2027 pode ser o ano decisivo para o futuro de Taiwan. Os especialistas americanos alertam para uma invasão chinesa nessa data, e os chineses preparam-se para aquele que pode ser o ponto de inflexão da ordem internacional. «Enquanto nos temos concentrado na Ucrânia», disse o historiador Niall Ferguson numa entrevista a Peter Robinson para o Hoover Institute, «a verdadeira ação está no estreito de Taiwan» e «no Indo-Pacífico».
As ambições chinesas em relação ao território são conhecidas, mas estarão os Estados Unidos preparados para conter o avanço de Pequim?
«O princípio de uma só China tem um significado claro e inequívoco, ou seja, só existe uma China no mundo, Taiwan é uma parte inalienável da China e o Governo da República Popular da China é o único governo legal que representa toda a China» é a definição mais clara da política chinesa em relação a Taiwan. Este excerto, por exemplo, é de uma declaração oficial da Missão da República Popular da China junto da União Europeia em 2022.
A delegação da China na Europa continua, dizendo que «Taiwan pertence à China desde tempos remotos. As referências mais antigas a este facto remontam ao ano 230. A partir do século XII, todos os governos centrais imperiais da China criaram organismos administrativos para exercerem jurisdição sobre Penghu e Taiwan». Assim, fica claro que as aspirações da China para dominar Taiwan são uma reivindicação histórica, um sinal de que os chineses querem manter o seu território imperial, reforçando a ideia de alguns analistas geopolíticos de que a era dos impérios nunca terminou, foi simplesmente reinventada.
Isto está em sintonia com a afirmação de Putin sobre a Ucrânia, que declarou, menos de um ano antes da invasão em grande escala, que «russos e ucranianos eram um só povo» e que ambos partilhavam «essencialmente o mesmo espaço histórico e espiritual».
Ainda assim, a diplomacia russa e a chinesa comportam-se de formas distintas. Como disse Fareed Zakaria em 2021, «a China não é a Rússia» porque «a Rússia tem atuado como um Estado destruidor», «tudo o que faz é desestabilizar» e «beneficia da instabilidade», enquanto «a China é muito mais uma grande potência clássica que está simplesmente a tentar tornar-se cada vez mais e mais e mais importante, e que sempre valorizou a estabilidade».
Partindo do princípio de Zakaria, como pode a China anexar totalmente Taiwan sem entrar numa guerra aberta, como fez Putin na Ucrânia? Niall Ferguson, na mesma entrevista, fez a sua previsão: «Não é que ele [Xi Jinping] vá invadir, nem sequer acho que faça um bloqueio, há coisas muito mais inteligentes que ele pode fazer e que serão muito mais difíceis de responder. Suponhamos que ele diz “a partir de agora, todos os navios que entram e saem de Taipei têm de passar por alfândegas chinesas e vamos enviar navios da guarda costeira para o fazer. O que é que fazemos então?».
A ‘janela de Davidson’
As tensões entre os EUA e a China aumentaram substancialmente durante a primeira administração Trump. No início do mandato de Joe Biden, Philip S. Davidson, comandante do Comando Indo-Pacífico dos Estados Unidos entre 2018 e 2021, apresentou-se perante o Senado e fez soar os alarmes quanto a um possível ataque da Pequim a Taiwan, baseando-se principalmente no aumento significativo da capacidade militar do Exército Popular de Libertação e dos sucessivos exercícios no estreito. «A ameaça manifestar-se-á», disse Davidson, «nos próximos seis anos».
É precisamente desta declaração que surgem as preocupações de um ataque chinês em 2027, um período que passou a ser conhecido como a ‘janela de Davidson’. Este ano, o governo chinês anunciou o aumento da despesa em defesa de 7,2%, cerca de 250 mil milhões de dólares. Mas, segundo a Newsweek, «tendo em conta as despesas não declaradas (…) alguns analistas estimam que o valor real é superior a 700 mil milhões de dólares».
Porque importa tanto Taiwan?
Mas o que tem Taiwan de tão importante que faça da ilha uma peça crucial no xadrez geopolítico do século XXI? Para os EUA, Taiwan é fundamental em vários vetores, mas principalmente em dois: a geografia e a economia. Quanto à questão geográfica, como disse em 2023 Ely Ratner, então Secretário de Estado Adjunto da Defesa, citado pelo Council on Foreign Relations (CFR), «Taiwan situa-se num ponto crítico dentro da primeira cadeia de ilhas, ancorando uma rede de aliados e parceiros dos EUA (…) que é fundamental para a segurança da região e para a defesa dos interesses vitais dos EUA no Indo-Pacífico».
No que à economia diz respeito, a mesma peça do CFR evidencia que «um ataque chinês a Taiwan, independentemente do seu sucesso ou de os Estados Unidos decidirem intervir, também desencadearia uma depressão económica global e reduziria em triliões de dólares a produção económica mundial. As empresas de Taiwan fabricam quase 70% dos semicondutores do mundo e cerca de 90% dos chips mais avançados. Se o mundo perder a capacidade de produção de Taiwan, nenhuma outra empresa será capaz de preencher o vazio a curto prazo». Este aspeto é particularmente importante num mundo em que a inovação e a tecnologia são dois dos grandes catalisadores do desenvolvimento das nações. O resultado destas tensões poderá ditar o futuro do sistema internacional, que já atravessa, neste momento, um período de profunda reestruturação.