Há quem diga que são os nossos “melhores amigos”. Que é muito mais fácil gostar deles do que de pessoas, já que nos aceitam como somos, sem qualquer tipo de julgamento. São uma fonte de apoio emocional, diminuem o stresse e a ansiedade, trazem responsabilidade. Fazem-nos companhia, mantêm-se perto quando sentem que não estamos bem e, sejam caninos ou felinos, são cada vez mais as pessoas que veem os seus animais domésticos como membros da família. Se, por um lado, há quem não tenha filhos, projetando esse amor nos seus patudos, há quem, mesmo com duas crianças, tenha espaço num apartamento para… cinco gatos.
A casa dos gatos
“Eu, a minha companheira e os nossos dois pequenos de oito anos, partilhamos a casa com cinco gatos. A Flor, a Arya, o Gaspar, a Kyara e a Frida. Quatro fêmeas e um macho”, começa por contar ao i Tomás Pereira, adiantando que “não foi uma escolha”. “Aconteceu e nós não fomos capazes de nos separar mais deles”, sublinha. Após o falecimento de um importante “membro da família” – também ele um gato, o Bambi – Tomás e a companheira decidiram adotar Arya para fazer companhia à Flor nas ausências do casal. “Felizmente, deram-se bem e estávamos muito satisfeitos por voltarmos a ser seis cá em casa”, conta. No entanto, um dia, a companheira estava numa esplanada e ouviu um miar bebé vindo de baixo de um carro estacionado. “Depois de algum esforço lá conseguiu agarrar o pequeno gato preto, meio desorientado. Poucos minutos depois, uma senhora entrou na viatura e arrancou. Acho que foi esse o gatilho que a fez trazê-lo para casa sem pensar duas vezes. Eu não estava presente mas apoiei, sem hesitar, a adoção do Gaspar. Passámos a ser sete!”, lembra. Para surpresa da família, o gatinho, que teria provavelmente três meses (e que só poderia ser castrado aos seis), acabou por engravidar uma das gatas, a Arya. “É uma gatinha de pequeno porte e só muito tempo depois é que começámos a notar uma bolinha de cada lado do ventre. Isso levou-me a dizer que só seriam dois, um menino e uma menina, como os nossos filhos humanos. Falhei por pouco”, brinca.
Nasceram então a Kyara e a Frida. “Foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida”, afirma Tomás. “Escolheram o dia seguinte ao meu aniversário. Depois de uma noite e uma madrugada de festa e comemorações, às 9h da manhã sou acordado com: ‘Amor! Amor! Acho que foste avô!’. Era a minha companheira, enquanto procurava debaixo da cama. Lembro-me de levantar o tronco, sentar-me na cama, abrir os olhos e ver a Arya. Tinha encontrado o conforto de um edredom caído no chão, perto de nós, sabendo que ali, se precisasse de alguma coisa, era só miar. Assim foi. A Kyara já estava cá fora e miava. Já a Frida não teve a mesma sorte, estava a sair mas em marcha atrás, viam-se já as pernas traseiras e um pouco das costas. Aproximamo-nos para tentar perceber como podíamos ajudar. A Arya já estava muito cansada, não estava a empurrar e a Frida estava parada. Os minutos estavam a passar e tínhamos que fazer alguma coisa. Enquanto eu me aconselhava com a minha sogra por telefone, que já tinha passado por um processo idêntico, a minha companheira auxiliava a Arya. Puxou a Frida com cuidado, limpou-a e felizmente conseguiu ajudá-la a mandar fora todo o líquido que tinha ficado preso e não a deixava respirar”, descreve emocionado. “A Frida tinha sobrevivido e passámos a ser nove!”, acrescenta. Segundo Tomás, esse foi um dos momentos da vida em que se sentiu “mais vivo e concretizado”. “Não aquele sentimento que já conhecia da concretização profissional ou social. Mais intenso, mais íntimo. Como se estivéssemos os sete enfiados num ninho, unidos, quentinhos, a ajudar a vida a acontecer”, explica. “Família para mim é partilha, amor, entreajuda, respeito e aprendizagem. Os meus gatos dão-me isso tudo, como poderia não os considerar família?”, interroga, frisando, contudo, que o amor que sente por eles e pelos filhos é diferente. “São amores completamente diferentes, necessidades e convivências completamente distintas. São coisas que se complementam, não que se substituem. É maravilhoso uma criança crescer com um animal como companheiro ou cuidador”, acredita.
Filhos peludos
Alexandra Santos, de 38 anos, começou por ter uma cadela pinscher, oferecida pelos seus pais, quando tinha 24. Foram eles que escolheram a raça por acharem piada ao tamanho e à personalidade destes animais. “Sempre quis ter animais e sempre pedi muito aos meus pais”, revela. Não somos propriamente apologistas de comprar, mas o que é certo é que esta raça não se consegue adotar. Não existem em canis. Os cães pequenos são os mais fáceis de serem adotados”, explica.
Quando a Becky tinha um ano e meio foi atropelada por um descuido dos seus pais. “Nesta altura, eu já vivia no Algarve e ela passava uma temporada comigo, outra com eles. Como se sentiram culpados pela situação, compraram outra cadela e um cão, para ficar um comigo e outro com eles: o Tom (Sawyer) e a Becky”, lembra.
Segundo Alexandra, alguns veterinários defendem que é importante as cadelas terem pelo menos uma ninhada, para evitar quistos, gravidezes psicológicas, etc. “A Becky tinha quatro anos quando teve três filhotes e a seguir foi esterilizada. Não os teve com o Tom, uma vez que considerámos o cão demasiado grande para ela”, esclareceu. Dessa única ninhada, a família decidiu ficar apenas com um cachorro. O meu pai escolheu o Benny e eu sentia uma empatia enorme pelo Pipo. “Acabei por ceder e o Pipo foi entregue à família do pai dele. Chorei baba e ranho, nem quis estar presente na entrega, foi terrível e pensei: ‘Nunca mais nenhum animal meu terá ninhadas porque não me consigo desapegar deles’”, admite.
Passado quase um ano, Alexandra descobriu que Pipo sofria de maus tratos. O seu pai, que trabalha no Sepna, na GNR, foi chamado por uma queixa de maus tratos animais. “Coincidentemente quando chegou, era o Pipo… Reconheceu o meu pai, subiu-lhe pelas pernas e lambeu-o, cheio de alegria. Estava maltratado, pele e osso, um cheiro imundo, mordido nas orelhas e cheio de traumas… Passava o dia às escuras fechado numa casa de banho. Nunca passeava e as necessidades eram feitas naquele cubículo. O procedimento normal seria ir para o canil, mas visto ser filho da nossa cadela, o meu pai pediu de imediato para ficar com ele. Quando cheguei a casa dos meus avós para passar o Natal, o meu avô escondia-o atrás das costas e sorria. Já calculava a felicidade que eu ia sentir por ter o Pipo novamente comigo. E assim foi! Nunca na vida imaginei que isto pudesse acontecer…
Alexandra vive com o Pipo e com o Benny (oito anos). “Os seus pais têm o Tom e com a Becky (12 anos). “Os meus cães são os meus filhos. Escolhem-nos, sabem a nossa missão e acompanham-nos nela. São eles que me esperam em casa todos os dias”, explica, acrescentando que “cada vez mais pessoas optam por ter animais invés de filhos”. “A vida encaminhamo-nos para escolhas diferentes do tradicional”. Todos os anos, para assinalar a data dos seus “filhos”, Alexandra prepara uma festa, com tudo aquilo a que têm direito. “Tento sempre assinalar a data com uma festinha com os quatro cães. Já fiz o bolo, mas também já encomendei de lojas específicas para a ocasião. Bolo, biscoitos, donuts para cães. Compro brinquedos ou bolas como presentes de aniversário. Eles adoram”, revela. Mas nem todos os momentos são de harmonia. Tal como os filhos humanos, os patudos também sentem ciúmes. Alexandra recorda um episódio que a traumatizou. “Na época natalícia, convidaram-me para fazer uma sessão de fotos com eles, mas não correu bem… Houve luta entre o Pipo e o Benny (ciúmes), saí de lá com a roupa ensanguentada e o Pipo com menos um dente. A não repetir”, garante.