Dezoito Anos Depois, Saber O Que Se Quer

O que nasceu noutro mundo e noutra Europa não ignora que dificilmente poderá ser só observador e narrador.

Convida o Diretor Mário Ramires a escrever duas palavras no décimo oitavo aniversário do SOL, agora Nascer do SOL.

Recordo o facto de ter sido seu breve colaborador. Tendo testemunhado a aventura de quantos saíram da grande referência chamada Expresso – de antes do 25 de Abril e da construção contínua do pós 25 de Abril – para lançarem novo semanário, com o sonho de marcarem um ciclo novo e diferente.

Para essa recordação, de há a caminho de vinte anos, vai a minha primeira palavra.

Foi uma aventura temerária, mas muito simbólica, de um tempo de transição. Do século XX e do seu final, que alterou por completo a História de Portugal, para a busca de novos cenários, novos caminhos, numa Europa e num mundo a mudarem aceleradamente.

Para esse mundo e essa Europa vai a minha segunda palavra.

Nestes dezoito anos, o mundo passou da ilusão do unipolarismo perfeito, ou com aliados, para a crença no multipolarismo com multilateralismo, para o crescimento do protecionismo e a descrença no multilateralismo, o anúncio dos novíssimos confrontos e o regresso de alguns antigos, ou a vingança dos poderes perdidos, e o emergir dos há muito esperados ou temidos.

Até que as fragilidades de sistemas tidos por inexpugnáveis e as guerras aparentemente regionais, mas efetivamente globais, ou continentais, vieram revisitar a balança de poderes universal.

E por aí estamos. No fim de um ciclo e no ainda indefinível nascer de outro.

No lusco-fusco que não é aurora. Quando tantas incertezas e tantas expectativas podem depender deste compasso de espera e daquilo que acabe por se afirmar e durar, ou apenas seja a quimera sem futuro.

Assim está o mundo. Assim está a Europa.

Quando se vive presentes como este, o melhor é curar menos do que será, e tratar de saber o que se quer que venha a ser.

Porque esse querer, minúsculo que seja, pode fazer uma diferença entre um cenário e outro cenário.

Faz a diferença querer-se Liberdade, Democracia, melhor Democracia, dignidade das pessoas, Justiça, Igualdade, Direitos Humanos, respeito da diferença, da tolerância, Europa com estes valores, e, nestes contextos, sempre Portugalidade universal.

Não é, muitas vezes, hoje, o vento que mais sopra ou sopra com maior intensidade.

Mas, para quem escolhe querer assim, continuar a querer assim, o que, verdadeiramente, conta é encarar a espera, a indefinição, como desafio para querer, mais e melhor, e não meramente como oportunidade para aguardar desfecho que vier, sem nele se envolver, nem cuidar de nele, ao menos milimetricamente, intervir.

Claro que há outros caminhos, no mundo, como na Europa, como no que nos é ainda mais próximo. Aliás, a Democracia, para quem a assume, tem essa óbvia pressuposição.

Dezoito anos depois, neste virar de página, o que nasceu noutro mundo e noutra Europa, não ignora que, dificilmente, poderá ser só observador e narrador e que, mesmo quando se convence de que só narra, de facto está a optar, escolher, tomar posição, seguir um caminho.

Não pode nem deve omitir, ocultar ou fazer de conta de que outros não existem e não pesam.

Não obstante, tem o seu caminho. Que não se limita a esperar. Corre o risco de escolher.

Quanto ao mundo, à Europa e, evidentemente, a Portugal.

Palácio de Belém, 10 de setembro de 2024