O Matuto gosta de São Tomás de Aquino. Talvez porque Tomás de Aquino também fosse de volumetria ambiciosa – por isso tinha a alcunha de “touro”. https://sol.sapo.pt/2024/11/26/o-matuto-e-os-gordos/ Ou talvez seja pela sua mente brilhante aliada a um coração humilde. No mosteiro de Monte Cassino e depois na Universidade de Paris, Tomás era conhecido por sua humildade e silêncio. Seus colegas de classe, muitas vezes impressionados pelo seu porte robusto e seu comportamento calmo, começaram a chamá-lo de “touro mudo”. Eles acreditavam que o seu silêncio era sinal de falta de inteligência. Porém, Alberto Magno, seu professor e um grande filósofo, percebeu o génio escondido em Tomás, e terá dito: “chamam-no de touro mudo, mas este touro vai fazer a seu mugido ser ouvido em todo o mundo”. E o resto – como dizem os Ingleses – é história!
O Matuto gosta muito do episódio dos porcos voadores. Ainda durante os seus tempos de estudante, certa tarde Tomás entra na sala de aula, quando o professor não tinha ainda chegado. Os seus colegas estão todos junto à janela esticando os pescoços para o pátio interior da escola. Tomás pergunta pela razão de tão intensa curiosidade. Respondem os colegas: “Vem depressa Tomás. Há porcos no pátio, A VOAR”! Tomás de Aquino corre para a janela onde é confrontado com o riso histérico e zombador dos colegas. Enquanto as gargalhadas esmorecem, Tomás de forma séria, mas firme expõe as más intenções dos colegas: “prefiro acreditar em porcos voadores do que pensar que os meus amigos me iriam mentir”. O Matuto acha que nestes tempos de “coisas pequenas” a ingenuidade de São Tomás é muitas vezes desdenhada. Até seríamos capazes de colocar um rótulo Bíblico no nosso cinismo – matuta o Matuto: “Vá lá Tomás, não sabes que devemos ser mansos como as pombas, mas astutos como as serpentes!?” (Mat 10:16). Poderíamos mesmo desafiar: “porta-te como um touro, Tomás”!
Ora – constata o Matuto – esta falta de convívio que São Tomás revela com a mentira é estranhamente irónica. Corre por aí que Tomás de Aquino terá dito que “o homem é um anjo montado num porco”. O Matuto não encontra esta frase nas obras principais do grande Teólogo taurino. Na Summa Teológica, Tomás faz uma síntese do Teologia Cristã, abordando de forma apologética a existência de Deus. Obra prima – considera o Matuto. Na sua Suma contra os Gentios, Tomás faz uma defesa racional do Cristianismo. Não se fala de anjos e muito menos de porcos. Depois há os formidáveis comentários sobre Aristóteles, como a Metafísica e a Ética. O Matuto não descortinou uma referência à citação supra citada. É mentira! Será? Talvez. O Matuto não entra nessas guerras.
Mas, a verdade é que a mentira vai prevalecendo – remata o Matuto. O Matuto sabe de fonte segura que o Padre António Vieira contava, em 1965, que na Bahia o dia muitas vezes amanhecia soalheiro, bonito e muito claro. No entanto, ao fim de uma hora o horizonte toldava-se de nuvens e começava a chover. Pasmado com a inconstância do clima, António Vieira exclamava: “Que raios! No Brasil até os céus mentem”. Ora, ainda que apoiado em bons argumentos, o Matuto não tem a certeza de se mentir mais no Brasil do que noutras latitudes. O detector de mentiras falha muito nesta questão tão subjectiva. Já o serviço de meteorologia mente com os dentes todos e só faz revisão do tempo. Nunca previsão!
Assim, o Matuto verifica que no Brasil, nunca se falou tanto em transparência e em salvaguardar certos aspectos da democracia, como liberdade de expressão e eliminação de fake news. Na verdade, o que espanta por aqui é a “mentira habitual” que se instalou na política. A corrupção parece matizada de tal forma que justifica a mentira. Num maquiavelismo bacoco, o pior erro do mundo é a derrota. A vitória tudo justifica – pondera o Matuto. Bem, mudemos isso! Nesta época Natalícia vamos dar férias à mentira – desafia o Matuto. Vamos obliterar o cinismo – sugere o Matuto. Cristo, cuja vida celebramos, veio a este mundo “cheio de graça e verdade”. Acreditar que os porcos poderão voar – cogita o Matuto – será sempre uma alternativa mais atrevida. Uma atitude mais audaz. Uma postura de “touro”.