Gaspacho: a rainha das sopas de Verão

O Verão suscita apetites de comida fria, em que o gaspacho se tornou uma receita rainha. Há outras, evidentemente, muito usadas: a francesa vichyssoise (que se internacionalizou), a de beterraba (atraente pela cor encarniçada), as de menta (com ervilhas ou favas), de iogurte (com nozes ou outros frutos secos), de abacate, manga ou melão (ou…

José Quitério, neste seu último livro (Bem Comer & Curiosidades), sugere ainda que alguns pratos frios e crus podem ser especialmente apreciados no Verão, adiantando exemplos que não me parecem de estio: o bife tártaro (carne picada ligada com gema de ovo e temperos vários), o japonês sashimi (peixe na sua crueza gloriosa, bem cortado) ou sushi (em rolos com arroz frio), o ceviche (peixe branco marinado originário do México e do Peru), o italiano carpaccio (carne crua cortada muito fina), e o português bacalhau (seco e marinado, em salada).

O tomate, trazido para a Europa com os pimentos pelos navegadores espanhóis, da América (dividem-se as opiniões sobre a origem mexicana, onde foi encontrado cultivado pelos descobridores espanhóis, ou peruana, muito usado pelos incas), só no século XV começou por ser utilizado na culinária italiana, aparecendo nas hortas espanholas no século XVII (segundo atesta Quitério), e mais tarde nas portuguesas.

Isto, muito embora Portugal surja hoje como um dos principais exportadores internacionais de tomate, sobretudo tratado industrialmente (por exemplo, em polpas enlatadas), apenas ultrapassado pelos EUA (Califórnia).

O gaspacho é anterior a esses tempos – pelo menos em regiões como Alentejo, Algarve ou Andaluzia, feito com o pão de cada uma delas. A sua origem, segundo os compêndios, será árabe. E fazia-se inicialmente com caldo de água fria (mais arrefecida ainda com cubos de gelo), a que se adicionavam os acompanhamentos (incluindo o pão fatiado) em pedaços, temperando-se então tudo com azeite, vinagre e sal.

Conheci uma idosa e excelente cozinheira alentejana segundo a qual esta é a receita actual do gaspacho à portuguesa – que poderá ser alentejano ou algarvio, variando apenas a qualidade e origem do pão. Essa cozinheira dizia-me preferir o gaspacho à espanhola ou andaluz, que seria já feito com um caldo engrossado à base de tomate, cebola pimento, pepino – levando depois os acompanhamentos inteiros e em pedaços, em que voltava a entrar pão (frito ou duro), tomate, pepino, pimentos, cebola picada, ovo cozido e outros produtos que se quisessem pôr na altura (como quadradinhos de presunto e  batatas fritas, folhinhas de manjericão fresco, etc.).

Em Espanha, há ainda um gaspacho estremenho, em que o caldo de tomate é engrossado com pão esfarelado. E o gaspacho espanhol à portuguesa, ou seja, sem caldo de tomate, mas apenas água gelada, chama-se agora salmorejo.

Hoje, a generalidade das grandes superfícies vende o caldo atomatado do gaspacho embalado, restando depois acrescentar-lhe os acompanhamentos sólidos. Em minha casa, preferem-se os vendidos pelo Pingo Doce (ver caixa) ou Lidl.