Redes sociais. A relação entre o poder dos influenciadores digitais e as compras online

Muitas das vezes, estamos a fazer scroll nas redes sociais e encontramos influenciadores digitais a falarem de x ou y produto enquanto o mostram. Que impacto têm no consumo online?

Mariana (nome fictício) é uma jovem natural de Lisboa e desde cedo começou a produzir conteúdos para as plataformas online. Primeiro, no YouTube e, depois, em redes sociais como o Instagram e o TikTok. Começou a ganhar cada vez mais seguidores e, por isso, surgiram as parcerias com marcas. Umas que solicitou e outras que lhe foram propostas. Uma destas últimas foi a parceria com a SheIn, uma das gigantes chinesas que tem dominado a mente e as carteiras dos consumidores de e-commerce nos últimos anos.

“Sempre achei que uma parceria como esta poderia dar-me acesso a variadas peças. Principalmente, de moda, e que muitos seguidores ficariam mais interessados nos meus conteúdos por causa disso mesmo”, diz a influenciadora que conta com muitos milhares de fãs. “Estas colaborações com grandes marcas como a SheIn aumentam, sem dúvida, aquilo a que chamamos engajamento e a visibilidade também”, refere a jovem, salientando pontos positivos como o da oportunidade de oferecer códigos promocionais exclusivos aos seus seguidores.

Porém, não esconde que existem pontos negativos que a incomodam e fazem questionar se deve continuar esta parceria. “A SheIn tem enfrentado críticas sobre questões relacionadas com a sustentabilidade e as condições de trabalho e isso deixa-me indecisa. Tanto que há muitas pessoas que levantam preocupações éticas e ambientais nos comentários. Muitas das vezes, não respondo, porque tenho medo de dizer sempre a mesma coisa, mas sei que isto acaba por ter impacto na minha imagem”, assume.

Outra influenciadora que tem uma base de seguidores semelhante à de Mariana, mas que também não quer revelar o nome – chamemos-lhe Luísa –, iniciou uma parceria com a Temu e, apesar de gostar muito dos produtos que recebe, teme, tal como Mariana, as consequências deste trabalho. “Existem imensas coisas positivas. Por exemplo, dependendo da parceria, pode haver uma compensação financeira significativa. E também penso que, como a SheIn, a Temu poderá investir mais em oportunidades como a co-criação de coleções ou a participação em campanhas especiais no futuro”, declara, lembrando campanhas que ficaram conhecidas do grande público como a da coleção cápsula de Bruna Gomes (antiga concorrente do Big Brother Famosos) para a SheIn.

“O problema são as outras coisas de que não se fala tanto. Há quem tenha uma perceção muito negativa da qualidade dos produtos desta loja. E, claro, como já não vê com bons olhos aquilo que vendem, também não me vai considerar alguém fidedigno. E é pior se comprar algo que publicito e não gostar”, conta Luísa, descrevendo outra situação que não é do seu agrado. “Eu sei que a Temu está a fazer aquilo que as suas concorrentes fazem, mas realiza muitas parcerias com influenciadores e criadores de conteúdo. E, portanto, quando temos alguma parceria com esta loja… Não é propriamente algo exclusivo e especial”, justifica.

Como se estabelecem as parcerias? 

O Programa de Afiliados da SheIn permite que influenciadores, celebridades e profissionais de marketing ganhem comissões de até 20% ao promover produtos da marca. Após inscreverem-se e serem aprovados, recebem um link de afiliado exclusivo para incluir nas publicações. A SheIn usa esse link para controlar as vendas feitas através de cada parceiro e calcular as comissões do mesmo. O marketing de afiliados tem crescido significativamente e deve alcançar 15,7 mil milhões de dólares (14.18 mil milhões de euros) até ao final de 2024, segundo o Business2Community.

Já o Programa Temu Influencer procura criadores de conteúdo para promover os seus produtos. Ao inscreverem-se, os influenciadores podem obter um link de afiliado e um código para partilhar com os seus seguidores. Aqueles que são aprovados podem escolher campanhas e produtos de interesse e receber itens gratuitos. Além disso, o programa oferece recompensas de 5 dólares (equivalente a 4.52 euros) por cada visita feita através do link e até 20% de comissão nas vendas. Embora muitos influenciadores recebam produtos grátis e elogiem o programa, não há comprovação sólida de pagamentos em dinheiro, com a maioria dos benefícios a revelarem-se em créditos e itens gratuitos. 

A controvérsia No ano passado, um grupo de influenciadores de moda americanos recebeu críticas online após ter visitado uma fábrica da SheIn na China e ter publicado as suas impressões dessa mesma viagem. A marca enfrenta questões sobre os preços baixos, a transparência das práticas de trabalho e o impacto ambiental da sua produção. Os influenciadores visitaram o centro de inovação da SheIn em Guangzhou e partilharam as suas experiências positivas nas redes sociais, incluindo vídeos de trabalhadores alegadamente felizes e tecnologia avançada. A SheIn afirmou que esta tour refletiu o seu compromisso com a transparência e permitiu que os influenciadores mostrassem como é que a empresa opera.

Apesar da popularidade da SheIn, especialmente entre a Geração Z, há preocupações sobre a origem dos materiais e as condições de trabalho, principalmente devido a alegações de trabalho forçado na região de Xinjiang, na China. O Congresso dos EUA está a investigar essas alegações e a exigir transparência. Influenciadores como Kenya Freeman – designer de moda e influenciadora digital conhecida pelo seu trabalho com moda e pela sua presença nas redes sociais – e Dani Carbonari – influenciadora e modelo de tamanho plus size, conhecida pela sua presença nas redes sociais, onde partilha conteúdo relacionado com moda, beleza e estilo de vida – enfrentaram uma enorme onda de críticas, com alguns utilizadores a questionarem se a fábrica visitada realmente representa as práticas de produção da SheIn.

O que dizem os estudos? Na dissertação de mestrado The Impact of Social Media Influencers on Consumer Perception about the Product and Purchase Intention, Rita Vicente Rodrigues tenta entender a forma como as estratégias de marketing de influenciadores nas redes sociais impactam a forma como os consumidores percecionam os produtos e como isso influencia as suas intenções de compra. A pesquisa revela que a credibilidade e a confiança que os consumidores têm num influenciador são fatores determinantes na formação de perceções positivas sobre produtos. Influenciadores que são percecionados como autênticos e especialistas no seu campo têm maior capacidade de impactar as intenções de compra dos seguidores.

A forma como os influenciadores comunicam as suas recomendações e interagem com os seus seguidores também desempenha um papel crucial. O engajamento direto e a comunicação personalizada ajudam a construir uma relação mais forte e entre o influenciador e os seus seguidores, o que pode aumentar a intenção de compra. Por outro lado, a autenticidade percecionada no influenciador é fundamental. Se os consumidores acham que o influenciador está a promover produtos de forma genuína e não apenas por compensação financeira, a eficácia da campanha de marketing é significativamente aumentada.

Mas também existem estudos internacionais que apontam no mesmo sentido e outros que abrem caminho para outras conclusões. Por exemplo, em The Power of Influence: Traditional Celebrity vs Social Media Influencer, é comparada a eficácia dos influenciadores digitais em relação às celebridades tradicionais no impacto sobre as decisões de compra dos consumidores, com foco na forma como a perceção de autenticidade e a conexão social influenciam a eficácia dos influenciadores.