Ex-gestores das Águas de Coimbra acusados de perseguição

Um ex-presidente da sociedade Águas de Coimbra (AdC) perseguiu uma funcionária daquela empresa municipal que insistiu em fazer o seu trabalho de fiscalizar as descargas de uma empresa do sector alimentar.

mesmo depois de a funcionária detectar índices ilegais de ácidos corrosivos das infra-estruturas públicas nas águas residuais, e ter – tal como o seu mais directo superior hierárquico – avisado a administração da ádc, liderada por jorge temido, esta continuou a ignorar a situação.

quem o diz é o tribunal de instrução criminal (tic) de coimbra que pronunciou jorge temido, juntamente com os ex-administradores nuno curica e joaquim sousa e o director de serviço rui cardantas, pela prática do crime de abuso de poder.

o caso nasceu de denúncias apresentadas por joão dias pacheco, ex-director dos serviços jurídicos, e por joão lopes seco, ex-director de exploração e manutenção de sistemas, junto do departamento de investigação e acção penal (diap) .

como consequência, ambos foram perseguidos, segundo a acusação, pela administração de temido.

favorecimento do presidente

a história conta-se em poucas palavras. a adc fez diversas vistorias entre 2006 e 2008 às instalações da dan cake, localizadas em eiras, coimbra. e a funcionária susana figueiredo recolheu uma amostra dos efluentes para análise laboratorial. verificou-se então que, em todas as situações, as descargas que aquela empresa alimentar estava a realizar no sistema municipal de águas residuais suplantavam claramente os valores máximos permitidos de cbo5 (carência bioquímica de hidrogénio) e cqo (carência bioquímica de oxigénio).

sendo certo que, entre 2007 e 2008, os valores para «óleos e gorduras» violavam claramente os valores máximos permitidos.

com a agravante de que a estação de tratamento de águas residuais industriais (etari) da dan cake não ter funcionado entre novembro de 2006 e maio de 2007.

todas estas situações obrigavam a dan cake a investir na sua etari – infra-estrutura cujos parâmetros técnicos tinham sido definidos por uma empresa de engenharia detida por jorge temido e pela sua mulher, até março de 2007: a ctga.

contudo, o estudo da empresa de temido «não permitia o respeito pelos valores regulamentares» por «não contemplar o tratamento biológico, mas apenas físico-químico», lê-se no despacho de acusação assinado pelo procurador jorge leitão.

por outro lado, acrescenta, a ctga «era a responsável pela assistência técnica» daquela etar desde fevereiro de 2006.

a ligação de temido à dan cake (empresa que não foi investigada pelo diap de coimbra) fez com que o presidente da adc, segundo o diap se «empenhasse em proteger aquela empresa». nesse sentido, diligenciou junto de susana ferreira e do seu chefe (joão lopes seco), e em nome «de um acordo verbal que haveria com a dan cake para que esta fizesse descargas com valores acima dos autorizados», para que a empresa alimentar fizesse descargas sem condicionantes.

lopes seco também confirmou ao diap de coimbra que recebeu ordens da administração de temido no sentido de autorizar descargas sem condicionantes da dan cake. o denunciante, por seu lado, entendia que se «devia exigir à dan cake aquilo que se exigia às outras empresas».

10 mil euros para sair da empresa

assim, não só a dan cake deixou de ter necessidade de investir dinheiro no melhoramento da sua etari, como também não foi multada pela adc.

em janeiro, fevereiro e março de 2008, já depois de a etari estar a trabalhar novamente, mais descargas foram detectadas, tendo susana ferreira alertado rui cardantas, chefe de serviço de água e saneamento, de que «as águas ácidas», provenientes dessas descargas, «eram corrosivas, tendo apetência para danificar as estruturas e os equipamentos do sistema público de drenagem». mais uma vez, nada foi feito no sentido de se responsabilizar a empresa alimentar.

pela sua acção prejudicial para o interesse público, os gestores jorge temido, nuno curica, joaquim sousa e o dirigente rui cardantas, foram pronunciados pelo tribunal de instrução criminal (tic) de coimbra pelo crime de abuso de poder.

lopes seco disse ainda ao diap que foi informado, a 14 de junho de 2007, por nuno curica de que a administração da adc pretendia despedir susana ferreira, sem, contudo, explicar os motivos. segundo o procurador jorge leitão, foi a insistência da funcionária em inspeccionar as descargas da dan cake que levou o presidente da adc e os dois administradores a determinaram a não renovação do seu contrato.

contudo, uma falha processual na notificação da funcionária, fez com que a dispensa não tivesse sido eficaz. assim, diz o diap_de coimbra, nuno curica pressionou-a a aceitar a rescisão do contrato, mediante o pagamento de uma indemnização. propositadamente, susana ferreira ‘disparou para o ar’ o número de 100 mil euros. para sua surpresa, recebeu uma contraproposta de 10 mil euros, prontamente recusada.

por esta tentativa de despedimento, o diap de coimbra_imputou mais um crime de abuso de poder a jorge temido e a nuno curica.

a adc, liderada pelo social-democrata marcelo nuno, nunca abriu qualquer inquérito disciplinar aos funcionário rui cardantas, que se mantém como director de serviços da adc.

luis.rosa@sol.pt