Escrevi na semana passada sobre a armadilha que Luís Montenegro montou ao PS e a Pedro Nuno Santos na aprovação do Orçamento do Estado. Em vez de se voltar para o Chega, como seria natural, virou-se para o principal partido da oposição. Muita gente não percebeu. Então a oposição é que tinha de viabilizar o Orçamento do Governo? Parecia absurdo. Mas não era.
A grande preocupação de Montenegro não era ver o OE aprovado: era entalar o PS.
Era responsabilizá-lo por um eventual chumbo do Orçamento.
Ao desafiar Pedro Nuno Santos a negociar, Luís Montenegro poderia provocar uma de duas reações: ou ele rejeitava, e aí seria legitimamente acusado de radicalismo, ou aceitava negociar, e envolver-se-ia num labirinto donde seria muito difícil sair.
E, no fim, caso votasse contra o Orçamento, seria visto como o principal responsável pela queda do Governo e pela realização de eleições.
Os culpados não seriam o PCP, nem o Livre, nem o BE, nem sequer o Chega – o culpado de tudo seria o Partido Socialista.
E os eleitores não lhe perdoariam em futuras eleições.
A partir do momento em que aceitou negociar o OE, Pedro Nuno Santos começou a fazer diariamente declarações sobre o tema, atrapalhando-se, avançando e recuando, e finalmente traçando as suas ‘linhas vermelhas’ (expressão muito na moda): não aceitava o IRS jovem e a descida do IRC.
Tudo isto eram tentativas para salvar a face, pois todos já haviam percebido que não tinha escapatória.
Caíra na armadilha montada pelo PSD, e já se sabia que tinha de deixar passar o Orçamento.
Caso contrário, ficaria como o mau da fita.
Em todo este processo, Pedro Nuno Santos mostrou alguma inabilidade política.
O que deveria ter feito logo de início?
Deveria ter-se calado.
Não produzir declarações sobre o assunto.
Gerir o silêncio.
Manter o tabu até ao fim.
E no fim deixaria passar o OE em nome do ‘interesse nacional’.
Aí, sairia por cima.
Assim, vai sair por baixo.
Mas se Pedro Nuno Santos falou de mais, André Ventura também não esteve nada bem. Já referimos a despropositada proposta de trocar o ‘sim’ ao OE por um referendo sobre a imigração.
Mas o que tinha a ver a bota com a perdigota?
E depois amuou e disse que estava fora de tudo – mas manteve-se dentro.
E admitiu votar a favor do Orçamento se o Governo deixasse cair este e fizesse outro – o que era evidentemente uma impossibilidade.
É estranho que, sendo André Ventura um homem inteligente, ainda não tenha percebido que as exigências que faz aos outros atores políticos têm de ser razoáveis e exequíveis.
Ao fazer propostas que os outros não podem aceitar, desgasta-se; perde credibilidade.
Já dissemos o que deveria ter feito Pedro Nuno Santos nesta questão. E André Ventura? Qual teria sido para ele a melhor estratégia? Como devia ter-se conduzido? De uma forma muito simples: dizendo logo no princípio: «O Chega votará favoravelmente o Orçamento do Estado, porque eleições neste momento não são boas para o país e os portugueses não as desejam». Dizia e estava dito. A partir daí, a questão ficava arrumada: Luís Montenegro não podia fazer jogos políticos e o PS deixaria de estar no centro das atenções, pois o OE tinha a aprovação garantida.
Acontecesse o que acontecesse, o responsável pela viabilização do Orçamento seria o Chega – que surgiria perante os portugueses como um partido construtivo, não politiqueiro, que tinha olhado não para os seus interesses mas para o interesse nacional.
Como um partido responsável, que contribuía para a solução e não para o problema.
André Ventura acabou por ter de o dizer, mas já no fim da linha e sem o impacto que teria no princípio.
Concluindo, Pedro Nuno Santos falou de mais, desgastou-se, caiu na armadilha do PSD e ficou em posição difícil.
E André Ventura não disse aquilo que deveria ter dito logo de início – e que ‘mataria’ outras conversas e faria dele o partido central do processo.
Pedro Nuno Santos e André Ventura têm qualidades óbvias, mas nesta novela revelaram uma apreciável imaturidade.
Nisso, Luís Montenegro bateu-os por KO.