Estou de férias… É bom ter férias… É bom descansar… Dolce far niente! Eu gostaria de estar sempre de férias, como muitos pensam que os padres costumam estar! Que boa a vida dos padres, dizem alguns!
Eu gosto de não fazer nada… de ter tempo livre… de poder pensar, num mundo onde já ninguém pensa e que começou a pensar pela cabeça de outros… Já não confrontamos ideias, não temos autocrítica, não somos capazes de ter um pensamento próprio…
Somos carneiros… que vão atrás do que nos fazem acreditar como verdade! Quando a verdade é uma realidade que se desvela e se revela, na medida em que é buscada em cada tempo, em cada dia, em cada forma de nos encontrarmos com ela.
A verdade… é sempre a verdade… a pureza mais pura do encontro humano com aquele pensamento que não se pode contradizer!!! Apenas se pode alienar.
As férias servem para não se fazer nada, mas principalmente para se fazer o que não se pode fazer ao longo do ano… Ter longas horas de leitura e de estudo e, deitados no sofá, olhar para o teto e pensar no que não se pensa.
Penso na minha história e na minha vida e naquilo que me levou a entregar-me à Igreja!
Lembram-se da música que reuniu dezenas de artistas para ajudar milhares de crianças, mulheres e homens do continente africano que sofriam de fome? Lembro-me de ver na televisão camiões com sacos de cereais que eram lançados para o chão e centenas de pessoas a tentar apanhar um pouco daqueles cereais… era algo comovente… algo que não se pode nunca mais esquecer na vida.
Lembro-me de ver crianças, como eu, naquele tempo, que tinham uma barriga enorme… Eu achava que estavam saciadas de tanto comerem, mas os meus pais garantiram que era uma barriga de fome!
Lembro-me que ao chegar à adolescência, pensei que deveria entregar a minha vida e ir para África para salvar tantas pessoas que sofriam de fome… Tantos homens e mulheres que estavam desesperados para alcançar um pouco de comida para darem aos seus filhos…
Volvidos trinta anos, vejo como as coisas mudaram, como os interesses, a compaixão e o amor se descolaram para bens maiores do que o auxílio da humanidade.
Sentado, na praia, junto ao mar, penso na minha vida… e na minha missão… Já passaram vinte e quatro anos… Tudo passa… Tudo vai passar. Não sei se para melhor, mas passa!
Ao lado vejo um casal com uns meninos… vejo também a quantidade de casais que aparecem com cães ao colo. Vi um casal com ‘carro de bebé’, mas, na realidade, era um ‘carro de cão’ – dentro do dito carro estava um cão a passear com os seus donos…
E penso! Penso! E penso! Que mundo este!
Há quarenta anos, comovia-me ver um pobre, um menino subnutrido, um povo em guerra. Algo de compaixão! Um movimento de amor pelo outro que me impelia a um desejo de amar.
Hoje, acredito que temos maior compaixão pelos animais do que pelos homens, os atribulados, os pobres… Hoje, corremos o risco de rebaixarmos a humanidade… de desumanizarmos a humanidade!
Gostaria de estar errado, mas penso que não! Realmente, as grandes causas que nos comovem não têm nada a ver com a humanidade, mas com ideologias desencarnadas da própria vida humana.. Porque, o que importa, mesmo, é descansarmos à beira mar sem pensar em nada