Kris Kristofferson. Um homem à séria, de Nashville a Hollywood

1936-2024. Morreu aos 88 anos  o cowboy da renascença à americana.

Kris Kristofferson, o cantor e compositor cujas canções tinham uma desenvoltura literária embora fossem tudo menos rebuscadas, capazes de usar os termos mais simples para atingir de forma rigorosa uma forte sensação emotiva, e que infundiu, assim, a música country com uma franqueza e profundidade raramente ouvidas, este homem que soube ainda reinventar-se e ter uma segunda carreira de sucesso no cinema, morreu no passado sábado na sua casa em Maui, no Havai, aos 88 anos.

Este prolífico compositor que viria a triunfar em Hollywood quando era já uma lenda em Nashville, decidiu retirar-se em 2021, depois de uma carreira de seis décadas. Ao longo dos anos, centenas de artistas gravaram as suas canções, de Johnny Cash a Janis Joplin, de Al Green aos Grateful Dead, de Michael Bublé a Gladys Knight.

A vida de Kristofferson não dava um filme, porque as peripécias e o sucesso que alcançou pedem uma série com várias temporadas. Afinal, estamos a falar de um capitão do exército, que se licenciara em Literatura inglesa e recebeu uma Bolsa de Estudos Rhodes da Universidade de Oxford. Mais tarde abandonou a carreira militar para se dedicar à música em Nashville, e viria a ganhar quatro Grammys antes de se virar para a representação, trabalhando com cineastas como Michael Cimino, Sam Peckinpah e Martin Scorsese. Foi galardoado com um Globo de Ouro depois de Barbra Streisand o chamar para protagonizar com ela o primeiro remake de A Star is Born. Sem nunca abandonar os palcos, quando chegou à meia idade ainda formou um supergrupo de country que montou a sua cabina no topo das tabelas, juntamente com Cash, Waylon Jennings e Willie Nelson. Continuou a gravar e a atuar até aos 80 anos, aparecendo regularmente em filmes. Encarnou o caçador de vampiros Abraham Whistler nos três filmes da série Blade.

Mas a sua história só é verdadeiramente inspiradora porque conta igualmente com uma série de infortúnios e dificuldades. Teria sido muito mais fácil para Kristofferson se se tivesse contentado com a carreira no exército em vez de perseguir os seus sonhos. Durante vários anos, o mais próximo que chegou de uma carreira musical foi ao conseguir um trabalho como contínuo nos estúdios da Columbia, ganhando algum dinheiro aos fins de semana a pilotar helicópteros para as plataformas petrolíferas no Golfo do México.