Francisco Calheiros reconhece que a falta de mão-de-obra continua a ser uma realidade para o setor, mas admite que a situação estará mais normalizada quando forem regularizados os 400 mil migrantes que ainda falta resolverem os seus processos junto da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). No entanto, não hesita em reconhecer que “o recurso à imigração é a única solução para muitos setores de atividade”.
Quanto à proposta do Governo em relação ao aumento do salário mínimo nacional para o próximo ano, a Confederação do Turismo de Portugal, enquanto parceiro social diz que prefere não se pronunciar, uma vez que está a decorrer um período de reuniões bilaterais solicitadas pelo Governo. Já em relação ao futuro da TAP, Francisco Calheiros admite que não sabe se “será possível encontrar um comprador que queira desenvolver a TAP, que pretenda captar sinergias e que o consiga fazer tendo um acionista de peso como é o Estado português”.
Opinião marcante tem Francisco Calheiros em relação ao futuro novo aeroporto de Lisboa, defendendo que é necessário uma alternativa intermédia “porque vai demorar anos até Alcochete estar a funcionar”. E não hesita: “O Montijo deve ser uma solução intermédia enquanto não há Alcochete e em paralelo seria bom também que o país tivesse o quanto antes a solução ferroviária de alta velocidade, com ligações Porto-Madrid e Lisboa-Madrid por TGV”.
Como avalia o turismo em Portugal?
O turismo em Portugal está numa fase de consolidação do seu crescimento sustentável, destacando-se nomeadamente a captação de novos mercados, como é o caso dos Estados Unidos e Coreia do Sul, devido a voos diretos para estes dois países. Estes são destinos estratégicos para Portugal e contribuem para o desenvolvimento do nosso Turismo e da expansão da marca Portugal em mercados muito importantes e de futuro.
Este verão assistiu-se a uma quebra de turistas nacionais em determinadas regiões, como o Algarve, por apresentarem preços “proibitivos”. Como vê esta situação?
Quando assistimos ao aumento de turistas estrangeiros é normal que a percentagem de turistas portugueses tenda a descer, relativamente ao todo. Por outro lado, o que os números dizem é que a redução de portugueses no Algarve foi residual. Os preços dependem de muitos fatores. E nos últimos anos há demasiados fatores externos com implicações nos preços praticados. Basta ver o aumento dos custos com a energia, com combustíveis e a inflação. E na verdade não se verificou que o aumento dos preços tenha afastado assim tantos clientes. Basta olhar para os dados e perceber que, pelo contrário, aumentaram as dormidas e os hóspedes em geral. Como disse, a redução de portugueses foi residual.
Quais são as perspetivas até ao final do ano?
Os dados que tenho permitem-me dizer que assistiremos a um aumento das dormidas totais entre 2% a 3% e a receita tenderá a crescer no final do ano acima destas percentagens.
Como vê as vozes contra o “excesso de turismo” e o facto de descaracterizar determinas cidades como Lisboa?
Não há turismo a mais. Há sim economia a menos e uma gestão pouco eficiente do território a vários níveis. Por isso, defendo que têm de ser criadas condições que permitam o aparecimento de novas centralidades para minimizar impactos. Que o crescimento do turismo deixa pegada, é uma realidade, como qualquer outra atividade económica. Por isso, deve haver uma melhor estratégia da gestão dos fluxos turísticos.
Há freguesias de Lisboa, como a Graça e Alfama, que pedem outro tipo de turistas, isto é, que gastem mais, nomeadamente na restauração…
A CTP, como órgão de cúpula do turismo e numa estreita ligação com o Governo, tem como estratégia ter cada vez melhores turista. Mas, como é normal, não nos compete a decisão onde devem almoçar ou jantar.
E em relação às vozes críticas que dizem que a economia devia ser mais diversificada e que deveria apostar em outros setores?
O turismo vale cerca de 15% do PIB, criando imenso valor para a economia. Há mais 85% do PIB que depende de muitos outros setores.
Como analisa o peso do setor na economia?
O turismo continua a ser o motor da economia portuguesa, quer se queira quer não se queira. É um facto. Muito do crescimento da nossa economia em 2023 deveu-se ao contributo do turismo, que tem um peso no PIB próximo dos 15%. O turismo cria valor: é fator de desenvolvimento de outras atividades; gera emprego e é um importante contribuinte para o Estado pelos impostos que paga.
Se por um lado, a atividade contribuiu para dinamizar as cidades, por outro há quem diga que por culpa do turismo assistimos a um aumento dos preços, nomeadamente da habitação…
Permita dizer-lhe que essa é uma ideia com que não concordo. Os preços da habitação não dependem exclusivamente de haver mais ou menos turismo. É injusto referir que os preços da habitação dependem do turismo. Veja-se antes o seguinte: só se construíram ultimamente 20% de habitação nova em relação à última década. Esta sim, é uma razão de peso.
Outro problema do setor diz respeito à falta de mão-de-obra. Como vê as medidas apresentadas pelo Governo em relação à imigração?
A CTP ‘aplaude’ todas as medidas de política pública que, por um lado, possibilitem às empresas colmatar as suas necessidades de mão-de-obra com garantias de legalidade e, por outro lado, se constituam como um garante de condições mínimas de inclusão para os migrantes que procuram o nosso país para trabalhar. Estamos atentos à aplicação das novas regras de implementação dos novos sistemas de controlo de fronteiras. Contudo, olhamos com expectativa para a intenção de melhoria da capacidade de resposta e processamento nos postos consulares; para a reestruturação das competências e organização interna da AIMA [Agência para a Integração, Migrações e Asilo]. A falta de mão-de-obra continua a ser uma realidade, mas neste momento, a situação está mais normalizada e quando forem regularizados os 400 mil migrantes que ainda falta resolverem os seus processos, penso que a falta de mão de obra deixará de ser um problema. Mas o recurso à imigração é a única solução para muitos setores de atividade.
O Governo apresentou uma proposta de salário mínimo nacional em Concertação Social. O que acha deste aumento? E é praticável do lado das empresas?
De momento prefiro não me pronunciar muito acerca do tema do salário mínimo, já que estamos num período de reuniões bilaterais que foram pedidas pelo Governo e prefiro aguardar pelas conclusões destes encontros e pela proposta governamental final. Tem sido esta a postura da CTP em todas as mesas negociais.
Em relação ao Orçamento de Estado para 2025, o que seria desejável para o setor?
Desejo que seja aprovado um Orçamento para 2025, porque o que menos precisamos é de novas eleições, instabilidade política ou um país a viver de duodécimos. Se for para continuarmos a crescer menos, enquanto país, que todos os outros, então que se crie mais um problema político. Julgo que as pessoas estão cansadas disso.
Em relação à TAP como vê as novas polémicas em torno da empresa?
Não vou comentar. Sobre a TAP o que digo é que a privatização da empresa deve ser eficaz. Por outro lado, defendo que a solução deve passar por uma privatização total e quem ficar com a TAP tem de garantir o hub, os empregos e as ligações áreas às ilhas e à diáspora.
Acredita que é possível a venda parcial da TAP?
Não sei se será possível encontrar um comprador que queira desenvolver a TAP, que pretenda captar sinergias e que o consiga fazer tendo um acionista de peso como é o Estado português. Como tenho referido, é difícil a TAP manter-se orgulhosamente só. Veja-se o caso das grandes companhias como a Air France ou a Iberia.
E em relação ao novo aeroporto, está à espera de que desfecho?
O aeroporto é uma necessidade nacional e não só do turismo. Portugal precisa de ter um novo aeroporto, disso não haja dúvidas. É fundamental para toda a economia. Agora, não podemos é estar à espera que se conclua o aeroporto em Alcochete – opção que não discuto. O que fazemos até lá? Estagnamos até à construção do novo aeroporto? Podemos dar-nos a esse luxo? Tem de haver uma alternativa intermédia porque vai demorar anos até Alcochete estar a funcionar.
O Montijo deve ser uma solução intermédia enquanto não há Alcochete e em paralelo seria bom também que o país tivesse o quanto antes a solução ferroviária de alta velocidade, com ligações Porto-Madrid e Lisboa-Madrid por TGV. Ainda sobre o aeroporto, referir que deveria haver um cronograma relativo ao processo de Alcochete, agora que esta localização está decidida. Se não há, tem de haver. Se por acaso já está definido, tem de ser público.