O verão está a chegar ao fim. As redes sociais ainda estão repletas de fotografias dos nossos amigos, registadas em lugares mais ou menos extravagantes e exibindo, em comum, muitos sorrisos felizes. Os dias começam a encurtar, enquanto a cidade recupera as suas rotinas. Fazemos contas, com apreensão, aos acrescidos furos no cinto, e também à nossa vida, porque o subsídio de férias não chegou para as despesas.
Foi um verão como tantos outros. Houve quem se queixasse do calor e quem reclamasse do nevoeiro. Houve quem ficasse em solo pátrio e se arrependesse de ter comprado um automóvel elétrico, que os condenou a terríveis filas para carregamento. Houve ainda quem tenha desafiado a paciência nos infernos aeroportuários, para rumar ao estrangeiro. Agora, regressados a casa, já não somos turistas e podemos voltar a reclamar contra a turistificação.
A grande novidade foi o terramoto, que não chegou a assustar, tendo servido sobretudo para alimentar anedotas. Garantem-nos que o dispositivo de prevenção funcionou, mas todos sabemos o que teria sucedido se o sismo fosse de grau 7 em vez de se ficar pelo 5. O que vale é que os especialistas nos asseguram que foi bom este pequeno abalo ter acontecido, seja por razões científicas indecifráveis, seja por acreditarem que, pelo cálculo de probabilidades, a terra não deve voltar a tremer tão cedo.
Entretanto, o Ministério da Administração Interna foi assaltado. Pelos vistos, as instalações do ministério responsável pela nossa segurança são mais vulneráveis do que qualquer ourivesaria de bairro. Os ladrões eram idiotas, pois parece que se limitaram a roubar sucata informática. A Comissão Nacional de Proteção de Dados deve estar radiante porque as câmaras de vigilância não funcionaram, preservando-se assim o direito inatacável da ladroagem ao anonimato.
Na Madeira tivemos um grande incêndio a animar as televisões com relatos exaustivos sobre ‘meios’, ‘operacionais’ e ‘suspeitas de fogo posto’. Depois, descobriu-se que foi tão-só um episódio de estupidez coletiva, provocado pela idiotice de lançar foguetes numa das muitas festas hediondas que infernizam o nosso verão. Em nome do orgulho autonómico, Albuquerque tentou dispensar a ajuda daqueles a quem Jardim apelidava de ‘cubanos’ e não quer que Marcelo Rebelo de Sousa visite o ‘mato ardido’. Mas o que motivou as maiores críticas ao líder madeirense foi ter retomado as férias em Porto Santo, pouco depois de regressar brevemente ao Funchal para gerir a resposta ao incêndio e sem sequer se deslocar ao teatro de operações.
Curiosamente, Luís Montenegro foi criticado, e até ridicularizado, por ter tido uma presença ‘excessiva’ no palco operacional da tragédia do Douro. Neste caso, soubemos que as autoridades não atenderam o telefone a quem presenciou o acidente e socorreu o piloto. E também soubemos que os militares que morreram não tinham treino específico para reagir em situação de queda na água, ainda que se reconheça que de nada lhes teria valido face à violência do impacto. Faleceram homens que colocavam a vida em risco a debelar incêndios e que regressavam, aliás, de uma operação de combate a um fogo que, provavelmente, resultara de idiotice humana.
Sim, o país é sempre mais perigoso no verão. Morre-se nas estradas e nos incêndios, nas praias e nos rios. Supostamente, está a terminar a trágica silly season, anglicismo que quer dizer ‘época idiota’ ou ‘época dos idiotas’, e vamos entrar na rentrée, galicismo impronunciável para a maioria dos portugueses que significa ‘regresso’. Mas temo, pelo que vou lendo e ouvindo sobre linhas vermelhas, referendos e ultimatos, que esta seja uma silly rentrée.