Sócrates não mancha Guterres

A visita de António Guterres a José Sócrates voltou a lançar o tema das presidenciais. Foi um sinal de que já não tinha a Presidência da República no horizonte ou, pelo contrário, uma tomada de posição? Os socialistas tentam despolitizar a questão, mas adiantam que Guterres não fica manchado por ir visitar um amigo.

Sócrates não mancha Guterres

“Guterres é uma pessoa que tem um determinado carácter e agiu de acordo com o que achou que devia fazer. Isso só abona a favor dele”, garante ao SOL o líder parlamentar do PS, Ferro Rodrigues.

O carácter “humanista” de Guterres é destacado pelo deputado Miguel Laranjeiro, que foi seu assessor no Governo, entre 1995 e 2002: “Foi visitar um amigo, sem nenhum cálculo político”.

As amizades não são só para as ocasiões e os afectos são valorizados, sublinha-se. “Os amigos vêem-se nestas alturas. Guterres é um homem gigante”, diz um dirigente. “Quem acha que só se deve fazer visitas nas salas de tomada de posse e não nos hospitais ou prisões não percebe os portugueses”, afirma o ex-ministro de Sócrates Augusto Santos Silva, para quem esta visita não terá “nenhum efeito”.

Guterres visitou Sócrates na prisão de Évora no dia 4 de Dezembro e no sábado passado António Costa admitiu ao Expresso ir visitar o ex-primeiro-ministro nas férias do Natal com uma justificação improvável: “Só me ficaria mal se não fosse”. Um sinal de que o secretário-geral do PS não quer dar importância política ao assunto. Aliás, ainda nenhum elemento da actual direcção de Costa foi ver Sócrates.

As visitas têm sido feitas na qualidade de amigos, mas é difícil ignorar os “contornos políticos”. Mário Soares foi o notável do partido que abriu as hostilidades e, para o politólogo António Costa Pinto, depois da visita do ex-Presidente da República as restantes visitas “deixaram de ter grande impacto político”. Costa Pinto realça que Guterres tem uma imagem de “grande idoneidade, intelectual e religiosa”  –  portanto, o efeito da visita numa eventual candidatura a Belém “é muito pequeno, para não dizer nulo”. 

O politólogo Adelino Maltês lembra que ainda falta muito tempo para as eleições e que, até lá,  “muita água vai passar debaixo das pontes”. “Trata-se de uma prisão preventiva e não de uma pena. Daqui a um mês,  toda a análise pode ser ao contrário”. Mas nota: “Há actores políticos que arriscam sem qualquer calculismo político”. Já quanto à visita de Costa no Natal, Costa Pinto afirma que “quanto mais cedo melhor” e que a época típica de solidariedade pode ajudar a separar as águas.

Rio posiciona-se

À direita, as movimentações continuam, com vários putativos candidatos a marcarem terreno. Rui Rio deixou pela primeira vez em aberto a possibilidade de vir a dar o passo para apresentar uma candidatura a Belém.

Na semana passada, depois de Daniel Bessa classificar a segunda parte do livro de Rio como  um “programa político” para uma candidatura à Presidência, o antigo autarca do Porto não se escusou a essa interpretação. “Concordo com o Dr. Daniel Bessa quando ele diz que os temas que ali são aflorados são temas de regime e, como tal, eles identificam-se mais com aquilo que compete ao Presidente da República do que propriamente ao que compete ao Governo. A leitura dele está correcta”, assumiu Rio, que pela primeira vez admitiu ter um programa presidencial, mesmo que tenha descartado a ideia de ter sido essa motivação por trás do livro Rui Rio, de corpo inteiro.

Santana Lopes continua, porém, a ser o mais assumido dos possíveis candidatos do centro direita. O comentador da SIC Notícias ainda não declarou abertamente que vai avançar para Belém, mas até já marcou o calendário para as candidaturas: na sua opinião, quem quiser suceder a Cavaco Silva deve avançar até Abril.

Já Marcelo Rebelo de Sousa apontou Outubro como a data ideal para formalizar candidaturas. Mas a troca de galhardetes sucede-se a cada semana, nos respectivos espaços de comentário televisivo, com cada um dos comentadores a apontar o outro como o candidato presidencial.

“Acho que do lado da direita as coisas correm cada vez melhor para o lado de Marcelo Rebelo de Sousa. É a minha opinião. Ao mesmo tempo, quando se diz que Passos Coelho nem quer ouvir falar de Marcelo, acho que é bom para Marcelo”, comentou Santana, na semana passada. De resto, como o SOL já noticiou, Santana Lopes chegou mesmo a almoçar há algumas semanas com o professor para o incentivar a concorrer a Belém.

A verdade, porém, é que no PSD são cada vez menos os que acreditam que Marcelo possa vir a ser candidato. No seu comentário semanal na TVI, Marcelo chegou a afirmar que Santana é quem terá “melhores condições” no centro-direita.

No PSD, no entanto, a ideia é a de que o professor não quer sair completamente do leque de presidenciáveis: sempre que o seu nome é descartado, Marcelo trata de, habilmente, entreabrir novamente a porta, sem nunca se comprometer.

Cada vez mais longe está Durão Barroso, o único a afirmar claramente não estar disponível.

*com Margarida Davim e Sofia Rainho

sonia.cerdeira@sol.pt