O realinhamento político internacional

Se os EUA começarem a afastar-se dos seus aliados, podem acabar aliados a regimes autoritários, em vez de defenderem o mundo livre.

A invasão da Ucrânia pela Rússia revelou uma lição clara: a NATO, como está estruturada atualmente, falha em dissuadir agressões de potências como a Rússia. Este conflito expôs a fragilidade de alianças que, para serem eficazes, devem projetar força e unidade incontestáveis. Se a NATO não conseguir intimidar os seus adversários, não será capaz de prevenir futuras crises globais, o que representa a sua falha mais grave.


No panorama político europeu, estamos a testemunhar um realinhamento que fragiliza tanto a coesão interna como a capacidade de enfrentar ameaças externas. O Parlamento Europeu não tem uma maioria de direita suficientemente coesa para formar uma frente unida. O Partido Popular Europeu (PPE), tradicionalmente o principal defensor da NATO, encontra-se isolado, enquanto outros partidos de direita mostram simpatia pela Rússia ou assumem posturas anti-NATO, enfraquecendo uma estratégia de segurança comum na Europa.


Neste cenário global, a política interna dos Estados Unidos assume um papel central. O Partido Republicano, que historicamente apoiava alianças fortes e uma ordem internacional liderada pelos EUA, foi transformado pela influência de Donald Trump. As suas políticas de ‘America First’ ameaçam desmantelar décadas de cooperação transatlântica, abrindo caminho para uma perigosa estratégia de ‘America Alone’. Se os EUA começarem a afastar-se dos seus aliados, podem acabar aliados a regimes autoritários, em vez de defenderem o mundo livre.


Essa mudança já tem impactos visíveis. O protecionismo americano e o distanciamento de Washington criam fissuras nas suas alianças tradicionais. Países como a Alemanha podem reconsiderar as suas relações geopolíticas, especialmente se os EUA impuserem tarifas extra, como sugerido por Trump. Esse afastamento transatlântico poderá empurrar a Europa a fortalecer laços com a China, alterando drasticamente a dinâmica de poder no continente.


Ao mesmo tempo, os EUA enfrentam um dilema interno. Enquanto muitos americanos reconhecem que uma vitória de Putin representa uma ameaça direta à sua segurança, cresce a insatisfação com o custo da guerra. Uma boa maioria defende que os recursos destinados à Ucrânia deveriam ser investidos na economia interna, uma posição amplamente sustentada pelos apoiantes de Trump, que questionam a falta de uma estratégia clara para a vitória na Ucrânia.


Apesar dessas tensões, há uma realidade incontornável: ninguém quer enfrentar a China sozinho. Este receio partilhado pode ser o que manterá viva a relação transatlântica, apesar das divergências comerciais e políticas. A decisão de Joe Biden de levantar as sanções ao Nord Stream 2, pressionado pela Alemanha, foi interpretada como uma prioridade americana de conter a China, em detrimento da segurança energética europeia. Isso enfraquece a confiança entre os aliados, mas reforça a necessidade de cooperação.


A verdadeira lição da Ucrânia vai muito além da NATO. O futuro da ordem mundial está em jogo, e os Estados Unidos têm nas mãos a decisão mais crítica: continuar a liderar o mundo livre ou virar costas aos seus aliados históricos, abrindo caminho para que potências autoritárias como a Rússia e a China ganhem força. As eleições de novembro nos EUA não vão apenas definir o rumo de uma nação, mas sim o equilíbrio de poder global. Se os Estados Unidos se isolarem, deixam a Europa exposta, sozinha num jogo perigoso de sobrevivência contra regimes que desafiam as normas internacionais. A escolha é simples, mas o impacto é gigantesco: manter o Ocidente unido e forte ou entregar o tabuleiro de xadrez geopolítico a quem não joga com as mesmas regras. O mundo está atento – e a História não vai perdoar o lado errado.