O Chumbo do Conselho de Arbitragem

Na passada sexta-feira, o país assistiu a mais uma situação caricata no âmbito desportivo, cuja importância, não poderia deixar de ignorar ou passar em claro.

Com efeito, noticiaram os meios de comunicação social que, os árbitros de futebol da primeira categoria, recusaram realizar os exames escritos e físicos agendados pelo Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), em Tomar. Segundo notícias vindas a público, os árbitros resolveram, unilateralmente, escrever apenas o nome no teste escrito, o que levou a secção de classificações do CA a efetuar imediatamente a respetiva pauta e, relativamente aos testes físicos, os referidos juízes ameaçaram chumbar propositadamente, o que conduziu à sua posterior anulação.

Esta posição insurreta, no fundo, constitui um ato de protesto contra o excessivo peso que estes parâmetros de avaliação, têm na classificação final dos juízes. Atualmente, o CA por regulamento em vigor desde o início da época, determinou que os testes representam 5% da nota final, percentagem esta que, os árbitros consideram ser demasiado elevada, e por isso, inaceitável.

O que os árbitros de futebol pretendem, segundo se apurou, é que os referidos testes tenham um peso menor na sua avaliação final.

Deste modo, o desrespeito pelas normas determinadas pelo CA, levou á não realização dos exames. Os árbitros, acabaram assim, por deslocar-se a Tomar e de lá saíram sem terem cumprido as tarefas e instruções recebidas segundo as normas regulamentares em vigor.

Posto isto, a realização das provas escritas e físicas, foi adiada para o próximo dia 24 do presente mês, igualmente, em Tomar. Até lá, o CA da Federação Portuguesa de Futebol irá refletir sobre o assunto, existindo da parte dos árbitros e da sua entidade representativa APAF, a esperança de ver reduzida a percentagem da classificação final dedicada aos aludidos exames.

Entretanto, o esgrimir de argumentos entre os “beligerantes” começou. Por um lado, o CA tece críticas à ação da APAF, tendo acusado esta ter sido instada a enviar contributos para as Normas de Classificação do Regulamento para a presente época, e o não ter feito atempadamente, entre os dias 15 de julho a 05 de setembro de 2015. Mais argumentou que, como se sabe, as Normas de Classificação do Regulamento em vigor, não podem ser alteradas depois do início das competições.

Por outro lado, José Gomes, Presidente da APAF, argumentou que os árbitros querem fazer os testes classificativos desde que não tenham um peso que não desvirtue o seu desempenho em campo e condicione a classificação final, acrescentando que, o CA não fez devidamente das contas ao efeito que estes exames escritos têm.

José Gomes criticou ainda a "inflexibilidade, demonstrações de força e poder" de José Ferreira Nunes Vice-Presidente do CA, nomeadamente ao recusar em fazer todos os exames a 24 de Setembro, juntamente com os árbitros em ação internacional, considerando que "isso não é o melhor para a arbitragem.

Posteriormente, já nesta segunda-feira, o CA da FPF e a APAF comunicaram publicamente, que vão reunir-se “muito em breve” de forma a resolver o diferendo quanto à avaliação dos árbitros com o objetivo de encontrar soluções que possam desbloquear a situação.

Ora, este lamentável e caricato imbróglio, antes de mais, evidencia o mau estar latente entre o CA e os árbitros e a sua respetiva entidade representativa, a APAF.

Como se sabe, só pode exercer a atividade de árbitro ou observador, quem obtenha qualificação necessária para o efeito, por conclusão, aproveitamento e classificação bastante nos cursos ou seminários ministrados pelos Conselhos de Arbitragem competentes em coordenação com a Academia de Arbitragem da FPF.

São deveres específicos do árbitro e/ou árbitro assistente, realizar testes físicos e técnicos, sempre que para tal, seja convocado pelo CA, competindo a este órgão federativo, no âmbito da regulamentação da arbitragem do futebol e suas variantes, estabelecer o regime aplicável à organização, formação e progressão, exercício e classificação dos agentes da arbitragem.

Assim, é ao CA que compete estabelecer os parâmetros de avaliação e de classificação final dos árbitros de futebol, sendo igualmente certo que, a meu ver, é menos grave estabelecer incorreta ou unilateralmente os referidos parâmetros, do que permitir o inapelável desrespeito pelos visados, sem quaisquer consequências.

Mais acresce que, no meu entendimento, o agendamento para breve da referida reunião entre o CA e a APAF, ainda que possa ter algum caráter conciliatório, evidencia também a incapacidade de um relevante órgão federativo, em cumprir e fazer cumprir as normas que estipulou, para o essencial e sempre polémico setor que dirige.

Ainda que a APAF possa, eventualmente, ter alguma razão nos argumentos apresentados, não é agora, após o início dos campeonatos de futebol, que as regras de classificação e avaliação dos árbitros podem ser alteradas, pois, notoriamente, a aceitação da sua pretensão, colocará em causa, os princípios da verdade e da igualdade de todos os juízes, podendo ter efeitos totalmente perversos nas competições onde atuam, potenciando casos semelhantes aos que ocorreram na época passada, como Marco Ferreira entre outros.

Frequentemente, no âmbito do funcionamento das federações desportivas o sistemático objetivo da procura de consensos, traduzem-se na negação da liderança que estas devem assumir no exercício de poderes públicos delegados pelo Estado.

Face ao exposto, não foi só o referido comportamento dos árbitros que merece reprovação e censura ao não realizarem os testes escritos e físicos exigidos.

O CA, quando chamado a atuar, no teste do exercício dos seus poderes públicos de autoridade, merece um chumbo ainda maior.