Uma das minhas preocupações passa por fugir à minha bolha familiar e profissional, pois gosto de ver o mundo fora das minhas ‘quatro paredes’. Por isso, não prescindo de ir à Feira do Relógio, aos domingos, sempre que posso, comprar os melhores legumes na banca da Cristina, a beterraba e alfaces do meu ‘amigo’ de Lousa, ou as melhores maçãs da zona Oeste. Sempre que não vou, a Cristina, uma guerreira de metro e meio, dá-me um raspanete. Também não prescindo do mercado de Benfica, onde a Paula, da banca do Jardel, tem sempre uma resposta rápida na língua… Os tremoços, azeitonas e os frutos secos compro-os também numa banca familiar da praça.
Da mesma forma que adoro os mercados, também gosto muito de frequentar restaurantes ou bares, dos mais caros, excluindo a nouvelle cuisine, aos mais baratos. Gosto de ver o mundo tal como ele é. Vem esta conversa a propósito do que vejo ‘passar’ na comunicação social, seja pela boca de políticos, seja pela de comentadores e jornalistas supostamente isentos. A narrativa, uma palavra que detesto, mas dá jeito nestes momentos, parece saída de alguma república soviética ou de algum discípulo de Enver Hoxha. Vamos a dois casos concretos. Os jornalistas e comentadores, e não são todos, como é óbvio, adoram questionar o primeiro-ministro sobre a razão de ainda não ter ido à Cova da Moura visitar a família de Odair Moniz. Ontem, o forrobodó ainda foi maior, pois o Presidente – após ter ‘perdido’ o funeral do homem que enfrentou a Polícia e que acabou por morrer depois de um agente ter disparado dois tiros fatais – foi, finalmente, visitar o bairro e a família da vítima.
Por coincidência, alguns meios de comunicação social começaram a entrevistar o motorista, que só não morreu por acaso, depois de ter sido atacado por jovens ‘revoltados’ com a morte de Odair Moniz. Não sei se foi à TVI ou à TSF ou a outro meio, mas o motorista disse com todas as letras que o quiseram matar por ser branco. «Aos outros motoristas, que são negros, ninguém atacou». O homem, que ficou com queimaduras graves para sempre, confessou ainda que teve uma arma apontada à cabeça e que os selvagens não o queria deixar sair, pois desejavam que morresse queimado. Seria de esperar que o SOS Racismo fizesse logo um comunicado, que os coletivos realizassem manifestações contra o racismo, que o Presidente, e todos os partidos, e não estamos a falar do Chega, fizessem declarações emotivas, de apoio ao profissional de transportes públicos.
Não vi se o Chega já disse alguma coisa, mas calculo que sim, pois todos os outros lhe estendem uma passadeira para poder aparecer a exigir justiça para o motorista.
E aqui vai a segunda pergunta: alguém perguntou ao Presidente da República – que já falou com a mãe do profissional da Carris – ao primeiro-ministro e aos líderes parlamentares se já foram visitar o motorista e a sua família? Não me parece. Alguém falou de racismo? Também não me parece. Mas voltemos à morte de Odair Moniz. Os protestos selvagens que se seguiram e que não mereceram a reprovação dos partidos e coletivos de extrema-esquerda, ficaram a dever-se à luta contra o ato racista do agente da PSP. Todos sabemos que a vida tem muitas ironias, mas o que dizer da ‘coincidência’ de o advogado do polícia que matou Odair ser o mesmo da família do agente que morreu à porta de uma discoteca na 24 de Julho, assassinado por três homens: um negro, um cigano e um estrangeiro? Alguém na altura disse que o agente foi morto por questões racistas? Alguém foi visitar a família do agente morto? Não seria de os políticos ganharem juízo e de deixarem-se de populismos? Eu acho que era uma boa ideia…
Telegramas
Boaventura e a lei da rolha
O sociólogo, que outrora era um guru da esquerda caviar, quis calar as mulheres que o denunciaram e acusaram de assédio sexual. Então as denúncias só são admissíveis quando são contra os outros?
Teve azar e espera-se pelo julgamento para saber de que
lado está a razão.
Rezas por Ruben Amorim
O futebol tem coisas que a razão desconhece. Então não é que
um grupo de fãs do Manchester United, do Uganda, promoveu uma missa para ‘defender’ Ruben Amorim de más energias? Insólito
e curioso.
A justiça dos objetos
Os casos insólitos não acontecem só no Uganda, pois em Faro uma juíza fez birrinha e recusou-se a trabalhar num gabinete que tinha objetos pessoais de um colega. Resultado: foi trabalhar para os corredores e, dessas forma, adiou julgamentos. Quem não esteve com meias mediadas foi o Conselho Superior da Magistratura (CSM) que a suspendeu preventivamente. E assim vai a justiça portuguesa.