Não se pode falar de Trump sem ter em conta as tarifas. E já que estão sob os holofotes da política internacional, há que tentar perceber de forma rigorosa o que significam. Tratar-se-á de uma questão puramente económica, com a negação total da visão smithiana do comércio mundial, ou de uma questão de política do poder? Podemos argumentar que ambas as interpretações são válidas, mas escolher uma e descartar a outra é uma análise imprecisa ou uma simples negação da realidade.
Toda esta conversa sobre tarifas não é nova. Faz parte da história americana e não é exclusiva a Trump nem tampouco aos republicanos. Relembre-se a presidência de William McKinley ou da década de 1970, quando os democratas se revelaram vincadamente mais protecionistas por objetivos eleitorais. Sim, Trump adora tarifas. Sim, as tarifas são como um veneno para o crescimento económico e para a inovação. Sim, Trump não acredita no multilateralismo. Mas o que também é verdade é que Trump não utiliza as tarifas apenas por ser um protecionista convicto. O facto de liderar a maior economia do mundo garante-lhe margem de manobra para fazer o que faz de melhor: negociar através do raw power (poder cru, traduzindo à letra). Não reconhecer esta evidência parece-me um erro.
Veja-se o que aconteceu com a Colômbia, com o México e com o Canadá, por exemplo. Primeiro, Gustavo Petro tentou entrar num braço de ferro que sabia não poder ganhar. Recusou-se a aceitar o desembarque de colombianos deportados pelos EUA, talvez inspirado pelas suas fantasias ideológicas de combate ao imperialismo americano. Para seu desgosto, a fantasia durou apenas uma hora. Não só foi obrigado a aceitar os repatriados, como anunciou que iria disponibilizar o avião presidencial para fazer regressar os seus concidadãos. Depois foi a vez de Claudia Scheinbaum, a nova presidente do México. Após um período de resistência, acabou por fazer o que Trump pretendia desde o primeiro momento: o patrulhamento da fronteira pelo exército mexicano de modo a impedir a entrada de drogas em território estadounidense.
O caso do Canadá é mais complexo. A economia canadiana é mais robusta do que a colombiana ou a mexicana, claro, e isso significa que pode permanecer numa guerra comercial por mais tempo. Mas, e sendo fiel à máxima aceite de que as economias maiores conseguem viver melhor com as consequências negativas do protecionismo, era expectável que não demorasse muito até que Trump conseguisse fazer o acordo que pretendia com o enfraquecido Justin Trudeau. E assim foi. O presidente americano suspendeu as tarifas com base no compromisso do executivo canadiano em controlar de forma mais firme as fronteiras, num processo semelhante ao que ocorreu na fronteira a Sul.
Resultado: as tarifas são levantadas, os consumidores de ambos os países ficam aliviados e Trump conseguiu o que realmente queria.
Em suma, as tarifas e o protecionismo são ferramentas que prejudicam o crescimento e, consequentemente, a prosperidade, resultando no aumento dos preços finais para os consumidores. Mas não se pode negar a realidade: Trump utiliza o poderio económico americano através das tarifas para conseguir a influência necessária para forçar outros países a agir de acordo com a sua vontade. Quer se concorde ou não com o caminho que Trump escolheu seguir ou com a sua conduta, é preciso reconhecer que está a conseguir o que quer. Bem-vindos ao mundo da política do poder.