Gravidade e Gravitas

O Espaço voltou a fazer parte da agenda mediática e não pelos melhores motivos. Na semana passada ocorreram dois acidentes: num deles explodiu um foguetão com um veículo não tripulado cujo destino era a Estação Espacial Internacional e no outro foi a SpaceShipTwo, em testes para se tornar a primeira nave de turismo espacial, que…

Está no Youtube e é uma experiência ver os últimos 25 minutos de 2001: Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick, ao som de 'Echoes', dos Pink Floyd. Ao longo dos anos, o grupo britânico compôs vários temas que pelas letras ou nomes ('Set the Controls for the Heart of the Sun', Interstellar Overdrive', Astronomy Domine'), ou pela musicalidade planante casam com o imaginário espacial – já para não falar de Dark Side of the Moon. Daí que tenham recebido o título de pioneiros do space rock, um subgénero da música progressiva. Uma etiqueta que à época não terá agradado a Roger Waters e companhia. 

O certo é que a ligação ficou. Com David Gilmour nos comandos dos Pink Floyd, este orgulhou-se de serem o primeiro grupo rock ouvido no espaço (Delicate Sound of Thunder foi levado em cassete pela Soyuz TM-7 para a estação espacial Mir em 1988). 

Já em Maio deste ano, em jeito de comemoração dos 20 anos de Division Bell, o até agora último disco de originais, foi publicado no Youtube um vídeo de 'Marooned' com imagens da estação espacial internacional.
Não ficará mal juntar The Endless River, o disco a sair no dia 10, a imagens do cosmos. Afinal, como Gilmour afirma, numa entrevista promocional do disco: “Quem faz música acaba por ter uma paleta sua e nunca soa aos outros. Decerto que nunca soaremos a outra coisa”. 

E o que é The Endless River? Um disco “aborrecido e desesperadamente decepcionante”, como classifica o crítico do britânico Independent? Not so fast. Para quem nunca foi à bola com o grupo fundado em 1965, não será desta que se converterá. Não é uma obra-prima, mas também não é uma vergonha. 

Das 18 faixas, apenas a última, 'Louder than Words', é uma canção (com letra da mulher de Gilmour). Só com uma audição – por causa das medidas antipirataria – não é fácil resumir a experiência. O 15.º disco de originais dos Pink Floyd é assumidamente um “tributo” ao teclista Rick Wright, falecido em 2008, e nasceu a partir de 20 horas de gravação de The Division Bell, que deveria ter sido um duplo álbum. Mas no final fica a sensação de que David Gilmour e o baterista Nick Mason, em conjunto com os produtores Phil Manzanera, Youth e Andy Jackson, foram não só às sobras de The Division Bell, mas também foram copiar partes de um pouco de cada época floydiana. Como se, mais do que a paleta, tivessem ido buscar as próprias pinturas. 

Em entrevista de Nick Mason à Rolling Stone, soube-se agora que o disco esteve para fazer parte de uma banda sonora de um filme dos irmãos Wachowski. Os realizadores de Matrix filmaram uma space opera a estrear em 2015, Jupiter Ascending. 

Outra empresa familiar é Interstellar. Realizado por Christopher Nolan a partir de um argumento dele e do irmão Jonathan, e produzido pela mulher Emma Thomas, conta-nos em quase três horas uma odisseia espacial, sim, mas também uma história de décadas de amor à distância entre o pai Cooper (Matthew McConaughey) e a filha Murphy (Mackenzie Foy/Jessica Chastain/Ellen Burstyn). 

O ex-astronauta Cooper vive com os dois filhos numa quinta. Agricultor à força num mundo despovoado e ameaçado por pragas – o milho é o último cereal a resistir – que evocam o Dust Bowl (tempestades de pó que arrasaram as culturas das Grandes Planícies dos Estados Unidos nos anos 30). Mas Murphy, que não compreende porque os pais lhe deram um nome associado a uma inevitabilidade (a lei de Murphy), começa a receber sinais “poltergeist” através dos livros e do pó.

Esses contactos levam-na, e ao pai, a descobrir um programa secreto da NASA – o que levará Cooper a ter de escolher entre resignar-se ou tentar salvar a humanidade, deixando para trás os filhos. “Esquecemo-nos de quem somos. Exploradores, pioneiros – e não zeladores”, dizia Cooper ainda na Terra, antes de enfrentar o destino, descobrir no espaço e noutros planetas o que o ser humano tem de pior e procurar a salvação através de um 'buraco de verme'.

Aqui nada está deixado ao acaso: o físico teórico Kip Thorne é o produtor executivo. As comparações com 2001 ficam para depois. Desfrutemos agora, em ecrã gigante, esta obra plena de gravitas (virtude) e que tem na gravidade a resposta. 

cesar.avo@sol.pt