Longe, muito longe…

Os portugueses optaram pelos males que consideraram menores e que nesse raciocínio penalizaram as trapalhadas históricas do líder do PS.

Fico relativamente perplexo quando de repente e na sequência dos resultados eleitorais assisto a uma quase unanimidade sobre duas conclusões relativamente às quais, por mais que reflita, não consigo subscrever. A primeira respeita ao resultado da AD e à capacidade desse resultado gerar uma estabilidade governativa numa legislatura de 4 anos.
Os 32,1% obtidos são o segundo pior resultado da AD (o pior resultado da AD ocorreu também sob a liderança de Luís Montenegro em 2024). Com uma abstenção relativamente baixa (35,62%) esse resultado corresponde a um total de 20,66% dos eleitores inscritos e a cerca de 17% do total da população. Ou seja, a força que a AD aparenta ter na sociedade portuguesa não é tão intensa e capilar quanto à primeira análise parece. Além dessa fragilidade o partido Chega, constituído por um grupo que mostra em muitos dos seus líderes e representantes um estilo grosseiro e abrutalhado, irá sempre que possível incendiar essa famosa estabilidade, com diversos instrumentos, mas também muito previsivelmente com o caso Spinumviva (que continua sem ser devidamente explicado e encerrado). Estamos longe, muito longe de uma estabilidade com representação eleitoral bem como da resolução do tema que esteve na origem da crise política.

A segunda conclusão diz respeito às várias acusações feitas ao grande perdedor das eleições legislativas.
Considero que os portugueses optaram pelos males que consideraram menores e que nesse raciocínio penalizaram as trapalhadas históricas do líder do PS. A incompetência de Pedro Nuno Santos tem sido associada ao seu perfil de político profissional a quem não se conhece nenhuma outra atividade. Mas haverá alguma diferença para a maior parte dos candidatos a deputados? Haverá grande diferença na impreparação e na falta de competência para governar o país relativamente a Luís Montenegro? Diria que não. O sistema político que temos assegura o acesso às listas de deputados e ao governo, essencialmente aqueles cujo perfil é justamente o carreirismo partidário. Nessa matéria Montenegro e Pedro Nuno Santos são ‘farinha do mesmo saco’. Não tenhamos ilusões da dificuldade que é inovar e desenvolver Portugal enquanto o sistema político não evoluir para uma meritocracia. A qualidade da constituição parlamentar dos deputados da próxima Assembleia da República será certamente a pior da história da democracia portuguesa. A ignorância e a falta de educação irão imperar. Não é com impreparados e incompetentes que se resolvem os problemas da estagnação da sociedade e da economia portuguesa. Não são estes os capacitados para reformar o Estado e desenvolver a economia. O problema não é Pedro Nuno Santos; ele é apenas mais um, resultado do modelo de acesso à política ativa. Longe, muito longe…

Portugal vive estagnado faz décadas e, sem margem para ilusões ou dúvidas, enquanto não se alterar o modelo de acesso à politica, a remuneração dos políticos e a relação entre eleitos e eleitores não teremos saída para a receita dos boys que dominam os partidos e cuja capacidade para orientar e desenvolver o país é altamente duvidosa.

O título deste artigo traduz esse sentimento de distância à fórmula, aos processos e às pessoas que podem efetivamente contribuir, na governação, para o desenvolvimento do país. Estamos longe, muito longe…

CEO do Taguspark, Professor universitário