As cinco pétalas da Rosa Branca

Além dos dois irmãos, o grupo ‘Rosa Branca’ incluía mais três alunos e um professor de Filosofia. Uma espécie de Clube dos Poetas Mortos

Palavras e palavras e palavras, diria o exasperado MacBeth… Precisaremos realmente de tantos livros, de tantos jornais, panfletos e comentários? «O mundo está a afundar-se em papelada!», protestava Poirot, que tinha uma cabeça tão formidável que dispensava as anotações.

E, no entanto, se o dilúvio de páginas impressas parece por vezes ameaçar submergir o mundo real, é também pelas palavras que se salvam pedaços de memória que de outro modo rapidamente se dissipariam no vazio.

Regresso ao Danúbio de Claudio Magris – essa excursão indisciplinada pela geografia, a cultura e a história da Mitteleuropa –, para me debruçar sobre uma história curta e memorável, porventura a mais trágica e bela página do livro.

O contexto é a Alemanha no ano de 1943. Os protagonistas são dois irmãos de Ulm, Hans e Sophie Scholl, opositores do tenebroso regime nazi.

«Combateram de mãos nuas», escreve Magris, «contra a força desmedida do Terceiro Reich, enfrentaram o aparelho político e militar do estado nazi armados simplesmente com o seu policopiador, que lhes servia para difundirem as tuas proclamações contra Hitler».

No dia 18 de fevereiro de 1943, Sophie levou uma mala cheia de panfletos para a universidade e distribuiu-os pelos corredores. Um pouco mais tarde, apercebendo-se de que alguns tinham ficado esquecidos no fundo da mala, despejou-os da balaustrada do primeiro andar lá para baixo, para o átrio. O contínuo que estava de serviço, Jakob Schmidt, assistiu àquilo e chamou a Gestapo, a polícia secreta, que chegou e de imediato selou o edifício.

Hans e Sophie não eram os únicos envolvidos na produção e distribuição dos panfletos. Faziam parte do grupo ‘Rosa Branca’, que incluía mais três alunos – Willi Graf, Christoph Probst e Alexander Schmorell – e ainda um professor de Filosofia e Psicologia, Kurt Huber. Uma espécie de Clube dos Poetas Mortos, portanto.

Quando foi apanhado, Hans tinha na sua posse um rascunho de Probst a apelar ao fim da guerra, que rasgou em pedaços e tentou engolir, para tentar proteger o camarada, na altura já pai de três filhos, mas os homens da Gestapo conseguiram recuperar o papel a tempo de verem o que lá estava escrito.

Os cinco membros da Rosa Branca – quatro deles na flor da idade – foram todos condenados à guilhotina ainda nesse ano fatídico de 1943.

Continua Magris: «Eram jovens, não queriam morrer e tinham pena de perder a sedutora de beleza dos dias bons, como disse tranquilamente Sophie no dia da execução, mas sabiam que a vida não é o valor supremo e que se torna mais digna de amor e fruição quando é posta ao serviço de qualquer coisa que é mais do que ela e que a ilumina e aquece como um sol».

Hoje existe no pavimento em frente à Universidade Ludwig Maximilian, em Munique, um pequeno memorial ao grupo da Rosa Branca que reproduz em pedra alguns dos seus panfletos.