E no fim…

Os sociais-democratas preferem que o país se vá afundando com o seu governo, até que possam surgir como salvadores.

certo, algumas declarações não terão sido particularmente felizes porque deram azo a subtis reinterpretações; e a coisa não foi pacífica, mesmo dentro do bloco, o que só abona em seu favor. mas, agora, que tudo está mais calmo na frente da moção de censura, que fica? que a esquerda censura e que a direita ampara.

diga-se, de passagem, que as declarações dos objectores não foram menos ruidosas do que as dos proponentes. da banda governamental, josé sócrates deu o mote e logo a dita cuja foi classificada de «tresloucada» e «irresponsável», além de «radical» e «extremista». em suma, uma preciosa «ajuda à direita». a vital moreira só faltou escrever que os juros da dívida deveriam ser facturados ao bloco, tal a «infantilidade» da iniciativa. e no entanto… e afinal… lá estará a tal da direita, valha-me deus, a «ajudar o governo».

entre os populares, veio primeiro a cautela – não se comentam moções sem texto – e, logo depois, a antecipação sobre o vizinho do lado. os centristas esqueceram-se do texto, apesar de exibirem a sua preferência por uma «moção consensual», sem se lembrarem de a apresentar. acabarão a abster-se numa moção que «ajuda o governo»… decerto porque desejam a sócrates uma noite de insónias.

no universo laranja, onde uma mão lava a outra, porque se é oposição enquanto se abençoam as políticas de austeridade do governo, a coisa piava mais fina. vê-se agora que a moção bloquista retirou passos coelho dos terrenos de conforto em que se encontrava, obrigando-o a uma clarificação que gostaria de ter podido evitar – «ainda é o tempo» de o governo governar, explicou o novo líder do psd.

a moção começou por merecer qualificativos de fino recorte: seria «arrogante» (um pequeno partido não pode ousar liderar a oposição…), «extemporânea» (claro que sim, uma boa moção é a que o psd apresente, se apresentar, quando lhe convier) e, obviamente e sempre, «irresponsável» – esta piada foi, seguramente, de santana lopes… dissonantes no registo, só criaturas marginais ao novo reinado.

curiosamente, o líder laranja aproveitou a circunstância para desfazer suspeitas: o governo que governe porque «tem as condições de governabilidade» que o psd lhe deu no orçamento; este quadro só se alterará se ocorrer um «colapso financeiro» ou se o primeiro-ministro «não cumprir os seus compromissos» – trocando por miúdos, se a execução orçamental correr muito mal, o que nunca se saberá com consistência antes do fim do primeiro semestre.

por muito que declarem não ser o ‘seguro de vida’ de josé sócrates, os sociais-democratas preferem que o país se vá afundando com o seu governo, até que possam, sem margem para dúvidas, surgir como salvadores, o que só ocorrerá, se ocorrer, com o próximo orçamento ou um pouco para lá dele. afinal, afinal, a moção não era tão estúpida assim.