A armadilha que Montenegro montou a si próprio

No discurso de encerramento do Congresso Luís Montenegro resolve roubar duas das bandeiras do Chega e agitá-las bem alto.

Algumas linhas, apenas as necessárias, sobre o gran finale do psicodrama orçamental. Ambos, Pedro Nuno Santos (PNS) e Luís Montenegro (LM), tentaram usar André Ventura (AV) como o idiota útil daquela peça de teatro de aldeia: À direita do palco e por trás da cortina, LM acenando com umas miríficas vagas promessas ‘a vê-lo-emos’ contra um muito concreto e real voto favorável do Chega a este orçamento; na outra ponta do palco, à esquerda, PNS acreditando piamente em que AV cairia na armadilha de votar favoravelmente o Orçamento permitindo, assim, a Pedro Nuno Santos chumbá-lo sem ter de pagar a fatura de um vota contra ou de uma abstenção. Correu mal a jogada, a ambos. O suposto pacóvio saltou repentinamente do meio do palco para a direita e PNS e LM tiveram de cair nos braços um do outro lá bem na ponta esquerda deixando AV confortavelmente sentado na oposição. Talvez agora PNS entenda que há mundo para lá de Oliveira de Azeméis e LM tenha aprendido, à própria custa, de que AV está muito longe do caloiro a quem ele passava impunemente rasteiras no pátio do recreio da S. Caetano à Lapa. É a vida.

Tentando destrunfar AV e recuperar algum terreno à direita, no seu discurso de encerramento do Congresso LM resolve roubar duas das bandeiras do Chega e agitá-las bem alto e é assim que, tonitruante, em pose de desafio, promete a mudança do programa de Cidadania. Entusiasmo da plateia, horror dos intelectuais orgânicos da esquerda príncipe-realista. Era não conhecer LM. Podem bem calar os aplausos, aqueles e dormir descansados, estes últimos. Menos de 24 horas depois, SEXA, o ministro da Educação de LM vem, apaziguador, dizer que não, não, a disciplina ia continuar e que a questão da alteração do programa não era prioritária. Mas LM prometeu mais e em outra área prioritária para a direita, a Segurança dizendo, ipsis verbis, que «vamos criar equipas multiforças para irem para o terreno combater, sem tréguas, a criminalidade violenta» . Pois. Poucas horas depois apenas um polícia defende-se de um homem empunhando uma arma branca. Dispara. O homem morre. Primeira decisão da MAI de LM: instaurar um inquérito ao polícia, que se viu constituído arguido e foi desarmado. Sim, essa mesma, a tal senhora ministra cuja primeira preocupação disse ser a de «separar, na polícia, as maçãs podres das boas». E eis, pois, no chão, poucas horas após terem sido triunfalmente agitadas, as bandeiras do combate à ideologia de género e à insegurança. É sempre assim com as bandeiras roubadas: não resistem à chuva nem à prova dos factos. LM é, no seu centrismo radical, uma má fotocópia da Senhora von der Leyen e na sua práxis política, o imitador possível do Senhor Macron e do seu famoso ‘au même temps’ que se pode resumir em falar à Direita e governar à Esquerda. Com este método o aprendiz de feiticeiro arruinou França e a paciência dos franceses, acabando, sem poder e sem glória, isolado e perdido no seu labirinto do palácio do Eliseu, restando-lhe o único poder real de se demitir a si próprio quando, em breve, lhe não restar outra hipótese para sair da armadilha que a si próprio montou. Salvaguardadas as devidas distâncias, Montenegro prepara para si e para todos nós, o mesmo destino: para nós a ruína, para si a mesma saída, sem honra e sem glória, pela porta traseira da, aqui, modesta casinha de S. Bento.

Vice-presidente da Assembleia da República