Trump e a internacional conservadora

A vitória de Donald Trump em novembro galvanizou este novo movimento global.

Donald Trump voltou a assumir as rédeas da Casa Branca na segunda-feira. Num discurso inaugural que deambulou entre promessas de uma «Era Dourada», a chegada a Marte e o anúncio de decretos presidenciais que prontamente assinou, fica claro que o passado dia 20 de janeiro ficará marcado como um ponto de viragem a vários níveis.
Primeiro, a política externa. Num mundo em ebulição em várias geografias, muito devido à diplomacia da anterior administração democrata assente no “desescalar”, Trump faz regressar o realismo a Washington, substituindo o conceito anterior pela dissuasão. Uma abordagem que Churchill, que faleceu num dia como hoje há sessenta anos, entendia.
Segundo, a internacional conservadora. Utiliza-se o termo “conservador” no sentido que Russel Kirk, um dos grandes pensadores do conservadorismo do século passado, lhe atribuiu: «na política prática, o que chamamos de movimento conservador… é uma coligação de vários interesses e correntes de opinião. É apenas na sua oposição ao Leviatã que as várias fações unem forças». Por outras palavras, trata-se de uma vaga de políticos que se unem na resistência à ordem mundial globalista, independentemente das suas nítidas divergências, e que começa a chegar à liderança em várias latitudes.
Meloni e Órban consolidam-se em Itália e na Hungria, Milei brilha na Argentina, Bukele – o mais diferente deste leque – goza de popularidade em El Salvador, Le Pen está bem posicionada para chegar ao Eliseu nas próximas presidenciais, Trudeau caiu, abrindo o caminho a Poilievre, Kemi Badenoch veio reavivar o thatcherismo nos tories e a lista continua com outros nomes que ainda lutam por maior expressão, como Santiago Abascal ou Nigel Farage. Esta tendência já estava em curso, evidentemente, mas uma derrota de Donald Trump em novembro seria um duro golpe desmoralizador. Tendo ganho, continua a todo o gás.
«Poderá ser a imaginação conservadora», notava Kirk em 1982, «a guiar a Era Pós-Moderna, particularmente na América. O objetivo de Burke, diz Paul Elmer More, era “usar a imaginação como uma força de ordem, autocontrolo e saúde política”. É apenas concebível que essa imaginação conservadora possa atingir a sua plenitude no século XXI», concluía, quase que de forma profética. É certo que Trump e outros nomes do movimento conservador não personificam o sentido burkeano do termo, porém, encontram no conservadorismo cultural um motivo de agregação em torno de bandeiras como a luta contra a imigração ilegal, a preservação do legado nacional e o combate ao wokismo.
Mas porque está a população, um pouco por toda a parte, a aderir a este movimento? É a questão que agora se coloca e cuja resposta não é simples. Existem várias nuances específicas em cada caso, mas há um denominador comum: a oposição a uma ordem ou a um conjunto de políticas que tem falhado à grande maioria das pessoas. Pese embora a orientação de voto mais à esquerda ou mais à direita ao longo do tempo, este sentimento conservador, mais do que uma filosofia política, é inerente a muitos indivíduos que pretendem o progresso, sim, mas de forma prudente e sem vilificar tudo o que é antigo.
E se é seguro afirmar que ser conservador não se resume, de todo, a ser reacionário, também pode dizer-se que esta nova tendência, particularmente entre os mais jovens, é, em grande medida, uma reação às novas derivas do progressismo levado ao ridículo. Tal como Roger Scruton e vários dos seus contemporâneos se descobriram como conservadores por oposição à violência de maio e junho de 1968 em Paris, os jovens de hoje chegam à mesma conclusão ao observarem as consequências indesejadas do wokismo. O conservadorismo é difícil de articular, mas o sentimento de rejeição face aos fenómenos modernos já descritos, aliado à incapacidade do autoproclamado centro moderado em dar resposta aos problemas reais, é a principal causa deste ressurgimento em várias partes do globo. l