Uma investigação da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa revelou que os estudantes do ensino superior em Portugal enfrentam elevados níveis de desconforto térmico tanto no inverno quanto no verão, com maior incidência no Alentejo. O estudo identificou os alunos deslocados como os mais afetados, devido às precárias condições habitacionais e à exposição à pobreza energética.
A pesquisa, que envolveu 848 estudantes de universidades e politécnicos das regiões Norte, Centro, Alentejo e da Área Metropolitana de Lisboa, destaca a gravidade da pobreza energética no país. João Pedro Gouveia, responsável pela investigação publicada na revista Energy Research & Social Science, aponta à agência Lusa que a situação é agravada pelas condições de alojamento: “muitos [estudantes] vivem em arrendamentos precários, em edifícios antigos, com fraco desempenho térmico, sem equipamentos de aquecimento e refrigeração ou dinheiro disponível para despesas com energia”.
Os estudantes deslocados, que dependem maioritariamente do setor de arrendamento privado, relataram maior desconforto térmico em comparação com os estudantes locais. As condições habitacionais mais degradadas, muitas vezes em edifícios antigos e com problemas estruturais, contribuem para a vulnerabilidade deste grupo.
A situação é particularmente crítica no Alentejo, onde os deslocados enfrentam maiores desafios devido à combinação de alojamentos mais envelhecidos e as condições climáticas da região. Estes estudantes foram identificados como “a população potencialmente mais vulnerável à pobreza energética dentro da amostra de respostas”.
Embora o desconforto térmico seja generalizado, o estudo observou que os estudantes relataram impactos limitados na sua saúde e desempenho académico. Muitos também indicaram dificuldades no pagamento de contas de energia, mas sem significativa interferência na aquisição de bens e serviços essenciais.
Segundo o investigador, esta perceção pode estar associada à falta de conhecimento sobre a pobreza energética e os seus efeitos. “O baixo impacto pode ser atribuído à falta de consciência das consequências de tal desconforto ou à sua normalização, uma vez que muitos alunos poderão desconhecer o conceito de pobreza energética e respetivas consequências na saúde e no desempenho académico”, explicou João Pedro Gouveia.
O estudo sublinha a urgência de melhorar as condições habitacionais dos estudantes deslocados. Para o investigador, é essencial “um olhar ‘a sério’ para o alojamento dos estudantes e uma ligação às universidades e politécnicos que faculte mais diagnósticos sobre a qualidade da habitação e da forma como vivem, procurando soluções que deem condições dignas aos estudantes”.
Com o aumento das pressões no mercado imobiliário e a crescente precariedade enfrentada por estudantes com recursos limitados, a investigação reforça a necessidade de políticas públicas direcionadas para garantir alojamentos adequados e energeticamente eficientes, assegurando condições de vida dignas para este grupo vulnerável.
Este cenário vai ao encontro da tendência geral em território nacional. A combinação de baixos rendimentos, habitações mal isoladas e o elevado custo da energia cria um cenário que deixa muitos portugueses a passar frio nas suas casas. Em 2023, mais de 20% da população vivia em lares sem meios para manter uma temperatura confortável, um aumento de 3,3 pontos percentuais face ao ano anterior, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE).
O impacto é mais grave entre as pessoas em risco de pobreza, onde 37,3% relatam dificuldades em aquecer os seus lares, mais do dobro dos 17,4% da população restante. Este problema é especialmente crítico entre os idosos, com 28,5% dos maiores de 65 anos a viverem em condições que comprometem a sua saúde e qualidade de vida.