Querida avó,
Em Lisboa tem estado um calor insuportável. Para refrescar-me, tenho aproveitado para comer uns gelados. Como sabes, os meus preferidos são os gelados de cone. Não percebo como existem pessoas que preferem comer gelados em copo. Nem sequer é comestível! O que faz aumentar a pegada ecológica. Sabes como me preocupam as causas ambientais…
Consta que quem “inventou” os benditos cones foi a namorada de um vendedor de gelados. Enrolando uma bolacha para o impedir de pingar, à semelhança do ramo de flores que tinha recebido do vendedor. Não sei se é verdade, mas romântico é certamente.
Ainda esta semana ouvi uma expressão que não ouvia há anos: «Isto está de ananases». A frase original de Eça de Queiróz, usada na Correspondência de Fradique Mendes, fazia referência ao calor do mês de agosto.
Mudando de assunto, tens visto os Jogos Olímpicos? Adorei a Cerimónia de Abertura. Ao contrário do habitual, a abertura dos Jogos Olímpicos não aconteceu num estádio. Foi “à grande e à francesa”, inovaram e realizaram a cerimónia no Rio Sena.
Sabes, porventura, que cada medalha, seja de bronze, prata ou ouro, vai ter 18 gramas de ferro do ponto turístico mais famoso da França? A Torre Eiffel, construída em 1889, passou por diversas reformas nos últimos anos. Os pedaços substituídos foram guardados e serão utilizados na parte central das medalhas.
Foi, precisamente, há cem anos que os portugueses receberam a primeira medalha olímpica. Os Jogos de Paris de 1924 foram o palco da História, conquistada por quatro cavaleiros que “estavam bem longe da categoria dos seus adversários”. De tal forma que, a organização nem sequer tinham a bandeira de Portugal. Tiveram que improvisar usando um pano vermelho e outro verde, imagina.
Aproveita muito a tua amada Ericeira, onde o inverno vai passar o verão.
Pelos menos é mais fresco.
Bjs
Querido neto,
Eu sempre disse, (e volto a dizer), que se aprende muito com os mais novos. Mas mesmo muito. Eles sabem coisas que nós nem imaginamos.
Se não fosses tu, não sabia fazer “zooms”, teria muito mais dificuldades a trabalhar com o telemóvel, a impressora e com suportes de armazenamento…
Claro que os mais novos também aprendem com os mais velhos! O importante é manter as ligações intergeracionais!
Pasma-te com o que aprendi aqui na esplanada da Paria do Sul, na Ericeira:
Há um grupo de miúdas, aí dos seus 12, 13 anos, que se senta sempre numa mesa ao lado da “minha”. Há uma que nunca se cala e é um gosto ouvi-la. Às vezes até tomo notas para não me esquecer.
Há dias ela estava muito contente porque a avó tinha ido lá a casa e tinha-lhe dado uma jarra muito bonita, do tempo em que o avô andara na guerra.
«Qual guerra?», perguntou a outra.
«Então, quando a África nos atacou»
«A África atacou-nos?»
“Claro! Nunca ouviste falar disso? Entrou por Lisboa e atacou o país inteiro. Não escapou nenhuma cidade. Nunca viste aquele canhão que está ali diante da praia? Ficou cá desse tempo»
«E isso foi quando?»
«Então, ainda o meu avô era vivo! Aí por volta do século 18»
A conversa de hoje também foi muito instrutiva.
Falou-se de Lisboa e logo ela disse para a outra:
«Sabes que Lisboa nem sempre foi no sítio onde está hoje?»
A outra abriu a boca de espanto.
«Não? Então era onde?!»
«Na Serra da Estrela. Até há uma cantiga que fala disso»
E cantarolou:
«Lisboa nasceu/pertinho do céu…» Nunca ouviste?
«Ouvi, claro, acho que é uma marcha. Mas por que é que dizes que foi na Serra da Estrela?»
«Porque a Serra da Estrela é o sítio mais alto de Portugal. O que fica mais pertinho do céu. Estás a perceber?»
Ora agora diz-me lá: sabias disto? Eu juro que não sabia.
Fartei-me de aprender coisas com ela, embora aprenda mais contigo!
Bjs