O poder de Draghi

O italiano Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), está a revelar-se um homem capaz de surpreender tudo e todos para resolver, com sucesso, os problemas complexos que tem enfrentado.

Não é tarefa fácil: as reuniões do BCE, para além dos seis membros do comité executivo (Draghi, Vítor Constâncio, que é o vice-presidente, e mais quatro membros), contam com os governadores dos bancos centrais de todos os países da Zona Euro. São, assim, reuniões a 24, de países muito diferentes, com visões muito diferentes sobre o que deve ser a acção do BCE.

É conhecida a relutância dos alemães nas últimas vezes em que os juros baixaram, sendo acompanhados por holandeses e finlandeses. Mas, com uma habilidade política inesperada, Draghi tem conseguido implementar as suas ousadas iniciativas.

O euro nasceu a 1 de Janeiro de 1999. Embora tenhamos continuado a usar as notas e moedas nacionais por mais três anos, as taxas de câmbio estavam já irrevogavelmente fixadas, e todas as transacções electrónicas passaram a ser efectuadas em euros. É, pois, uma moeda relativamente jovem, e o seu banco central acompanha-a nessa juventude.

Draghi, de 67 anos, nasceu em Roma, onde fez a licenciatura, antes de rumar aos Estados Unidos para obter o doutoramento no MIT. Com um percurso académico notável, as portas abriram-se-lhe. Foi director-geral do Tesouro em Itália e, mais tarde, governador do banco central italiano.

Quando, em 2011, chegou a altura de substituir Trichet na presidência do BCE, Draghi não reuniu à partida a simpatia de toda a gente, justamente por… ser italiano. O BCE tem apenas nos seus estatutos o objectivo de garantir a estabilidade de preços, definida como ter a inflação “perto mas abaixo” de 2% ao ano. Ao contrário do Fed, o seu homólogo norte-americano, o BCE não se preocupa com o nível de desemprego. Assim, havia quem apostasse em candidatos de países com maior tradição de políticas monetárias firmes, não dando qualquer espaço à inflação.

Todavia, Draghi acabou por se impor, vencendo as reticências da opinião pública alemã, inicialmente hostil à sua nomeação. E em Novembro de 2011 tornou-se, por consenso, o terceiro presidente da (curta) história do BCE, após o holandês Wim Duisenberg e o francês Jean-Claude Trichet.

Não tinha uma tarefa fácil, pois a crise das dívidas soberanas do euro estava no auge. As taxas de juro da dívida do Estado português, uma das mais afectadas, chegaram a negociar na casa dos 20%. E Draghi colocou fim a esta crise quando, no Verão de 2012, afirmou que o BCE estava decidido a fazer “o que for preciso” para defender o euro.

O BCE criou então um programa, conhecido pela abreviatura OMT, destinado a comprar dívida pública dos Estados, fazendo baixar as taxas de juro. Este programa, até hoje, nunca foi utilizado; mas a sua mera existência funcionou como uma ameaça e foi suficiente para fazer baixar as taxas. Quem apostasse na sua subida arriscava-se a perder dinheiro. A dívida portuguesa com o prazo de dez anos desceu da casa dos 20% para perto de 3%.

Em suma, Mario Draghi pôs fim à crise das dívidas soberanas, baixou as taxas de juro para níveis inimagináveis há pouco tempo, e colocou o crescimento económico (e a baixa inflação) na agenda do BCE. Tudo mudanças assinaláveis. O BCE tem hoje mais poder e credibilidade – e Draghi também.

* Gestor