O preço da Presidência: quanto custam as campanhas?

Das campanhas mais caras às origens nem sempre transparentes do financiamento. Afinal, quanto custa montar uma campanha presidencial?

Entre comícios, brindes e cartazes, as campanhas para as eleições presidenciais podem chegar a custar cerca de 4.08 milhões de euros. É este o teto máximo das despesas permitidas por lei, sendo que, no caso de o candidato concorrer a segunda volta, acresce mais 1.02 milhões de euros.
Um valor que, para alguns, deveria ser revisto. «O teto máximo de despesas devia ser mais reduzido. A pressão para os ‘campanhistas’ é muito grande. É sempre mais, mais e mais, e é dinheiro deitado à rua», critica José Ribeiro e Castro, ex-líder do CDS-PP e diretor da campanha de Diogo Freitas do Amaral nas eleições presidenciais de 1986.


Nas últimas presidenciais, em 2021, a campanha da bloquista Marisa Matias bateu o recorde de gastos entre os candidatos. No total, apresentou despesas de 372.872 euros, sendo que a maior fatia foi destinada a “comícios, espetáculos e caravanas” (120 mil euros); em segundo lugar, a propaganda (92 mil euros) e em terceiro, os custos administrativos (91 mil euros).
O financiamento da campanha foi praticamente assegurado pelo Bloco de Esquerda (355.334 euros), por angariação de fundos (2258 euros) e donativos (270 euros). Mas o elevado investimento não compensou nas urnas. Marisa Matias acabaria por ficar em quinto lugar com 3,95% dos votos e sem direito a subvenção estatal (dinheiro do Estado para a campanha), apenas destinada a quem obtenha pelo menos 5% dos votos.

Ventura recebeu 146 mil euros do Estado


Em 2021, apenas André Ventura, Ana Gomes e Marcelo Rebelo de Sousa receberam subvenções públicas. O líder do Chega ficou em terceiro lugar e foi quem custou mais aos cofres do Estado (146 mil euros) seguido de Ana Gomes, que ocupou a segunda posição na votação presidencial (132.000 euros). Já Marcelo Rebelo de Sousa, apesar de ter ganhado as eleições por larga margem, recebeu apenas 23.826 euros, por ter apresentado menos despesas. Isto porque, segundo a lei, «a subvenção não pode, em qualquer caso, ultrapassar o valor das despesas realizadas».


No total, as subvenções pagas pela Assembleia da República em 2021 contabilizaram um total de 302.333 mil euros, muito abaixo do teto de 3,5 milhões disponível.


Para o antigo primeiro-ministro Pedro Santana Lopes, limitar a subvenção do Estado a quem tem 5% dos votos «não é justo do ponto de vista democrático».


«Mesmo que a pessoa não chegue aos 5% teve despesas na mesma. O mais certo, para quem seja candidato regularmente constituído, era haver uma garantia mínima de despesas ou de isenções de despesas», defende o antigo primeiro-ministro. «Para quem não tem meios e notoriedade é sempre mais difícil concorrer. Tem de haver o mínimo de condições de igualdade».


Ribeiro e Castro desvaloriza e sublinha que essa desigualdade «acontece em todo o mundo e que aqui nem chegamos aos números das eleições nos EUA».
«Se Donald Trump fosse candidato em Portugal violaria o teto máximo de despesas. Isso para ele era peanuts», ironiza.

Irregularidades nas contas. Quid iuris?


Além da subvenção estatal, as campanhas podem ser financiadas através da contribuição de partidos políticos que apoiem candidaturas e angariação de fundos e donativos de pessoas singulares, cujo limite é de 30.555 euros por pessoa. Já as empresas, associações ou outras pessoas coletivas não podem, por lei, financiar campanhas eleitorais.


«Uma das razões do financiamento do Governo é proibir donativos privados acima de determinados níveis para que não haja corrupção por via do financiamento. Por mais interessados que os donativos sejam, obviamente que esse apoio económico tem sempre um preço político para o candidato», afirma Ribeiro e Castro.


Para que não haja suspeitas sobre o financiamento, todos os candidatos devem comunicar as contas da campanha à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), responsável pela sua fiscalização. Certo é que, em 2021, esta Entidade apontou várias irregularidades na prestação de contas à maioria dos candidatos, incluindo a ausência de suporte documental de donativos e despesas não refletidas nas contas de campanha. Só Marcelo Rebelo de Sousa e Marisa Matias terão cumprido na totalidade a prestação de contas respetivas à campanha.


Questionada pelo Nascer do SOL, a ECFP garante que «os candidatos, onde se verificaram irregularidades apresentaram contraditório». Facto é que, passados três anos, ainda não há decisões publicadas sobre estas irregularidades, apesar de a lei dar um prazo máximo de um ano a partir do fim do prazo de apresentação das contas da campanha eleitoral para esta Entidade se pronunciar. Em resposta ao Nascer do SOL, a ECFP justifica que «os prazos previstos na lei são indicativos, sendo que a ECFP possui centenas de processos nos quais tem que proferir decisão».

O pesadelo das dívidas da campanha


Se para alguns abrir os cordões à bolsa pode resultar numa vitória nas urnas, para outros o resultado é uma mão cheia de dívidas e noites sem dormir.
Foi o caso de Diogo Freitas do Amaral, que só se apercebeu da gravidade da quantia das dívidas um mês e meio após a derrota na segunda volta das presidenciais de 1986 contra Mário Soares. No total, o fundador do CDS viu-se com uma dívida de 460 mil contos, o equivalente hoje a cerca de 2,3 milhões de euros, “sem contar com a inflação”.


«A campanha de Freitas do Amaral, no geral, correu bem. Trazia a possibilidade de ganhar e não se ganhou por um triz», começa por contar Ribeiro e Castro, diretor de campanha de Freitas do Amaral. «O desequilíbrio das contas decorreu da realização de uma segunda volta, que era um fator imprevisto»


Apesar da sua candidatura ter sido apoiada pelo PSD e pelo CDS, no final, Freitas do Amaral teve de recorrer a pessoas amigas, conhecidas e parentes a pedir um contributo para saldar a dívida.


«A posição que o PSD tomou na altura foi profundamente imoral e inaceitável, até pelas garantias que tinham sido dadas. Grande parte desse gasto a mais foi determinado pela pressão objetiva que apresentava para a campanha», critica Ribeiro e Castro, que garante que «não houve apoio partidário para saldar as dívidas».


«O compromisso que existia na altura era que o PSD assumiria essa parte e não aconteceu».