Há muitos anos, escrevi um artigo que se chamava The right man in the wrong place. A quem se referia? A Joaquim Ferreira do Amaral, que Durão Barroso escolhera como candidato do PSD à Presidência da República.
Ferreira do Amaral fora um brilhante ministro das Obras Públicas, quase um Duarte Pacheco dos tempos modernos, com muita obra feita, mas não tinha obviamente perfil para Presidente da República. Era um típico erro de casting.
Com Gouveia e Melo passa-se de certo modo o oposto.
Os meus leitores sabem que, há muitos meses, quando o almirante surgia ainda muito mal posicionado nas sondagens, atrás de Mariana Mortágua, afirmei que ele seria um candidato imbatível a Belém.
Dizem hoje alguns comentadores que não se sabe o que ele pensa da saúde, da educação, da economia, etc.
Mas porventura ele irá governar?
Precisará de ter programas para as várias áreas?
Num candidato presidencial, interessam sobretudo as qualidades pessoais, demonstradas em funções públicas.
E nesse sentido ficou claro que Gouveia e Melo é um patriota, tem espírito de missão, tem autoridade, tem capacidade de liderança, é um disciplinador.
Ora, estas qualidades são importantes num país que vive alguma instabilidade e tem problemas de indisciplina, sobretudo no ensino e em zonas suburbanas.
O Presidente da República é uma referência, um exemplo, e as características de Gouveia e Melo ajustam-se a esse papel.
Quem serão os seus possíveis adversários? No centro-direita, Marques Mendes, Aguiar-Branco, Santana Lopes e muito remotamente Passos Coelho; na esquerda, Mário Centeno, Augusto Santos Silva, António Vitorino, Ana Gomes, António José Seguro, algum candidato do PCP, outro do BE….
Estes últimos, serão só para aproveitar a campanha e marcar território.
Quanto aos da área socialista, não podem concorrer todos: se o fizerem, dividirão os votos e nenhum terá hipóteses.
E aí estará a primeira dificuldade: terão de fazer uma espécie de Pacto de Cacilhas, em que todos abdiquem a favor de um.
E qual será?
Ana Gomes tem uma imagem muito colada à esquerda, que lhe retira hipóteses. Já foi candidata, teve 13%, e não terá agora muito mais.
António Vitorino é uma pessoa muito valorizada na ‘bolha mediática’ mas pouco popular. Pode ser competente, culto, ter muito sentido de humor, mas estamos a vê-lo fazer uma campanha eleitoral vencedora? A arrastar multidões atrás de si?
Augusto Santos Silva é talvez o mais óbvio candidato do PS, mas é pouco empático. Enquanto presidente da AR mostrou-se bastante quezilento e algo sectário, o que não o favorece.
Mário Centeno é discreto e contido, o que constitui uma vantagem, mas tem um perfil demasiado técnico. Vemo-lo como um homem de gabinete, bom a mexer nos números, mas sem características para despertar entusiasmos.
António José Seguro é uma surpresa. Esteve afastado da política durante anos, escondido na academia, e agora regressa com uma ambição ao mais alto nível. Ninguém duvida da sua seriedade e das suas boas intenções, mas não chega. Falta-lhe capacidade de afirmação, receio de exprimir opiniões menos consensuais – como aliás se vê na forma evasiva como responde a perguntas diretas.
Quanto à área do centro-direita, tem um problema: é aquela onde Gouveio e Melo se situa. O que vai mais avançado é Marques Mendes, que tem bom senso, conhece muito bem os meandros do poder, mas isso pode não ser nestas eleições o mais importante. O facto de ser muito conotado com a classe política vigente, numa época em que as pessoas estão fartas de partidos, de politiquices, não o torna muito aliciante.
Neste aspeto, Aguiar-Branco tem uma imagem mais ‘limpa’, menos colada aos jogos políticos, até porque só se tornou verdadeiramente conhecido há pouco tempo. Mas falta-lhe algum carisma. É um homem simpático, ponderado, mas que verdadeiramente não se destaca.
Santana Lopes só se meteu na corrida para o seu nome não ser esquecido, e Passos Coelho nem isso: fala-se dele, mas ele nunca deu um único sinal de interesse pelo cargo.
Tudo somado, penso que Gouveia e Melo baterá com alguma facilidade qualquer destes candidatos. Enquanto neles só votarão os eleitores ligados aos respetivos partidos, Gouveia e Melo pode recolher votos em todos os quadrantes e na imensa massa de portugueses sem partido e que está fora da dita ‘bolha mediática’.
Mais: que tem em relação a esta não só distanciamento mas alguma aversão. Neste aspeto, o facto de Gouveia e Melo ser militar não é um problema – é uma vantagem. É uma garantia de apartidarismo e independência.
Deixei para o fim um fator que pode ser decisivo.
A Europa e o mundo estão em guerra, e será mais confortável para os cidadãos terem à frente do Estado um homem que percebe de Defesa, que sabe de organização militar, que conhece bem as Forças Armadas.
Este é um poderoso trunfo de Gouveia e Melo.
Quem se sentirá tranquilo, neste tempo de corrida às armas, com um chefe supremo das forças armadas que não gosta de militares nem sequer fez tropa?
Por isso, digo que o almirante é o homem certo no tempo certo.
Nem por encomenda se teriam reunido melhores condições para ele ser Presidente da República.