Jogos de palavras

Em  Portugal jogamos muito com as palavras. Talvez seja assim em todo o lado, não o sei. Em Portugal prendemo-nos com palavras para não discutir os conteúdos. No fundo os jogos de palavras são jogos de espelhos, que escamoteiam e distorcem a realidade ou, melhor, que nos impedem de enfrentar a realidade. Alguns exemplos ocorrem-me…

1 – As expressão 'austeritarismo' ou 'austeritário' , cunhadas nos anos da troika para arremessar a quem defendesse Memorando de Entendimento, ganharam popularidade e são agora usada  com liberalidade. A palavra, como é óbvio, resulta da aglutinação de 'austeridade' com 'autoritário', e pretende sugerir que democracia e austeridade não são compagináveis. Deste modo, desviamo-nos da necessidade real de garantir um equilíbrio (ainda que aproximado) das contas públicas, para um imaginário de 40 anos de ditadura.

2 – O novel líder parlamentar do PS disse algo parecido com isto: «Cautela com as promessas de baixar impostos; baixá-los em excesso pode comprometer o Estado-Social». Parece prudente e sensato. Na realidade não é nem uma coisa nem outra. O que compromete o Estado-Social, é a falta de crescimento económico e demográfico suficientes para assegura os benefícios garantidos. As declarações do Dr. Ferro Rodrigues relembram que ainda existem socialistas da velha cepa do 'tax and spend'.

3 – Mas nenhum jogo de palavras é tão confuso como aquele em torno do papel dos contribuintes no resgate do Novo Banco: «Tinha-nos sido prometido que não haveria dinheiro dos impostos envolvido mas afinal não é bem assim porque a CGD, que participa no sindicato bancário do Fundo de Resolução, é pública». É de facto verdade que a CGD pode vir a ter de responder com uma fracção da verba colocada no Fundo (deduzido o valor de venda do banco); é de facto verdade que a CGD é uma empresa pública, capitalizada através com emissão de dívida pública e, portanto, indirectamente através dos impostos dos contribuintes (os do presente mas, também, os do futuro).

Mas nada disto é novo nem específico deste caso. Os cidadãos são sempre o garante último das responsabilidades assumidas pelo Estado. Não se entende o ruído. Ruído que não é branco, mas antes deixa atrás um desnecessário sarro de descrédito em instituições  que precisam de credibilidade.