A profissão que exerço desde 1982 ensinou-me, entre outras coisas, que tão importante é o conteúdo do que se escreve como a forma utilizada para o efeito, entendendo aqui o termo “forma” como o que ele significa de correção gramatical, ortográfica e fonética. Imaginam, portanto, o que me custa aceitar o Novo Acordo Ortográfico e, acima de tudo, ver as absolutas barbaridades hoje escritas, quer em livros falhos de edição competente, quer na imprensa e televisão – nas legendas de filmes e séries, nos rodapés que acompanham as notícias ou na publicidade que transmitem – aspeto a que nem a rádio escapa…!

Escusando-me a referir os cuidados que tínhamos, à época, antes de emitir um qualquer documento, fosse ele interno ou, mais relevante, para o exterior, passo a apresentar alguns exemplos do pior que tenho visto e ouvido nos últimos tempos. Erros que revelam, alguns, distração (posso admiti-lo), outros a mais profunda ignorância, outros ainda que indiciam que os diversos intervenientes – quem escreveu, quem aprovou, quem publicou – não tiveram o mínimo cuidado em estudar os temas e rever a forma final.

Começo por um exemplo relacionado com o regresso às aulas:

  • Fez a FNAC uma campanha promocional recente em que é apresentado um triângulo retângulo, com os lados devidamente identificados (A, B e C), colocando ao seu lado uma expressão matemática que traduziria o famoso teorema de Pitágoras. Essa fórmula era A2= B2+C2. Não seria necessário conhecer esse teorema, nem mesmo saber o que é a hipotenusa ou um cateto: bastaria olhar para a figura, para as dimensões de cada um dos lados, para se perceber que a fórmula estaria errada, uma vez que o quadrado do lado visivelmente menor nunca poderia ser igual à soma dos quadrados dos restantes dois…
  • O referido grupo de origem francesa reconheceu, entretanto, o lapso, dizendo que se encontra em processo de substituição dos roll up banners, atribuindo o dito erro a um problema tipográfico. Pergunto: não há quem reveja o material antes de ele ser impresso? Para que servem os conteúdos em maquete e as artes finais?
  • Aomesmo tempo, um grupo de telecomunicações, a MEO, estimula a adesão à rede de fibra com a oferta de um determinado produto da Microsoft. E fá-lo relembrando que se assinala uma rentrée em tamanho familiar. Tudo estaria bem, não fosse dar-se o caso de a designada voz off revelar que a língua francesa é para ela território desconhecido; para ela e para toda a equipa da agência publicitária e do cliente que acompanham estas gravações. A que propósito a palavra rentrée é pronunciada como se fosse “riantrê”? Como pôde tanta gente deixar passar este erro fonético que diariamente invade as casas dos portugueses?

Outros exemplos que valerá a pena referir, por absurdos que são (a tal deformação profissional leva-me a ir reparando nas falhas deste tipo):

  • Em campanha relacionada com o financiamento à economia (creio que às pequenas e médias empresas agrícolas) o Millennium BCP utiliza, em spot de rádio, a expressão “meter o motor a trabalhar”. O verbo meter, aliás usado a torto e a direito – já vi, em legendas, “vai meter a mesa”! – está aqui usado a despropósito, constituindo um erro. Põe-se um motor a trabalhar, põe-se uma mesa. Aplica-se a mesma dúvida: ninguém reviu? Ou tudo não passa de ausência de conhecimento?
  • Uma vez mais, num outro spot de rádio, ainda da distribuição (Continente), uma mãe fala ao telefone com a filha, que se encontra em fase final de gestação e precisa de sair para fazer umas compras. A mãe preocupa-se e pede-lhe que não ande de um lado para o outro por causa dos enjoos. Enjoos em fase final de gestação? Será certamente muito, muito raro. Quem produziu o anúncio não saberá que, em regra, os ditos enjoos desaparecem por completo às 16 semanas? E quem o aprovou também não fez o trabalho de casa?  
  • Finalmente, o que dizer de “Bunckingam Palace”, de “Em direto do local do epicentro” ou “como deve de ser” (na televisão), usar a palavra “totalitário” para se referir a um jogador que disputou todos os jogos da época (em A Bola), inscrever as palavras “cabeleileiro” ou “botox não evasivo” nas montras de lojas, que por sinal funcionam das tantas “ás” (com acento agudo) tantas? Ou do que se lê na imagem a seguir?

Tanta ignorância! Não sabendo, será boa ideia que procurem antecipadamente informar-se. Ou, em desespero de causa, sugiro que leiam um livro de vez em quando.