Na passada semana, deixámos Peter Beard (1938-2020) na companhia de Karen Blixen, apenas algumas semanas antes da morte da autora de África Minha em setembro de 1962.
Beard, então com 24 anos, já tinha passado longas temporadas em África, aprendendo com experimentados caçadores coloniais e com pisteiros locais, como Galo-Galo Guyu, de quem disse: «Observá-lo foi a minha aprendizagem no mato».
Como a sua mentora, também ele tinha adquirido um pedaço de savana com vista para as Colinas de Ngnong – Hog Ranch. A propriedade de 18 hectares, a 20 quilómetros de Nairobi, era ocasionalmente visitada por animais selvagens.
Além de caçar elefantes, crocodilos, hipopótamos e outros grandes mamíferos, nos seus safaris africanos Beard ia disparando a sua máquina fotográfica, resultando daí o livro The End of the Game, publicado em 1965, e que de imediato lhe granjeou uma sólida reputação como fotógrafo. O pintor Francis Bacon foi um dos muitos que ficaram fascinados com as imagens a preto e branco de grandes manadas de paquidermes mas também de animais em decomposição.
Foi ainda na capital do Quénia que Beard conheceu a sua primeira mulher, Minnie Cushing, uma americana de boas famílias. «Em pouco tempo tornaram-se o casal-sensação de Nairobi, ‘Tarzan e Jane’, como foi descrito por um amigo», escreve Graham Boynton na biografia Wild – The Life of Peter Beard.
O casamento não durou muito. E, novamente solteiro, Beard regressou à vida boémia em Nova Iorque – mas não sem antes trazer de África as fotografias de uma outra beldade, Iman, a futura Sr.ª Bowie.
A lista de amantes de Peter Beard é interminável. Bem-parecido «como uma estrela de Hollywood dos anos 50 e vestido como um mendigo, o que só aumentava o seu encanto», forte como um touro, amigo de Warhol, Mick Jaegger e das irmãs Bouvier, com fascinantes histórias de África para contar, o poder de atração de Beard era quase irresistível.
O seu segundo casamento foi com Cheryl Tiegs, a primeira supermodelo americana, capa da Time e da Sports Illustrated, o que evidentemente não o impediu de ir mantendo relações com outras mulheres.
A união acabou de forma desastrosa. «Cheryl deu instruções aos advogados de divórcio e começou a destruir tudo o que a ligasse ao marido», escreve Boynton. «Começou com uma purga de quatro dias no arquivo fotográfico dele […]. Chegou com a sua assistente, Barbara Shapiro, e um X-ato». «Ficaram no meu escritório durante dois dias», contaria o agente, «e o meu trabalho era garantir que ela não incendiava o arquivo de Peter. […] Foi um processo horrível, ela estava muito amargurada. Era uma raiva monstruosa».
Uma raiva proporcional às paixões que Beard ia despertando por onde passava. A sua vida repartia-se entre Nova Iorque, Londres, Paris, o Sul de França e o seu rancho em Nairobi. Foi na metrópole africana que conheceu a sua terceira e última mulher, a enigmática Nejma. Logo na noite em que se conheceram dormiram juntos. Havia apenas um pequeno obstáculo:a família dela, rigorosa seguidora do Islão, opôs-se terminantemente e fechou-a em casa. Com a ajuda de um grupo de amigos, Beard decidiu resgatá-la. A descrição é hilariante. «Aproximaram-se sorrateiramente da moradia numa noite escura de Nairobi e encostaram a escada ao muro. Segundo Rufus-Isaaks [um dos amigos], Peter Beard tinha fumado o seu tradicional charro de marijuana e não estava em condições de subir a escada. Assim, enquanto ele se apoiava despreocupadamente no muro, coube a Willie Purcell, um homem com uma só perna, subir a escada e trazer Nejma para a liberdade».
Beard havia de pagar bem cara esta transgressão. Ele, que tinha de mão beijada as mulheres mais bonitas do mundo, acabaria por ficar com esta filha de um juiz afegão, mal-encarada e autoritária, que lhe faria a vida num inferno. Por uma irónica reviravolta do destino, com esta ação de libertação, Peter Beard, o bom selvagem, ia finalmente ser domado.