Eutanásia política nos Açores

O Partido Social Democrata dos Açores decidiu, de modo absolutamente inesperado, que não quer contar mais com João Bosco Mota Amaral, primeiro presidente do Governo Regional e antigo presidente da Assembleia da República.  Sob a égide da ‘renovação’ – que funciona sempre para os outros -, os actuais responsáveis partidários afastaram Mota Amaral da sua…

Indiferentes à disponibilidade manifestada para continuar a exercer o cargo de deputado nacional, bem como à circunstância de, no próximo período legislativo, abrir-se o processo de revisão da Constituição da República Portuguesa e da Lei Eleitoral, nos quais a capacidade de jurista e a experiência política de Mota Amaral seriam determinantes para a defesa intransigente das questões açorianas, assumiram, de modo totalmente intempestivo, uma solução de ruptura, que desautoriza aquele notável responsável político. E que, na sequência, limita gravemente a sua capacidade de intervenção parlamentar em representação dos Açores, sobretudo quando ainda faltam alguns meses para o fim do seu mandato.

Na decisão em causa, desprezou-se a circunstância de Mota Amaral ter, na presente legislatura, de forma convicta e corajosa, como sempre actua na defesa dos Açores, enfrentado absolutamente só o grupo parlamentar do PSD, ao votar contra a Lei de Finanças Regionais, o que lhe valeu a instauração de um processo disciplinar pela direcção do partido, que culminou, como não poderia deixar de ser, com a sua absolvição.
Mesmo perante a circunstância inédita de nos Açores ter sido entretanto criado um movimento de cidadãos, que se uniu em defesa da recandidatura de Mota Amaral – conseguindo, para o efeito, em menos de quinze dias, recolher mais de duas mil assinaturas e contar com mais de cinco mil apoios, onde se incluíram muitas personalidades dos mais diversos meios e áreas políticas – o PSD-Açores manteve a sua decisão de afastar o fundador das autonomias regionais da vida política nacional.

Consideraram, assim, os actuais responsáveis do PSD nos Açores, que Mota Amaral era um político vetusto e decidiram, com o seu afastamento, reformá-lo antecipadamente das suas funções públicas.
Ora, o passado político e o prestígio de Mota Amaral, que nos obrigam a pensar sempre nele quando se aproximam as eleições para a Presidência da República, impunham ao PSD dos Açores que tomasse uma decisão muito diferente.
Ao revelar-se insensível às inúmeras manifestações de apoio recolhidas pelo movimento de cidadãos, mas também na imprensa escrita regional, em defesa da recandidatura de Mota Amaral como deputado à Assembleia da República, o PSD-Açores continua a assumir um rumo que nos últimos anos lhe tem trazido muitas e pesadas derrotas eleitorais.
Um partido político de poder não pode ignorar de forma alguma o que sente a sociedade civil, nem infligir reiteradamente aos seus mais antigos e valiosos dirigentes a prática de eutanásia política. 

* Advogado e primeiro subscritor do movimento de apoio a Mota Amaral