A economia do OE

Qualquer OE arrisca-se a frustrar as expectativas de quem espera encontrar um documento fundador.

Existem dois modos de olhar para o Orçamento do Estado (OE) para 2025. O político centra-se nos processos negociais, nas estratégias dos intervenientes, nos vencedores e vencidos. Foi este que dominou opinião publicada; acrescenta pouco sobre a substância do que está em causa. A perspetiva económica analisa de forma positiva (por oposição a normativa ou juízos de intenções) o impacto do OE na economia. Permite saber se todo o ruído mediático se justifica. É desta que falarei hoje.


Qualquer OE arrisca-se a frustrar as expectativas de quem espera encontrar um documento fundador. Em parte, porque uma fração importante da despesa (certamente mais de 80%) é predeterminada, isto é, resulta da estrutura administrativa do Estado, do contrato social existente e de compromissos assumidos no passado. Logo, o OE não é o sítio para procurar medidas que induzam alterações estruturais na economia. Os compromissos europeus limitam também a margem de manobra dos governos quanto aos valores do saldo orçamental e da despesa. Estas limitações não significam, contudo, que não seja possível mudar a composição da receita (o peso dos diferentes impostos) e da despesa (através, por exemplo, do balanço entre despesa corrente e de capital ou da distribuição pelas diferentes funções). Estas alterações da composição são desvalorizadas; todavia, nelas reside muito do que o orçamento pode fazer para alterar os incentivos ao trabalho, poupança e investimento e, assim, estimular o crescimento do produto potencial salvaguardando a sustentabilidade orçamental. O OE 25 contempla duas destas alterações de ‘composição’, que são emblemáticas: o IRS jovem e a redução do IRC.


Sendo a acumulação de capital humano essencial para um aumento da produtividade, compreendem-se as tentativas de atrair e reter profissionais altamente qualificados. Contudo, quer proposta de IRS jovem posta a sufrágio pelo PSD quer, por maioria de razão, a muito enfraquecida versão que resultou da negociação com o PS, dificilmente terão um impacto significativo nos fluxos de emigração jovem e na retenção de talento. A razão é simples: a decisão de emigrar não é tomada olhando apenas para o futuro imediato, mas para todo o ciclo de vida ativa que vai muito para além dos 35 anos e que contempla, para além do salário, as perspetivas de progressão nas carreiras, a natureza dos desafios profissionais e a qualidade de vida. Suspeito que terão sido 500 milhões desperdiçados.


A visão tradicional de organismos internacionais como a OCDE é a de que entre todos os impostos, os impostos sobre os lucros das empresas são aqueles que mais comprometem o crescimento económico. Sabe-se, também, que a sua incidência económica se reparte por todos os stakeholders incluindo trabalhadores e consumidores. Não obstante este consenso sobre a direção dos efeitos, a sua quantificação é delicada. Um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos coordenado por Pedro Brinca da Nova SBE estima que o efeito multiplicador de uma redução de 7,5 pontos percentuais na taxa efetiva do IRC (de 27,5% para 20%), uniformemente distribuído por todos os escalões, terá um efeito multiplicador de 1,5: por cada 10 milhões de euros de perda de receita de IRC (financiada por idêntico aumento dos impostos sobre o consumo) o rendimento real aumentará 15 milhões. Trata-se de um número “gordo” por comparação com outros estudos, mas que se reduz grandemente se a redução de 7,5 pontos da taxa efetiva se concentrar nos escalões superiores do IRC (uns “meros” 5 milhões, aproximadamente). Assim, parece razoável antecipar que a minúscula redução de 1 ponto da taxa do escalão de topo dificilmente fará mexer o ponteiro do crescimento económico.
Enfim, a discussão sobre o OE 25 é ‘muito barulho por nada’.