O assalto ao MAI que não foi por acaso

Um sem-abrigo acordou às cinco da manhã e descobriu que se trepasse os andaimes de um prédio em obras poderia saltar para o prédio contíguo e levar oito computadores com informação confidencial…

Assalto, mentiras e vídeo, pode ser o título do filme que envolveu o roubo de oito computadores que estavam nas instalações da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, no passado dia 28. A história é tão inverosímil que fontes ligadas à segurança interna, contactadas pelo Nascer do SOL, questionam se estamos todos na escola primária.

«Ficámos a saber que um sem-abrigo tem dotes de visionário e que descobriu, por volta das cinco da manhã, que se subisse uns andaimes de um prédio em obras que iria ter acesso a outro prédio onde estavam oito computadores à sua espera – que continham informação classificada. Alguém acredita que este homem não estava a fazer uma encomenda», questiona fonte ligada à segurança interna. Vejamos o que diz o Ministério da Administração_Interna (MAI) sobre o homem aranha da rua de São Mamede, local do crime: «De acordo com as informações recolhidas, o detido tem já um vasto histórico criminal, cumpriu pena de prisão em França, por crimes de igual natureza, evadindo-se daqueles estabelecimentos prisionais e terá regressado a Portugal no início do presente ano, vindo, desde então, segundo está a apurar-se, a praticar ilícitos da mesma natureza». Para um sem-abrigo que entrou, por acaso, num prédio do Estado com informação classificada não está nada mal. «Mas se a Polícia já sabe do seu historial é natural que outros também o soubessem e que tenham recorrido aos seus préstimos, até porque passa bem por tontinho», acrescenta outra fonte.

Vamos a factos: o autor do crime, de 39 anos, terá assaltado as instalações na madrugada de 28 de agosto e acabaria por ser detido cinco dias depois, mas já sem os computadores – a Polícia acredita que terá vendido no dia seguinte, na zona do Rossio. Algo extraordinário, pois «se o homem foi preso na segunda-feira e até ontem não tinha dito a quem tinha vendido os computadores é porque os deve ter furtado para oferecer a outros sem-abrigo», ironiza outra fonte policial.

Computadores com informação privada?

As primeiras notícias davam conta de que os computadores furtados continham informação privilegiada, nomeadamente concursos públicos, como a compra das bodycams para a PSP, entre outros negócios. Também foi noticiado na quinta-feira da semana passada que as câmaras de vigilância da Secretaria-Geral do MAI não estavam a funcionar , mas o Ministério resolveu esclarecer tudo: «Contrariamente ao que vem sendo propalado, não corresponde à verdade que as câmaras de videovigilância, do edifício que sofreu a intrusão, estivessem avariadas ou desligadas, na altura da intrusão, já que estavam a funcionar normalmente e as imagens eram visíveis no respetivo posto de controlo», mas, no entanto, «é verdade que havia uma falha na gravação de imagens que é uma coisa distinta do que vem sendo propalado por várias fontes não fidedignas». Eu adoro a palavra genial…

Já quanto à informação que os computadores podem ter, o MAI_não tem dúvidas: «Importa, agora – e não antes, para não comprometer as investigações que estavam em curso – esclarecer que dos oito computadores furtados, só dois estavam a uso e os restantes eram computadores de reserva/substituição. Porém, em ambos os casos, seja nos computadores de reserva/substituição, seja no caso dos dois computadores que estavam a uso, não existiu, nem existe, qualquer risco de acesso a qualquer informação e ou documentos, confidenciais ou não».

Fonte das secretas portuguesas diz ao nosso jornal que os computadores «têm muita informação, inclusivamente dados pessoais, e até a colocação do pessoal das forças de segurança em missões internacionais». De que lado estará a razão? Talvez a auditoria interna que a ministra da Administração_Interna irá pedir possa dizer quem está a falar verdade…

«A negligência é tão gritante que não se percebe como alguém ainda não assumiu as culpas, e não estamos da falar da ministra, pois se um edifício nuclear do Estado, que tem obras no prédio ao lado, não tem a sua segurança reforçada é porque algo está muito mal. Qualquer analista de segurança, seja de informações, seja de infraestruturas, diz logo que quando há obras ao lado reforça-se a segurança. É uma negligência brutal», diz fonte das forças de segurança.

«Na cerimónia de tomada de posse do Secretário-Geral da Secretaria-Geral da Administração Interna, Marcelo Carvalho, que decorreu no dia 21 de outubro [2020] no Ministério da Administração Interna, Eduardo Cabrita sublinhou a importância que esta estrutura tem na afirmação e execução do Programa do Governo na área da Administração Interna», lê-se na página oficial do Governo de então. «O Ministro recordou que a Secretaria-Geral tem vindo a ganhar novas competências, ao longo dos anos, o que lhe coloca novos desafios, nomeadamente os que vão ser executados por esta nova equipa: ao nível das tecnologias e da segurança digital», lia-se ainda… .