Ética, Lisboa e miopia

Assistimos a silêncios ensurdecedores em Portugal e no resto da lusofonia no momento em que a democracia mais precisa de intermediários.

Começo pelo aparentemente (apenas aparentemente) mais banal dos temas abordados neste artigo. A demissão do CEO da Galp por incumprimento do Código de Ética e Conduta, constitui um bom exemplo de rigor na aplicação dos princípios de mérito, transparência, justiça e independência que devem presidir sólida e coerentemente à gestão de qualquer instituição, publica e privada. Ao longo da vida tenho pontualmente assistido a situações desse foro. São tão evidentes ao senso comum que custa a aceitar a habitual justificação assente em desculpabilizações várias que passam essencialmente pelo argumento de que em nada afetou qualquer decisão. Nós, humanos, sabemos que one way or another afeta! Aos líderes pede-se, acima de tudo, um bom exemplo no cumprimento das regras base de ética, transparência e comportamento justo. A Galp deu um bom exemplo à sociedade portuguesa na forma como o rigor e a exigência constituem elementos dos quais não se prescinde.


O presidente da Câmara de Lisboa teima, em minha opinião, em não adquirir a maturidade necessária para tão importante cargo. Assisti uma vez mais, estupefacto, à infinita diversidade de desculpas, infantis, que apresenta para justificar a inabilidade para resolver os problemas da cidade. Com um orçamento de €1.400.000.000 por ano é preciso melhor justificação para a quantidade crescente de lixo e sujeira do que a última apresentada por Carlos Moedas: «As fotografias que me enviam de lixo na cidade são sempre do mesmo sítio e são fotografias à 2.ª feira; e como sabem ao domingo não há recolha de lixo». Carlos Moedas faz-me lembrar aqueles meninos (ou meninas) quando apanhados a fazer uma travessura, desculpam-se dizendo que a culpa é do colega (ou da colega, ou do irmão ou da irmã). Até teria piada se fosse assunto de comédia, mas como é assunto sério constitui para mim, que agora moro em Lisboa, um assunto de aborrecimento diário. A propósito deste tema, disse-me um destes dias um taxista de Lisboa: «Sai-nos cada duque…». Concordei com ele.


Os recentes acontecimentos em Moçambique constituíram um bom teste (quanto a mim absolutamente falhado) à capacidade que a CPLP tem de unir a lusofonia à volta de um conjunto de alicerces num espaço global diverso, de proximidade transcontinental, independente, mas rigoroso na aplicação dos princípios mais exigentes da democracia. O idioma mais falado no hemisfério sul e a longa história que une estes povos, justificaria uma maior integração e convergência no modelo de sociedade que estes países adotam. Assistimos a silêncios ensurdecedores em Portugal e no resto da lusofonia no momento em que a democracia mais precisa de intermediários. A processo de descolonização não deixa boas memórias na história. Num tempo diferente a falta de empenho nos valores da paz e da harmonia corre o risco de gerar uma tragédia naquele que já foi o mais pobre país do mundo. A CPLP está por miopia a tornar-se num Clube de Poetas Mortos. Tem condições e obrigação de ser uma organização altamente interveniente.

CEO do Taguspark, Professor universitário