E depois dos Jogos Olímpicos?

Também o sistema internacional corre para as medalhas do possível, deixando para trás, quem tiver que ficar. Mesmo que por boas razões!

Vivemos um período de euforia desportiva com a realização dos Jogos Olímpicos de Paris. É extraordinário que o mundo, desportivo e todos os outros, se revejam no maior dos acontecimentos desportivos a nível mundial. Bem estiveram os antepassados da Grécia Antiga que em 776 a.C. deram luz aos Jogos Olímpicos da Antiguidade. A Cidade-Estado de Olímpia em honra de Zeus, honrava os atletas, os sábios, religiosos, filósofos e o povo. Por agora, os jogos do nosso tempo, também eles glorificam os atletas e o poder das nações. Na verdade os jogos são muitas vezes o reflexo inaudito do sistema internacional. Sempre complexos, sempre em busca de um equilíbrio contido. Também o sistema internacional corre para as medalhas do possível, deixando para trás, quem tiver que ficar. Mesmo que por boas razões!

A geopolítica mundial vive também ela neste ambiente dual. Ou seja entre a simplificação e a complexidade. No contexto internacional em que vivemos, com as guerras e os conflitos em curso, tudo se revê na simplicidade e na complexidade. Depende do ângulo, da perspetiva, da visão, ou melhor dos interesses. Esses sim verdadeiramente olímpicos.

Daniel Innerarity escrevia no seu livro (Uma teoria da democracia complexa – 2021) que “A principal ameaça à democracia não é a violência nem a corrupção, ou a ineficiência, mas sim a simplicidade. Ninguém diria que o simplismo, com o seu ar de inocente descomplicação, pode atuar de maneira tão corrosiva sobre a vida política, mas há alturas em que os inimigos menos evidentes são os mais perigosos”.

Em boa razão, as democracias vivem muitas vezes da complexidade. Ao invés as autocracias e ditaduras preferem a simplificação. De métodos e de argumentos. Também tem sido assim na Venezuela dos nossos dias, dos dias dos Jogos. As ambiguidades crescentes que os atores internacionais trazem para o espaço internacional, refletem-se sempre nesta intrépida disputa de poderes.

Ironia, jogos e poder não se entendem? Talvez. Mas porque não, ainda acreditar que no 05 de novembro dos Estados Unidos, possa ser esse o dia esperado de uma complexa simplificação da ordem internacional? O certo é que Harris ou Trump não poderão deixar de ser juízes dominantes de todos estes desafios e obstáculos que o atual sistema internacional atravessa. A democracia e a liberdade têm sofrido duros reveses pelo mundo. As constantes ameaças à própria soberania e integridade dos Estados registam recordes. O Médio Oriente agrupa eixos que intensificam cada vez mais políticas de ódio e antagonismo. O Presidente turco Erdogan ameaça em tom imperial atacar Israel! Salvar Gaza e a sua população não parece ser objetivo prioritário. Por seu lado, Putin sonha alargar fronteiras e teme que outros se intrometam. Nos intervalos ameaça com o nuclear. A China nas palavras dos dirigentes da NATO, ganhou alcunha da “facilitadora decisiva” da Rússia. China que procura gerir todas estas intempéries geopolíticas, de modo aparentemente simplificado. Tão simplificado que poderemos estar à porta de uma nova “guerra fria”.

Mas afinal que tem tudo isto a ver com os Jogos Olímpicos? Talvez nada. Mas o melhor é perguntarmos ao Presidente Macron, o que vai fazer na sua gestão de política interna, daqui para a frente com as “medalhas” que as últimas eleições trouxeram, porque a Europa que também corre (devagar), precisa de se organizar. Ainda que em modo complexo, como todos já percebemos.

Coronel e especialista em geopolítica
Eduardo Caetano de Sousa | LinkedIn