urbanos para cima do espaço natural, a autarquia adquiriu mais de 150 ha de terrenos, sendo que em muitos deles não se pode construir e ficarão para espaços verdes.

É urgente garantir que este problema não se volta a repetir daqui a 30 anos. É crítico rever a Lei dos Solos. É crítico que o Estado Central continue a fazer investimento público e proteja o exercício dos investimentos privados.

Tudo isto para que haja, finalmente, uma política de habitação que sirva as pessoas.