O novo Estado

A grande novidade do ‘Estado Islâmico’ é ser um Estado com território, população e Governo. Um Estado que reivindica o califado – e através dessa reivindicação a legitimidade da umma, a comunidade dos crentes.

Não vai ser fácil destruí-lo, pois tem aquilo que é essencial para a sobrevivência – combatentes, armas e munições: voluntários estrangeiros e voluntários conscritos nas áreas ocupadas, stocks de armamento tomado ao Exército Nacional Iraquiano e ao Exército Livre da Síria.

O comando militar conta com oficiais experientes, oriundos do Exército iraquiano de Saddam Hussein. Os jihadistas parecem capazes de defender o seu espaço dos seus inimigos, ainda que tenham sido contidos nas proximidades de Bagdade e que tenham, nos últimos dias de Janeiro de 2015, perdido a esperança de tomar Kobane. Uma frente de curdos dos vários Curdistões – iraniano, iraquiano e turco – apoiada pela aviação da coligação euroamericana e árabe, conseguiu repelir os jihadistas. A batalha durou quatro meses e mostrou a capacidade das milícias curdas, em parte constituídas por mulheres-soldado.

A coligação anti-EI conta com sessenta países mas só as potências europeias da NATO, os Estados Unidos e os países islâmicos da região estão verdadeiramente envolvidos.

O problema é que os seus membros regionais – a Síria, a Turquia, o Iraque, a Jordânia, a Arábia Saudita – parecem recear-se mais entre si que ao próprio Estado Islâmico. A Turquia de Erdogan combate a Síria de Bashar, por isso facilitou a passagem de jihadistas internacionalistas pela sua fronteira sul. E não pode deixar de temer os seus vizinhos curdos da Síria e do Iraque, próximos do PKK. Os sauditas sunitas têm de dominar a hostilidade histórica pelos xiitas iraquianos que se aproximam do Irão. O inimigo comum Estado Islâmico parece juntá-los, mas é uma aliança de ocasião.
 
O Presidente dos Estados Unidos anunciou a necessidade de combater o Estado Islâmico, mas foi dizendo que não enviaria tropas para invadir o território do Daesh (acrónimo árabe de Estado Islâmico do Iraque e Levante). Ora, sem tropas no chão, será difícil vencer o Daesh. Ou mesmo aguentá-lo nas suas fronteiras.
Só com grande relutância os turcos aderiram à coligação e a sua adesão não pareceu despertar muito entusiasmo entre iraquianos e iranianos.

Desde o início das operações anti-Daesh, nenhuma cidade das ocupadas pelos jihadistas foi reconquistada. O general John Allen, comandante militar da coligação, fala em um ano, pelo menos, para reconquistar Mossul.
Enfim, anunciam-se tempos difíceis.
 
P.S. – Para quem queira ter uma informação actualizada sobre o Estado Islâmico, suas origens, estrutura e objectivos, recomendo o livro de Nuno Rogeiro O Mistério das Bandeiras Negras – Passado, Presente e Futuro do Estado Islâmico, agora editado pela Verbo. É bem fundamentado, bem articulado e é uma excelente síntese informativa.