SÁBADO, 22
Está o G20 a chegar ao fim?
Os líderes dos países do G20 reuniram-se na África do Sul. Entre a crise financeira de 2007/2008 e o Covid, o G20 chegou a ser visto como a principal instituição para tratar de temas globais. Esse tempo acabou. Trump e Xi não foram à Cimeira do G20, mostrando que para eles algumas das grandes questões do mundo são decididas no G2 (EUA e China) e não no G20.
Para os líderes ocidentais, o G7 faz muito mais sentido do que o G20, sobretudo quando a ameaça russa domina a geopolítica europeia, tal como a ameaça chinesa é cada mais preocupante para o Japão. E com a China a apoiar a Rússia na guerra da Ucrânia, o Japão aproximou-se da Europa.
Um grupo de potências emergentes do sul, IBSA (Índia, Brasil e África do Sul), voltou a reunir-se ao nível dos chefes de estado, o que não acontecia desde 2011. No encontro, os três países anunciaram reuniões regulares no futuro. Durante muitos anos, o IBSA foi quase anulado pelos BRICS, mas no encontro na África do Sul, foi claro que os três países querem ganhar autonomia geopolítica. Faz todo o sentido quando a China se está a transformar num dos dois grandes, e quando a Rússia está mais marginalizada devido à guerra na Ucrânia.
DOMINGO, 23
As negociações em Genebra
Os EUA apresentaram uma proposta de paz para a Ucrânia, com 28 pontos, que favorecia claramente os interesses russos. A proposta foi recebida com muita preocupação em Kiev, nas capitais europeias, mas também nos Estados Unidos. O Secretário de Estado, Marco Rubio, e congressistas republicanos não gostaram da proposta. Rubio tudo fez para matar. Quando a recebeu (no dia do jantar com o principe saudita na Casa Branca), enviou-a para a publicação online, Axios. A melhor maneira de matar uma proposta secreta é torná-la pública. Depois criticou-a em conversas privadas com congressistas republicanos, que as tornaram públicas (certamente com o acordo de Rubio). Depois, por deveres oficiais, Rubio retratou-se, mas o bem estava feito.
Em Genebra, Rubio e os europeus alteraram substancialmente a proposta inicial, tornando-a mais equilibrada protegendo interesses ucranianos. A Europa esteve bem no plano diplomático, protegendo a Ucrânia, sem hostilizar Trump (não é fácil…). Do lado americano, há uma rivalidade entre Rubio (que não confia em Putin nem nos russos) e Witkoff, um empresário aliado dos russos. Ainda num plano mais profundo, começa a desenhar-se uma rivalidade entre Rubio e Vance para ver quem será o candidato republicano em 2028. Esperemos que a Ucrânia não seja uma das vítimas dessa rivalidade.
SEGUNDA, 24
O significado do 25 de Novembro
Antes de mais, uma clarificação: a celebração do 25 de Novembro não é uma manifestação contra o 25 de Abril. Não haveria 25 de Novembro sem o 25 de Abril. Mas o 25 de Novembro é uma celebração da derrota de um dos projectos saídos do 25 de Abril. Houve o ‘25 de Abril democrático, atlântico e europeu’, e houve o ‘25 de Abril totalitário e soviético’.
O primeiro queria um Portugal democrático, com liberdade, com uma economia de mercado, e integrado na Comunidade Europeia. Era apoiado pelo PS, pelo PPD, pelo CDS, pelos militares moderados e pela maioria do povo português (como se viu nas primeiras eleições livres em 1975). O segundo era defendido pelo PCP (que liderava), por outros grupos de extrema-esquerda e pelos militares comunistas. Queria impor uma ditadura socialista, tirar Portugal da Aliança Atlântica e era contra a integração europeia do nosso país.
A tentativa de revolução comunista tornou-se uma ameaça entre Março e Novembro de 1975, durante o PREC (Processo Revolucionário em Curso). O nome não engana. Vasco Gonçalves, controlado pelo PCP, era o PM, voltou a haver presos políticos e censura, tentou acabar-se com a liberdade de imprensa (Saramago foi um dos mais diligentes contra essa liberdade), fizeram-se nacionalizações e ocupações selvagens.
No dia 25 de Novembro de 1975, derrotou-se a revolução comunista, que teria levado Portugal para uma ditadura totalitária de natureza soviética e para a miséria e a pobreza. Venceu o ‘25 de Abril democrático, atlântico e europeu’. Foram os 50 anos dessa vitória histórica que muitos portugueses celebraram. Mário Soares sabia muito bem o que estava a dizer quando afirmou em 1975, uns dias depois do 25 de Novembro: ‘O 25 de Novembro é como um segundo 25 de Abril’. A direita concorda com Mário Soares. O PS actual é que se está a afastar dele.
TERÇA, 25
Ventura esteve melhor do que Marques Mendes
Já escrevi aqui que há formas diferentes de analisar um debate. A grande maioria dos comentadores, especialmente nas eleições presidenciais, valoriza a posse institucional, o perfil a moderação, o sentido de Estado. Para estes comentadores, o modo de debater é mais importante do que a estratégia política. Eu analiso os debates de um modo diferente, no contexto da estratégia eleitoral dos candidatos. Para mim, mais do que um confronto entre dois, um debate é um momento importante da campanha eleitoral.
André Ventura tem uma estratégia clara: conquistar os votos que o Chega recebeu em Maio. Se conseguir, vai à segunda volta. No debate com Marques Mendes, seguiu essa estratégia. Há muita gente que não gosta do estilo. Ventura não se preocupa. Aliás, mostra um grande profissionalismo, desenhou uma estratégia e não se afasta dela. Corre, obviamente, um risco: parte do seu eleitorado cansar-se. Mas sem saber se isso acontece, faz sentido manter uma estratégia que tem dado resultados.
Marques Mendes não tem uma estratégia tão clara como Ventura. Por um lado, quer os votos do PSD e sabe que se os tiver, irá à segunda volta. Mas por outro lado, Marques Mendes não se quer colar ao Governo. Ventura explorou bem essa tensão na estratégia de Marques Mendes, colando-o ao Governo. Mas foi Marques Mendes que permitiu que Ventura o fizesse. Eu acho que na primeira volta não deveria ter a preocupação de se afastar do Governo. A prioridade de Marques Mendes deveria fazer o pleno entre o eleitorado do PSD. Sobretudo porque enfrenta um candidato que luta pelos mesmos votos, Cotrim Figueiredo, outro que pode entrar na parte mais à direita desse eleitorado, André Ventura, e ainda outro que pode entrar na parte mais à esquerda, Gouveia e Melo. Se Marques Mendes não fizer o pleno entre o eleitorado do PSD, para onde pode crescer?
Essa questão também era importante no debate entre Ventura e Marques Mendes. No fim do debate, foi claro que Marques Mendes não conquista votos entre o eleitorado do Chega. E se não conquista ao Chega, onde vai crescer? Por outro lado, Ventura poderá ter conquistado os eleitores mais à direita do PSD e da AD. A frase mais assassina do debate foi quando Ventura disse que Marques Mendes não tinha o apoio de todo o PSD e perguntou: «Onde está Passos Coelho?». E ainda afirmou: «Entre mim e Marques Mendes, Passos Coelho prefere que eu ganhe». O pior de tudo é que Marques Mendes ficou em silêncio e nada disse sobre isso, mostrando mesmo embaraço.
O caso do BES foi a estocada final. Mostrou que Marques Mendes usava os seus comentários semanais na televisão para passar mensagens que lhe eram dadas. Não é um sinal de um homem livre e independente. Esse será o maior teste para Marques Mendes: será um PR a defender permanentemente reformas e mudanças para o nosso país, ou será um PR que defenderá os interesses instalados? Houve quem dissesse que outros defenderam a saúde financeira do BES. Houve. Mas nunca ouvi o político mais reformista de Portugal deste século, Passos Coelho, dizer que o BES estava numa boa situação financeira.
QUARTA, 26
Sócrates acabou com a candidatura de Gouveia e Melo?
De um modo inesperado, Sócrates afirmou em direto na televisão que iria votar em Gouveia e Melo. Antes de mais, Sócrates mostrou que detesta António José Seguro e que continua a ser um problema para o PS. O apoio a Gouveia e Melo é um ataque a Seguro e ao PS. Não deixa de ser também uma homenagem a Seguro.
Para Gouveia e Melo não parece ser uma boa notícia. Como também já referi, corre o risco de ser o candidato daqueles que não gostam de Seguro (no PS) e de Marques Mendes (no PSD). Espero que Gouveia e Melo se distancie do apoio de Sócrates, condenando muito do que ele fez como PM e dizendo claramente aos portugueses que o julgamento deve concluir-se o mais rapidamente possível, e que se deve apurar tudo o que aconteceu. Espero que Gouveia e Melo diga sem qualquer hesitação que ninguém está acima da lei. Se Gouveia e Melo não mostrar incómodo com o apoio de Sócrates, é mau sinal.