EUA. A reta final

A cinco dias de todas as decisões, o resultado das eleições americanas continua a ser marcado pela incerteza. Trump tem vantagem e Biden pode ter minado a campanha de Harris com uma declaração infeliz.

Os Estados Unidos terão um novo Presidente eleito dentro de 5 dias. As campanhas de Donald Trump e de Kamala Harris dão o tudo por tudo numa reta final frenética, com as sondagens a demonstrarem um equilíbrio assinalável que, ao que tudo indica, não deverá ser quebrado até ao dia das eleições.


Tanto Harris quanto Trump já realizaram as suas alegações finais e, ainda que o empate se deva manter até ao fim, há temas que têm feito correr tinta, com o atual Presidente, Joe Biden, a dar declarações que podem minar a campanha da vice-presidente.


As últimas sondagens dão uma ligeira vantagem ao candidato republicano, ainda que a democrata esteja 0,9% à frente nas sondagens realizadas a nível nacional, de acordo com o modelo da Euronews, que utiliza dados dos dois agregadores de sondagens mais importantes dos Estados Unidos, o FiveThirtyEight e o RealClearPolitics.

O Sistema Eleitoral


O sistema de eleição presidencial americano assenta no mecanismo do Colégio Eleitoral, isto é, cada Estado, consoante o tamanho da sua população, representa um número específico de votos. Por exemplo, a Califórnia, que tem cerca de 39 milhões de habitantes, tem 55 votos, enquanto que Estados com menos população, como o Alaska (cerca de 734 mil habitantes), têm apenas 3. A totalidade dos votos do Colégio Eleitoral será atribuída ao candidato vencedor, mesmo que ganhe por apenas 1 voto. Isto explica o que aconteceu em 2016, quando Hillary Clinton obteve mais votos a nível nacional, mas acabou por perder a eleição para Trump. Existem 538 votos eleitorais, saindo vencedor quem obtiver 270.
É importante também salientar que estes votos eleitorais não são abstratos, são pessoas que reunirão em dezembro para votar nos candidatos que se tornarão Presidente e vice-presidente. Salvo raras exceções, os membros do Colégio Eleitoral votam no candidato que ganhou no Estado que representam.


Em janeiro, precisamente no dia 6, o Congresso realiza a contagem dos votos eleitorais. Em caso de empate, algo improvável, mas possível – Kamala teria de vencer no Arizona, no Michigan, no Nevada, no Wisconsin e no Nebraska e Trump na Pensilvânia e na Geórgia -, a Câmara dos Representantes elegerá o Presidente, com a eleição do vice-presidente a recair sobre o Senado. A tomada de posse é realizada no dia 20 de janeiro.

A importância dos ‘swing-states’


As eleições americanas decidem-se, habitualmente, num leque reduzido de Estados que não têm uma tendência histórica em direção a qualquer um dos partidos dominantes. Os mais críticos, este ano, segundo as sondagens, são os que compõem o quarteto do Sun Belt (cinturão do Sol) – Arizona, Geórgia, Nevada e Carolina do Norte – e o trio do Rust Belt (cinturão da Ferrugem), composto pela Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.
Donald Trump está em vantagem, segundo o modelo da empresa de sondagens americana FiveThirtyEight, no Wisconsin (+1), na Pensilvânia (+3), no Nevada (+1), no Michigan (+1), na Geórgia (+3) e no Arizona (+4). No Estado da Carolina do Norte, o cenário é de empate.

Possíveis cenários


Como foi escrito na última edição do Nascer do SOL, as sondagens não permitem realizar uma previsão segura de quem sairá vencedor das eleições. O empate quase total a nível nacional e o equilíbrio nos swing-states – apesar de Trump não estar em desvantagem em nenhum -, seguindo a margem de erro das duas últimas eleições, parece favorecer Trump.
No Arizona, um Estado que foi fundamental para a vitória democrata em 2020, a situação está pouco favorável para Harris. Uma sondagem do New York Times em conjunto com o Siena College mostra a inclinação para Trump, chegando aos 5% de vantagem, bafejado pelo apoio de eleitorado que pertence, tradicionalmente, ao Partido Democrata. É o caso dos jovens e de eleitores pertencentes a minorias.


É de relembrar que em 2016, Hillary Clinton aparecia, a esta altura, com uma vantagem de 4,5%. A liderança de Biden nas sondagens em 2020 era ainda mais evidente, com uns notáveis 7,5%. Assim, é presumível que a campanha de Harris esteja a torcer para uma maior precisão nas sondagens este ano.


«Caso as sondagens atuais se confirmem», concluem Boyd Wagner e Aleksandar Brezar, especialistas da Euronews, «Trump ganhará 312 votos no Colégio Eleitoral e será o melhor resultado de um vencedor desde que o então Presidente Barack Obama derrotou Mitt Romney».

A reta final


Com o aproximar do ato eleitoral, os candidatos e trabalham para angariar os últimos votos, o que faz com que a retórica das campanhas se intensifique, abrindo caminho para a controvérsia.


No seu argumento final, Kamala Harris voltou a comparar o adversário a Adolf Hitler, utilizando o desembarque das tropas aliadas na Normandia, com vista a derrubar um regime tirânico, como argumento para os americanos não votarem em Trump.


Porém, no mesmo discurso, Kamala diz que «Donald Trump passou uma década a tentar manter as pessoas divididas e com medo umas das outras. É isso que ele é. (…) Não é isso que nós somos», jurando que será «uma Presidente para todos os americanos, colocando o país à frente do partido». Mas, as declarações de Joe Biden na mesma noite, seria algo que a campanha democrata, certamente, não esperava. O ainda Presidente – em resposta a uma intervenção de um convidado no comício de Trump, que disse que Porto Rico é uma «ilha de lixo» – afirmou que «O único lixo que vejo a flutuar por aí são os seus apoiantes [de Donald Trump]».


O candidato republicano foi informado em plano palco e a campanha lançou, pela mão da Secretária de Imprensa, um comunicado oficial onde poder ler-se o seguinte: «O Presidente Trump é apoiado por Latinos, votantes negros, trabalhadores sindicalizados, mães de família, agentes policiais, agentes de patrulha fronteiriça e americanos de todas as religiões – e Harris, Walz e Biden rotularam estes grandes americanos de fascistas, nazis e, agora, lixo. (…) Joe Biden e Kamala Harris […] desprezam as dezenas de milhões de americanos que o apoiam. (…) O Presidente Trump será um Presidente para TODOS os americanos». Biden retratou-se e garante que se referia apenas à retórica do autor da afirmação no comício de Trump, mas Kamala Harris ainda não se pronunciou. Quem já se distanciou de Biden foi Josh Shapiro: «Nunca insultaria as boas pessoas da Pensilvânia nem qualquer americano, mesmo que escolham apoiar um candidato que eu não apoio».


Houve também polémica no mais conceituado jornal da capital americana, o Washington Post, após uma decisão do dono, Jeff Bezos, que decidiu não autorizar o apoio editorial a um dos candidatos, já que isso «cria uma perceção de parcialidade». Como resultado, o jornal já viu anuladas mais de 200 mil assinaturas.


Posto isto, resta aguardar pelos resultados do próximo dia 5, que se mantêm em aberto e que decidirão o rumo dos EUA e do mundo livre.