Carta de longe

O resgate transforma Portugal num Protectorado… a três semanas de eleições.

sabe-se porque é que o resgate aconteceu. em fins de março, o senhor trichet informou os banqueiros portugueses que o bce continuaria a emprestar barato, mas que, infelizmente, deixaria de lhes comprar os títulos de dívida portuguesa que possuíam, a juros de 6, 7 e 8 por cento. acto contínuo, os banqueiros informaram o governo português de que deixariam de ir aos leilões de dívida. postas as coisas nestes termos, melhor seria um resgate, disseram todos, de trichet a teixeira dos santos, passando por ricardo salgado. e assim se chamaram uns senhores de óculos escuros e pastas negras com experiência nestas andanças. eles chegaram ao ministério das finanças para estabelecer o programa que permite ao bce retirar-se de jogo sem que os banqueiros vejam os seus interesses beliscados.

até abril, o bce assegurou liquidez e margens de lucro mais do que respeitáveis à banca; a partir de abril, o bce continua a garantir liquidez, mas as margens terão de ser asseguradas pelos contribuintes portugueses. o resgate é, assim, o seguro dos credores e os homens de óculos escuros a sua garantia. acho bem que cgtp e ugt se tenham encontrado com eles. estão na concertação e devem dizer a quem prepara o catálogo de malfeitorias que aí vem, quais as linhas que, em sua opinião, não se devem pisar.

já com os partidos é bem diferente. em qualquer capital europeia se sabe que o resgate transforma portugal num protectorado… a três semanas de eleições. a decisão mais importante que afecta o país em muitos anos e para muitos anos, está a ser negociada por um governo diminuído, será assinada por dois partidos que precisam de ficar na fotografia e vai ser tomada numa reunião de ministros das finanças… em bruxelas… a três semanas de eleições.

não sei se me faço compreender: a decisão de bruxelas impõe a portugal, a três semanas de eleições, um programa de governo mais pormenorizado do que qualquer um até hoje aprovado no parlamento português. normal? mas isto não é o pior. o pior é que o resgate obriga os contratantes indígenas a formarem um governo de coligação… posteriormente às eleições de 5 de junho. o direito do povo ignaro é, na melhor e mais generosa hipótese, a escolha do governador local de um poder sem rosto, que controla de bruxelas e que enviará regularmente à província equipas de verificação com óculos escuros e, claro está, pastas negras.

alguém duvida de que a ronda de conversas visava apenas um suplemento de legitimidade para os administradores coloniais? talvez eu esteja a ver mal a natureza da operação em curso. mas, de longe, tem sido escrita e descrita em todas as línguas como o que ela realmente é…