1. Diversos meios da comunicação social reportaram uma situação que preocupa – e prejudica, pelo menos temporariamente – milhares de inquilinos elegíveis para o apoio extraordinário à renda, que ficaram recentemente sem acesso a esse subsídio devido a falhas ou incongruências nas declarações fiscais. O problema, identificado originalmente pela DECO, afecta beneficários que, apesar de cumprirem os critérios necessários, viram o pagamento do apoio interrompido em Fevereiro (já não o receberam nesse mês).
Segundo informações oficiais, o apoio extraordinário à renda, criado em 2023, consiste num subsídio mensal de até € 200 para inquilinos com rendimentos anuais até € 41.629 e uma taxa de esforço igual ou superior a 35%; sendo o processo de atribuição automático, com base na informação cruzada entre a Autoridade Tributária e a Segurança Social (que é quem paga o dito subsídio).
Ora, o que se passou foi que várias famílias foram excluídas do programa devido a erros ou discrepâncias nos dados fiscais. Entre os principais problemas detectados encontram-se falhas nas declarações de rendimentos prediais por parte dos senhorios, inconsistências nas declarações fiscais relativas ao pagamento de rendas, problemas na comunicação dos contratos de arrendamento e/ou declaração de valores de renda superiores aos rendimentos do inquilino (o que, imagino, seja o caso da maioria, uma vez que, com os valores absurdos de arrendamento que se praticam em Portugal, não é difícil que estes representem no mínimo 35% do rendimento do beneficiário). Basta fazer as contas: € 41629 /14 = € 2974 X 35% = € 1041arredondados. Quem consegue hoje arrendar uma casa (nem mesmo um T1, pelo menos em Lisboa) por aproximadamente € 1000?
2. Para colmatar estas falhas, o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) lançou, no tal mês de Fevereiro, o “Portal Consulta Cidadão”, que permite a validação e correcção de dados para desbloquear o apoio. Em conformidade, os inquilinos afectados devem: i) aceder ao “Portal Consulta Cidadão” do IHRU; ii) autenticar-se com Cartão de Cidadão, Chave Móvel Digital ou NIF; iii) verificar os dados registados e, se encontrarem erros, apresentar uma reclamação ou pedido de esclarecimento directamente na plataforma.
Foi exactamente essa situação com que se deparou um meu familiar próximo – depois de dar os dois primeiros passos, encontrou um écran em que a primeira coisa que se visualiza é “2025 – Não elegível”, o que obviamente o preocupou. “Por que raio, mantendo-se a minha taxa de esforço anterior, sou agora não elegível?” Isto levou-o, aliás como era pedido pela aplicação, a validar os dados e apresentar uma reclamação, julgando com isso solucionar o problema. Decorrido mês e meio, não tendo havido qualquer resposta, tentou várias coisas, a saber: contactou a Segurança Social, que o informou de que nada sabia a esse respeito, que a instituição se limitava a pagar o que lhe era indicado pelo IHRU; tentou ligar para o IHRU, sem que nunca tivesse sido atendido – a não ser por uma resposta automática que refere que os agentes estão todos ocupados, para tentar mais tarde (a mensagem pode não ser exactamente esta, mas o resultado final é o mesmo) – ou então enviar e-mail para ihru@ihru.pt Tudo isto tentou, tudo isto não teve qualquer resultado prático.
Pôs-se então a caminho do IHRU, onde, depois de uma manhã à espera de ser atendido – chegou pelas 10h, encontrava-se dúzia e meia de pessoas à frente dele mas não o conseguiu ser até às 12.30, hora de encerramento dos serviços para almoço, e ocasião em que o sistema informático parou para operações de manutenção programada – acabou por regressar na reabertura, às 14h.
Finalmente, atendido por uma diligente, simpática e bem disposta funcionária (valha-nos isso!), o que é que percebeu?
- Que não valia a pena ter reclamado, bastava ter validado a dita incongruência da taxa de esforço (que não o era na realidade) e tudo o resto seria automático;
- Que essa reclamação iria atrasar o processo (para vossa informação, depois de submetida a reclamação, os passos seguintes são “em revisão/em validação/em tratamento/em processamento/concluído), sendo de esperar que, após submissão, sejam necessários 3 meses para o tema ficar solucionado;
- Que, apesar desses diversos estados, a passagem de um para o outro, até ao final, pudesse ocorrer duma vez só…
- Que, admiremo-nos, tivessem sido pagos em anos anteriores valores acima dos € 200, porque as contas não terão sido feitas (será talvez a primeira situação em que o Estado paga e depois logo se vê…), o que significa que alguns dos beneficiários a quem já está a ser de novo pago o apoio estejam agora a receber menos do que até Janeiro de 2025!
- Que, atendendo (imagino eu) à enorme quantidade de e-mails recebidos no IHRU, a probabilidade de obtenção de resposta em tempo útil era muito baixa. Preferível seria mandar uns bolinhos para o pessoal do IHRU, que seriam naturalmente muito bem vindos!
- Finalmente, que, melhor do que aceder ao PAER, deve o beneficiário aceder à Segurança Social Direta, para perceber se o subsídio voltou entretanto a ser pago, “porque eles são mais rápidos”…