Rita Santos: ‘Muitos chineses querem comprar adegas’

A secretária-geral adjunta do Fórum Macau falou ao SOL à margem do colóquio promovido em Lisboa por aquela instituição de promoção da cooperação económica entre a China e a Lusofonia.

Quais os objectivos deste colóquio e o que levou à escolha de Portugal?

Em 2014 teremos sete colóquios, com temas escolhidos pelos países que falam português. Este ano, todos solicitaram que um desses colóquios fosse fora de Macau. E também mais ligado à constituição de cooperativas e aos pequenos negócios, já que alguns destes países estão em fase de desenvolvimento após a guerra. Muitas indústrias ainda estão na fase preliminar e a agricultura está a desenvolver-se novamente. Falta muita experiência e know-how nessa área. Foi por isso que seleccionámos Portugal, que já tem uma experiência muito vasta na organização de cooperativas para agricultura e outras indústrias, e no percurso que leva o produto agrícola até ao cliente. Outro objectivo é estimular as exportações.

É por isso que visitarão a Companhia das Lezírias, o Alqueva…

Queremos que os participantes possam, in loco, fazer perguntas, ver como se estão a desenvolver cooperativas. Alguns vieram de Timor Leste, que ainda está na fase preliminar do desenvolvimento agrícola. Na Guiné-Bissau, que foi um grande exportador de arroz, agora está tudo parado. Em Angola também. Moçambique está agora a desenvolver algumas áreas com os investimentos chineses. Cabo Verde precisa de ajuda por o clima ser muito seco.

Podem também fechar negócios ou estabelecer parcerias?

Penso que sim. Da experiência que tive noutros colóquios, muitos participantes já estão a encetar contactos de parcerias em várias áreas.

A agricultura e o negócio agroalimentar em Portugal também interessam aos investidores chineses?

Muitos chineses já estão interessados em comprar adegas, porque é sinal de status e na China não é fácil ter algo dessa envergadura. Por outro lado, já há muitas parcerias constituídas na exportação de vinho, que está a ser muito bem vendido, mas ainda falta promoção. Actualmente, o vinho mais procurado na China é da França, Itália, África do Sul, Chile, Austrália. Na parte sul, entre Cantão e Xangai, já conhecem mais o vinho português. Alguns empresários de Macau dizem-me que estão a trazer empresários da China para virem ver as adegas, as caves e as vinhas e para fazer turismo gastronómico.

O vinho está associado a Portugal.

A imagem que os chineses têm de Portugal é só o vinho, o azeite, o presunto. Até no queijo, imperam o francês e o italiano. Portugal também tem alta tecnologia em muitos produtos. Há ainda os cristais e os azulejos. Alguns arquitectos, através de Macau, também tiveram contactos com empresários chineses. Mas não chega. Têm de vender um bom produto.

Há uma relação triangular entre China e Macau, Portugal e outros países lusófonos?

Este ano, a República Popular da China resolveu dar ênfase a essas relações triangulares. Há alguns projectos tripartidos, principalmente em África – Moçambique e Angola. Há empresários portugueses que estão aí instalados e já estão a contribuir para fazer a cooperação tripartida. Por exemplo escritórios de advogados e bancos. Em Macau, temos os bancos portugueses, que contactam com os chineses e fazem a ponte para os países de língua portuguesa. Esses bancos têm muitos projectos na mão. Os advogados também têm ajudado a promover Portugal na China. Em Macau também temos muita hotelaria, que consome muito vinho, azeite, presunto Pata Negra, de que também gostamos muito.

Em que fase estão os centros que já tinham sido anunciados para Macau?

Estão na fase de implementação. Um dos centros é o dos serviços para pequenas e médias empresas dos países de língua portuguesa, através do qual Macau tem, nos últimos dez anos, prestado serviços no apoio logístico, tradução, consultoria, partilha de informação. O segundo é o centro de exposições e convenções e também estamos a trabalhar: convidamos os empresários de língua portuguesa a participar nas feiras e exposições de Macau e levamos para o interior da China. O outro é o centro de produtos de países de língua portuguesa.

Em que ponto estão as linhas de financiamento que o Governo chinês anunciou em 2013 para apoiar países de língua portuguesa?

Já há candidaturas, mas o fundo é gerido pelo Banco de Desenvolvimento da China. No ano passado foi anunciado o primeiro projecto agrícola, em Moçambique, através desse fundo. E já há várias empresas que o solicitaram. Uma é portuguesa. Outro projecto, em fase de estudo, é de iluminação de ruas em Angola. A primeira tranche é de 125 milhões de dólares, mas o valor do fundo é de mil milhões.

A China tem apostado muito em África.

Sim, sobretudo no apoio ao desenvolvimento de infra-estruturas. O próximo desejo da China é constituir zonas económicas especiais em cada um dos países de língua portuguesa, bem como explorar a vertente da formação. Também tem estado a apostar nas telecomunicações. As novas tecnologias, projectos de protecção ambiental e utilização da energia solar são áreas novas onde se pretende cooperar com os países lusófonos. A China está também ligada a projectos de ajuda e desenvolvimento social e económico, e também turístico, por exemplo em Cabo Verde.

 

O comércio entre a China e a Lusofonia ainda tem margem para subir?

Vai em bom andamento, mas é altura de os países de língua portuguesa começarem a pensar em exportar os seus produtos para a China e não somente importar. O poder de compra dos chineses é bastante elevado e querem produtos de qualidade. Portugal tem calçado de qualidade e produtos alimentares. De Angola chega sobretudo petróleo e diamantes, através de Hong Kong. Ao Brasil compra-se soja e café. Caju à Guiné Bissau. Em Moçambique pode haver cooperação na exploração de gás. Timor tem o café. Mas tem de haver uma boa promoção dos produtos de cada país.

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