Depois de alguns meses de loucura política, a propósito da suposta discussão da politica orçamental para 2025, o país quer agora tranquilidade e deseja poder estar confiante com o futuro imediato.
Bastou que o secretário-geral do PS tivesse anunciado que ‘ordenaria’ ao seu partido e ao respetivo grupo de deputados, um voto de abstenção na discussão parlamentar do Orçamento.
Para confirmar a verdadeira natureza desta ‘ordem’ e os mecanismos de poder instalados no atual PS, é suficiente atentar na unanimidade que a decisão mereceu nos órgãos do partido, mau grado o ambiente de grande divisão interna que antecedeu a decisão.
Entretanto a comunicação social, sempre ofegante, assumiu o novo karma e passou a qualificar o gesto de Pedro Nuno Santos, como revelador de um elevado sentido de estado.
De ‘vilão’ a ‘herói’ bastaram apenas 24 horas.
Nem o facto deste anúncio ter sido feito várias meses depois do tempo adequado, nem a justificação contraditória que serviu de base à opção, induziram a que a maioria dos comentadores produzisse uma análise forte, pedagógica e imparcial sobre a matéria.
Ora, sejamos claros, o atual PS ao alimentar, durante vários meses, uma novela irresponsável, com um ziguezaguear irritante da sua dupla liderança, produziu um significativo dano no funcionamento normal das instituições e, mais grave do que isso, permitiu um enorme protagonismo ao partido Chega com tudo o que isto significa de perigo para o regime e para a democracia.
Neste espaço sempre se defendeu, desde cedo e várias vezes, que o PS devia anunciar, logo após eleições, a sua abstenção perante o primeiro orçamento, reduzindo uma eventual discussão prévia ao mínimo indispensável (compromissos com a UE).
A propósito Luciano Amaral perguntava, com inegável sentido de oportunidade, quem é que afinal tem interesse em «promover e normalizar o Chega»?
Felizmente que este partido extremista depende de um líder que se ‘espalha na primeira esquina’ e, assim, os danos acabam, mais cedo que tarde, por serem controlados.
Mas não é apenas a questão do timing arrastado até ao limite, apesar da sua enorme gravidade, que deve ser analisada e referida.
O anúncio do voto foi justificado com um conjunto de argumentos que todos os agentes políticos já conheciam, apesar de, sistematicamente, ignorados pelo partido da oposição, mas também por considerações de natureza político-partidária que sendo usadas, só podiam servir para suportar uma posição contrária à viabilização do orçamento.
Mas agora já ‘sabemos’ que o OE será viabilizado à entrada, também à saída (?) e, no meio, que é onde reside o maior espaço para a demagogia e para a irresponsabilidade, logo se vê. Depois quem vier atrás que feche a porta.
Absoluto nonsense político que parece ter deixado a maioria social extasiada, incluindo o governo, mas que, a não ser que as coisas tenham mudado muito na cabeça dos protagonistas (hipótese que, face ao histórico, surpreenderia), ainda pode trazer surpresas desagradáveis.
E se tal suceder quem fica a perder é a credibilidade dos políticos, o que se enfraquece são as instituições e quem se prejudica é o país que continuará sem condições para lançar as reformas necessárias para o crescimento económico e para a estabilidade social.
Mas não alimentemos demasiadas ilusões, o atual PS, liderado pelo duo Pedro Nuno Santos e Alexandra Leitão, tem um sonho e um objetivo, que assume, mais ou menos abertamente, honra lhe seja feita.
Esse projeto político e esse sonho é o de criar um frentismo esquerdista de caráter ideológico e estrutural sucessor da ‘geringonça’ mas distinto porque esta foi apenas uma solução conjuntural utilizada para concretizar as ambições pessoais do seu criador.
O atual PS não é agora, infelizmente, o PS que Mário Soares fundou e que sempre colocou o interesse do país, à frente do interesse partidário.
Voltará a sê-lo?
Por isso a imprevisibilidade mantém-se…e isso não é uma boa notícia para Portugal.